As eleições de outubro decretaram o fim, definitivo, do jornalismo imparcial. Não que os veículos de comunicação precisem oficialmente fazer campanha para um ou outro candidato, mas devem parar de repetir que são isentos e objetivos. Não são. Ninguém é.
O jornalismo que admite não ser imparcial não deve ser confundido com mentiroso, ou propagador de fake news. Calma lá. Os fatos seguem acontecendo e são acompanhados por todos – agora em tempo real. Mas cada um conta da sua forma. Sempre foi assim, só que ninguém admitia que as versões poderiam ser diferentes.
Flamengo e Athletico do Paraná disputaram a final da Copa Libertadores, por exemplo. O resultado de campo foi 1 a 0 para o Flamengo, campeão do torneio. Ninguém discute isso. Ninguém assume um resultado diferente. Só que para os cariocas, venceu quem jogou melhor e soube aproveitar as oportunidades. Para os paranaenses, o responsável foi o árbitro, que puniu injustamente um jogador com o segundo cartão amarelo – e consequente vermelho.
Alguém está mentindo? Não, são duas visões de um mesmo fato. Cada um por sua luneta.
Na política isso aparece muito, embora poucos assumam que têm um lado – e que esse lado não deveria comprometer os fatos. É quando a opinião – legítima – ultrapassa o limite da informação, contamina a verdade. E quando os dois valores se confundem, aí sim há um conflito.
Folha de S. Paulo assumiu em editorial na capa, uma semana antes do segundo turno, que tinha um lado. O texto Ameaça Autocrática deixava claro que a Folha, como instituição que trabalha com comunicação, defendia uma posição – claramente contrária à reeleição do presidente. Só que isso não contaminou a seriedade da cobertura editorial. O posicionamento pode ocorrer, sem comprometer o jornalismo. Basta a empresa ser séria e respeitar princípios. São esses mesmos princípios que garantem a longevidade das marcas, a relevância e a fidelização da audiência.
Não foi o caso da Jovem Pan. A rádio/TV/digital exagerou na defesa de um lado. Não separou opinião de informação. Permitiu que seus colunistas ocupassem o espaço jornalístico, informativo. Foi além de narrativas posicionadas, flertou com a mentira. E se deu mal. Ao apoiar o lado perdedor, viu a esperança de ter sucesso comercial a partir de 2023 desmoronar. E rapidamente demitiu muitas de suas estrelas, para baixar custos.
Se dois repórteres são testemunhas de um mesmo fato, certamente seus relatos serão diferentes. Por, pelo menos, dois motivos: um não está no mesmo local que o outro (há sempre alguma diferença, já que dois corpos não podem coexistir no mesmo espaço); e o conhecimento histórico de cada um, a sabedoria acumulada com a vida, as experiências diferentes. Por isso as narrativas também serão únicas.
Talvez seja o momento da maturidade da mídia brasileira. Assumir posições. Ser tão transparente que o cuidado para que o noticiário não seja contaminado cresça, se desenvolva. Hoje as posições são subliminares, mas toda audiência conhece, deduz. E fica chata a insistência de que “somos isentos”. Isso sim, tremenda fake news. Os veículos crescem em relação direta com a qualidade dos colunistas. E colunista não costuma subir no muro quando precisa opinar. Por que a marca ainda resiste tanto?
Parece ser o fim das empresas ditas isentas. Elas não existem mais.
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