Obrigada, Fabio
Ninguém me contou. Eu vi o Fabio falar não ao vivo durante um processo de seleção de agência. Causou certa inquietação na sala, desconforto, estranhamento. Como ousa discordar do briefing?
Ninguém me contou. Eu vi o Fabio falar não ao vivo durante um processo de seleção de agência. Causou certa inquietação na sala, desconforto, estranhamento. Como ousa discordar do briefing?
Fabio Fernandes, você fará falta. Essa é uma homenagem a um publicitário, não a uma agência. Uma das premissas do meu trabalho é ser imparcial, lembra? Mas a imparcialidade não me priva de emitir minha opinião, por mais parcial que ela seja. E, a parcialidade está direcionada a uma postura, mais que a uma figura. Diz respeito a matar a bola no peito, discordando com argumentos, e defendendo, com elegância, aquilo que acredita.
Há vários assuntos em que a imparcialidade não nos dá outra opção senão calar. Mas essa não é uma delas. Por mais contraditório que seja. A saída do Fabio da F/Nazca tira um pouco de cor da publicidade brasileira. Deixa tudo um pouco mais cinza. Não só pela excelência em dar vida a ideias brilhantes e perfeitamente produzidas, mas pela admiração da sua habilidade (há controvérsias) em falar não.
Foi do próprio a provocação para pensar em um novo formato para as concorrências. Chegou ao meu lado e comentou: “vocês tinham que pensar em alguma opção melhor que a praticada hoje.” Algum tempo depois, ao participar do novo método, ele lembrou: “obrigado por me ouvir.” É a provocação, é o olhar crítico e sem concessões que acaba por elevar a Indústria. É a inspiração para fazer diferente, ao ouvir uma voz lapidada pela experiência.
Ninguém me contou. Eu vi o Fabio falar não ao vivo. E não foi para um cliente, mas durante um dos workshops que conduzi pela Scopen para selecionar uma nova agência. Foi ao mesmo tempo um dos melhores momentos e uma das situações mais difíceis de contornar que presenciei. Causou certa inquietação na sala, desconforto, estranhamento. Como ousa discordar do briefing? Reflexo de uma Indústria subserviente, acostumada a agradar o cliente. Saiu-se tão bem que conquistou não apenas a conta, mas a gentileza do novo cliente em comunicar a decisão através de uma pergunta: “vamos juntos nessa jornada?”
Talvez a jornada tenha chegado ao fim. Diz-se que talvez a F/Nazca não exista mais. O mesmo aconteceu com a Neogama e a DM9, agências que não sobreviveram a identidades tão personalistas e criativas. A essas agências faltou certamente um plano de sucessão gradual. Mas, como substituir líderes tão apaixonados e dedicados? Como explicar a ausência do Fabio em uma reunião, diante de um cliente ou prospect? Eu vi a F/Nazca perder uma concorrência porque o Fabio priorizou estar em um cliente.
Vai fazer falta essa postura. E, o motivo de escrever essas linhas é clamar por uma Indústria capaz de dizer não, de discordar com argumentos, de mostrar um pouco mais de opinião crítica. Do meu lado do balcão vi cenas de discussão traduzidas em sentimentos de profunda admiração.
Que essa Indústria não se esqueça da necessidade de crença e se fortaleça com posturas apaixonadas e sinceras, como me fortaleceu ao aprender da sua presença pontual em reuniões profissionais.
*Crédito da imagem no topo: Muenz/iStock
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