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Mídia, educação executiva e publicidade estão passando pelo mesmo dilema: a geração de valor nos próximos cinco ou dez anos vai ser muito diferente da que foi nos últimos 20 ou 30. E o maior desafio é entender que o ‘digital’ está morto... como algo separado do negócio principal


8 de junho de 2018 - 12h05

Créditos: creacart-iStock

Acompanhei a edição deste ano do ProXXIma por meio da web, pois ela aconteceu na mesma data da conferência da Associação Americana das Escolas de Negócios, na qual estive representando a GV (única organização brasileira presente ao evento). Mas curiosamente (ou não), os temas eram similares: a digitalização mudando a relação entre marcas e consumidores, os novos formatos de entrega de produtos e serviços, as sinergias entre diferentes tipos de empresas, oportunidades de uso das tecnologias distribuídas (blockchain) na cadeia de negócio e a especulação sobre o impacto da Inteligência Artificial no mercado de trabalho.

Pensando nessa convergência, parece claro que as organizações dos setores de mídia, educação executiva e publicidade estão passando pelo mesmo dilema: a geração de valor em nossos mercados nos próximos cinco ou dez anos vai ser muito diferente da que foi nos últimos 20 ou 30. E o maior desafio é entender que o “digital” está morto… como algo separado do negócio principal. Por isso que “liderança”, “atitude” ou “transformação” digital são termos que estão perdendo o sentido — segundo representantes da Visa e KPMG presentes ao encontro das escolas de negócios, o que as empresas buscam hoje não são “líderes digitais”, mas sim indivíduos capazes de aplicar o pensamento crítico aos dados que podem ser utilizados na resolução de problemas de negócios, estejam eles em que meio estiverem.

Os executivos presentes ao evento, representando as áreas de RH de grandes empresas americanas, defenderam a ideia de que todos os processos baseados no princípio “monkey see, monkey do”, serão substituídos por softwares e máquinas em um curto espaço de tempo. Neste sentido, transformação digital não é colocar seu produto ou serviço em um app ou na rede social, mas sim desenvolver uma organização capaz de coletar, organizar e utilizar dados em todas as etapas do seu processo produtivo e de relacionamento com o cliente. Soa familiar para quem está envolvido com discussões sobre métricas de campanha, retorno do investimento e produção automatizada de conteúdo

Outro ponto importante é a força de trabalho. As questões estão ficando mais interligadas e complexas (como vimos na discussão “Telecom, Publishers ou Conglomerados de Mídia”, no ProXXIma). Por exemplo, não é mais possível falar de inovação sem levar em conta também os riscos regulatórios. Em uma discussão específica sobre os cursos de marketing, alguém observou que embora 85% do orçamento de um grande anunciante seja gasto com fornecedores (agências, veículos, produtoras, etc), poucos profissionais da área recebem treinamento em gerenciamento de contratos e negociação. E à medida que processos tecnológicos desempenham um papel cada vez mais relevante nessas atividades, quem provê soluções incorporando esses avanços ocupa uma fatia cada vez maior do mercado (como as empresas de cursos online, no setor educacional, ou as consultorias, na publicidade).

Não se trata apenas de adquirir novas capacidades (o que já não é fácil para a maior parte das pessoas), mas sim de criar uma flexibilidade mental para reconhecer que a “realidade” do negócio é cada vez mais um conceito transitório e que a verdadeira capacidade de liderar consiste mais em saber fazer boas perguntas do que ter todas as respostas. Olhe para sua agência, sua empresa (ou sua escola) e avalie quantos dos seus funcionários estão dispostos a abraçar este tipo de comportamento. Segundo o relatório “O Futuro do Trabalho”, desenvolvido pelo World Economic Forum, os “soft­skills” como comunicação, julgamento, observação ativa e outros, responderão por 70% da empregabilidade, com os “hard­skills” (pensamento matemático, programação, design de usabilidade, etc) ficando com os restantes 30%.

E enquanto essas mudanças acontecem (ou não) do lado de “dentro” da sua empresa, o consumidor, os stakeholders e o ambiente regulatório seguem mudando. Não se trata apenas do aparecimento de novos concorrentes para aproveitar essa transformação, mas a escala que eles podem atingir em uma velocidade que seria inconcebível há menos de uma década — em quatro anos, o Airbnb atingiu o mesmo número de quartos em oferta que o Hilton levou 93 anos para conquistar. Em termos de publicidade, o que eram o Facebook e o Google no início dos anos 2000?

Esses paralelos entre os dois eventos, mesmo se tratando de mercados distintos, nos obrigam a pensar no contexto brasileiro. Vamos enfrentar um longo ajuste fiscal nos próximos anos, se tivermos a sorte de eleger um governo que entenda a necessidade de reformas (se não tivermos essa sorte, vamos enfrentar um ajuste muito mais doloroso, mas mais curto, a la Grécia), enquanto o processo de concentração de renda (menos gente com mais dinheiro, de acordo com a Receita Federal) deve continuar ou até se acentuar por conta do avanço tecnológico, ao mesmo tempo que a próxima década marca a transição de um país jovem para um país de meia­ idade (as implicações disso para o mercado de consumo são enormes e serão tema de uma próxima coluna). Para provedores de serviços e conteúdo, sejam agências, veículos ou escolas de negócio, minha única certeza é uma frase do Peter Drucker: “em tempos de turbulência, o maior perigo é agir com a lógica de ontem”.

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