Por que inovação produz exclusão
O capital de risco acelera a evolução da ciência, mas também o fosso entre aqueles que o detêm e quem não
O capital de risco acelera a evolução da ciência, mas também o fosso entre aqueles que o detêm e quem não
Meu sócio no Pipeline Capital Tech Investment Group, Alon Sochaczewski, me recomendou a leitura de um livro que em português tem o título de A Lei de Potência (The Power Law), do jornalista duas vezes vencedor do prêmio Pulitzer, Sebastian Mallaby. É a história do capital de risco e da criação do que ele chama de “novo futuro” (diferente do futuro que imaginávamos antigamente porque anabolizado pela tecnologia e pela inovação).
A Lei de Potência é uma lei bem simples de crescimento, que aplicada aos princípios da economia, resulta que os economicamente mais fortes avançam na curva de crescimento de forma exponencialmente mais rápida do que os demais em uma sociedade, promovendo recorrentes discrepâncias. Uma lei bem simples, mas socialmente cruel.
Ela foi acelerada pela inovação porque só o poder do capital pesado se beneficia primeiro e prioritariamente da inovação exponencial das tecnologias avançadas. O instrumento dessa aceleração é o capital de risco, chamado assim por motivos óbvios: é o capital que aposta em foguetes e não na vendinha da esquina. O risco é enorme, mas o ganho é maior ainda. É o risco assumido por esse capital que faz a ciência avançar. É esse capital o diretamente responsável pelos maiores avanços das tecnologias nos últimos 70 anos (quando surgiu, nos EUA, tendo seu maior berço no Vale do Silício). Foi esse capital que criou as vacinas da Covid em um ano. É esse capital que anaboliza a inteligência artificial. E foi ele que deu à luz o ChatGPT e está fazendo exponencialmente avançar a inteligência cognitiva e a inteligência artificial generativa.
Quanto mais o capital de risco avança na inovação do planeta e das sociedades, maior fica a discrepância socioeconômica entre quem o detém e quem não. Os benefícios dos avanços por ele gerados chegam a várias camadas da população, em algum momento, até porque sem mercado, inovação alguma prospera. Mas mesmo aí, são os mais bem situados na pirâmide que se beneficiam mais, antes e mais recorrentemente. Sendo que os da base correm o risco de se descolarem, nos anos, mesmo desses benefícios espraiados, tornando-se tecno-párias sociais.
Se o Jeffz Bezos entra num cinema, naquele momento a renda per capta da plateia sobe exponencialmente. Quando ele sai, ninguém ficou mais rico. Sendo que pela Lei de Potência, o capital dele investido em inovação vai torná-lo mais e mais rico no mero percurso entre o cinema e sua limosine estacionada na porta. E os demais ficarão lá sentados vendo um filme que vai se repetir indefinidamente, como no Dia da Marmota. É a dura ficção da realidade: inovação produz exclusão.
Mas há, acredite, milhares e milhares de formas de quebrar essa desigualdade. E essa cadeia. Parte delas está no poder público e nas políticas de controle democratizante do capital. Mas esse é um caminho que, embora indispensável, tem muitas vezes uma velocidade incompatível com a necessidade social do mundo contemporâneo.
E esse mundo que em que vivemos hoje é regido por esta outra curva aí abaixo: a curva da exponencialidade.
A inteligência artificial generativa é o pontinho de inflexão (turning point). Só que essa curva vai se inclinar vertiginosamente para cima quando, em cinco anos, a computação quântica tornar a inteligência artificial de hoje um brinquedinho de jardim de infância.
Muito bem. Para quebrar essa dinâmica que, contraditoriamente, gera avanços e desigualdades, as outras milhares e milhares de formas de avanço e inovação precisam obedecer e se aproveitar dessa mesma curva. Ter essa mesma velocidade no tempo.
E só o mesmo mecanismo, o capital de risco e, agora também, a digitalização das estruturas do mercado de investimentos, tem capacidade financeira para promover essa transformação e essa inclusão. Desde que aplicado no lugar certo: onde a economia produz mais valor, que é onde mais e mais fatias da sociedade prosperam.
Foram milhares de startups fomentadas pelo capital de risco das big techs e grandes corporações que desenvolveram os avanços que descrevi acima. Isso seguirá acontecendo, mas só sua destinação aos setores hoje desigualados promoverá ventura (em inglês, venture capital, certo?).
O papel do capital de risco e do mercado financeiro seguirá sendo vital em todos os avanços da humanidade. Cada vez mais, eu diria.
Isso deve passar a significar incluir mais e mais empreendedores no sistema financeiro, promover mais e mais investimentos em projetos de impacto, fomentar inovação e tecnologia que desconheçam barreiras geográficas, sociais, étnicas e comportamentais. E são milhares e milhares de startups e empreendedores inovadores que podem ser acelerados por esse mesmo capital da ventura.
No mundo que acabo de descrever, investimentos e inovação sem propósito não têm o menor propósito.
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