Por que o lucro importa tão pouco para a Amazon
A empresa de Jeff Bezos fatura bem menos que outras companhias, mas tem valor de mercado muito maior: entenda porquê
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Por Howard H. Yu*
Nenhum outro grande executivo tem ganhado tanta atenção quanto o CEO da Amazon, Jeff Bezos. Quando a gigante de e-commerce anunciou a aquisição da Whole Foods, o preço das ações subiu para o recorde de US$ 1.017. Com seu patrimônio líquido alavancado a US$ 84,7 bilhões, Bezos passou Warren Buffett e se tornou a segunda pessoa mais rica do mundo, só atrás do cofundador da Microsoft Corp, Bill Gates.
Talvez pelos improváveis ganhos astronômicos, Bezos tuitou aos seus 222 mil seguidores, perguntando sobre como dar dinheiro. “Eu quero muito que minha atividade filantrópica ajude pessoas aqui e agora – no curto prazo – na intersecção da urgência e impacto duradouro. ”
O que fez o crescimento da Amazon mais notável ainda foi o seu lucro insignificante. Entre 1995 e 2015, o montante foi de US$ 2,26 bilhões. Em comparação, Walmart, a loja de departamentos com sede no Arkansas, gerou US$ 14,69 bilhões só em 2015, seis vezes mais do que a Amazon em seus 21 anos de existência.
Ainda assim, investidores não param de comprar ações da Amazon. Segundo o mercado de capitalização, Amazon é agora a quarta companhia com mais valor no mundo. Walmart não chega nem entre as top dez.
Isso é bizarro. Para muitos executivos, a tarefa mais importante é entregar crescimento constante com aumento de rentabilidade.
Como o lucro pode importar tão pouco para a Amazon?
Uma obrigação inescapável para CEOs em qualquer corporação é entregar resultados na hora e dentro do orçamento. Tudo começa pelo planejamento corporativo que prevê rendas, levando em conta incertezas de ambientes incertos.
Normalmente, esse tipo de operação extrapola ganhos anteriores e adiciona uma porcentagem para ir de encontro à expectativa dos investidores.
Uma vez que o orçamento está fixado, o trabalho de CEOs é entregar o orçamento: conseguir os números planejados para os investidores quadrimestralmente, de acordo com os planos. O maior medo entre os financistas é o prospecto de perder o consenso de expectativa entre os analistas de Wall Street.
Na verdade, de acordo com uma pesquisa publicada em 2005 por John Graham, da universidade de Duke, a maioria dos executivos no comando de grandes empresas considera que perder o consenso na expectativa seria o equivalente a um grande revés corporativo. Alguns até estariam dispostos a sacrificar o crescimento futuro (por, digamos, cortando pesquisa e desenvolvimento) para alcançar as expectativas de curto prazo dos investidores.
O que a Amazon deixou bastante claro, entretanto, foi que apenas a lucratividade não guia a performance das ações. Investidores estão mais atraídos pelo crescimento de prospectos da Amazon do que uma lucratividade sólida, como a buscada pelo Walmart.
Particularmente, em uma era de onipresença da conectividade alavancada por smartphones, sensores embutidos e algoritmos de máquinas, oportunidades de negócios geralmente são feitas em plataformas online.
No caso do Uber e do Airbnb, por exemplo, companhias tem tomado o papel de provedores da plataforma, facilitando a vida de vendedores na oferta e compradores na demanda na corrida para trocar bens e serviços.
O valor dessas plataformas depende majoritariamente no número de usuários em cada extremo. A conveniência para os consumidores do Airbnb se deve ao alto número de hóspedes independentes localizados na cidade. Por outro lado, anfitriões são atraídos a trabalhar com a plataforma porque existem muitos viajantes em potencial usando o aplicativo.
O que a Amazon deixou bastante claro, entretanto, foi que apenas a lucratividade não guia a performance das ações
Essa lógica de “efeito de rede” é muito presente na Amazon. Isso explica porque os leitores digitais do Kindle custam US$ 59,99 pelo aparelho mais básico. A Amazon precisa garantir uma grande base de usuários para forçar as editoras a optar pelo seu formato de e-book, o que aumenta o número de títulos para os consumidores.
Essa estratégia de baixo custo tem sido o critério dos produtos Echo da Amazon, principalmente alto falantes Wi-Fi – uma espécie de Siri em um tubo – que ouve e obedece a comandos de voz.
O Echo Dot chegou a ser vendido por US$ 29,99 na Black Friday desse ano. Ninguém consegue ganhar muito dinheiro com esse preço. Mas para a Amazon, é uma corrida para uma grande base. Como Bezos gosta de dizer, “sua margem é minha oportunidade”.
Estratégia do preço baixo
Mas a estratégia de preço baixo é apenas metade de equação.
A Amazon também mudou o jeito como operações de back-end são concebidas. Conforme a empresa mudou de vender livros e CDs para streaming de filmes e alto falantes inteligentes, Bezos descobriu que novas formas de monetizar infraestrutura de back-end (automação de processos), que normalmente são vistas como centros de custo, e tornou isso em uma nova renda.
De volta à 2012, a Amazon começou a abrir seus próprios servidores internos — a espinha dorsal de qualquer empresa de internet – para clientes externos. Bezos estava tão resoluto em vencer nesse negócio que insistiu que todos os serviços da plataforma deveriam ser construídos com APIs abertas, o que permite que os computadores da Amazon se comuniquem facilmente com forças externas que seguem os protocolos padrões da internet.
Companhias como Netflix ou Dropbox podem pagar para usar sua infraestrutura ao invés de construir seus próprios servidores. Essa era a ideia básica por traz do Amazon Web Services, uma solução de armazenamento de nuvem para o meio corporativo.
A mesma ideia se aplica na corrida por inteligência artificial. No primeiro lançamento do Amazon Echo, Bezos forçou sua equipe, de mil empregados, de forma agressiva para que acelerassem o processo de certificar aplicativos de terceiros, conhecidos como “skills”.
Em menos de 18 meses, o Echo conseguiu mais de 10 mil skills, incluindo Uber (pedir um carro), FitBit (ver desempenhos de saúde), Mixologist (fazer um drink), Domino’s (pedir uma pizza), e até mesmo aplicativos de outros produtores de eletrônicos (Philips, Samsung e General Eletric).
Com tantos aplicativos de terceiros, até o Google e a Apple não conseguiram entrar no mata-leão do mercado de alto falantes ativados por voz de Bezos.
Áreas de atuação alternativas
O que a Amazon tem indicado com o passar dos anos são áreas de atuação alternativas como forma de atingir um aumento no valor de suas ações. Nem renda constante nem alta lucratividade são os únicos fatores importantes. É, na verdade, aceitável investir agressivamente em infraestruturas caras enquanto persegue-se uma estratégia de baixo preço.
Enquanto a companhia puder criar prospectos de crescimento fazendo com que produtos domésticos se tornem novos serviços para terceiros, investidores estão abertos a tal estratégia inconvencional.
*Howard Yu é professor de estratégia e inovação no IMD com unidades na Suíça e Singapura
Tradução: Salvador Strano
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