Preço do sucesso
Avanço da inteligência artificial encoraja multinacionais a mudarem políticas de remuneração de agências, mas adoção de success fee esbarra na falta de métricas e na baixa transparência das relações comerciais
Avanço da inteligência artificial encoraja multinacionais a mudarem políticas de remuneração de agências, mas adoção de success fee esbarra na falta de métricas e na baixa transparência das relações comerciais
19 de novembro de 2024 - 14h00
A informação pode soar ruim para as agências: estudo divulgado na semana passada pela World Federation of Advertisers (WFA) mostra disposição de anunciantes multinacionais por mudanças em suas políticas de remuneração, especialmente em relação a suas parceiras especializadas em mídia. Esperançosos com os efeitos da redução da necessidade do trabalho humano, provocada pela adoção da automação e, sobretudo, pela velocidade de implementação de soluções baseadas em inteligência artificial, os clientes nutrem a expectativa de, ao mesmo tempo, aumentarem a produtividade e reduzirem custos.
A pesquisa Future of Media Remuneration, feita em conjunto com a consultoria global MediaSense, ouviu cerca de 80 multinacionais, que somam US$ 60 bilhões em investimentos publicitários, e aponta que três em cada quatro marcas buscam alterar seu modelo de remuneração de agência nos próximos três anos. O estudo conclui, ainda, que os anunciantes se sentem mais bem equipados internamente para enfrentarem a complexidade de manejo do ferramental de mídia e gostariam de deixar de remunerar suas agências por modelos baseados em time and materials (T&M), que leva em conta o tempo dedicado da equipe parceira e o empenho das ferramentas por ela utilizadas.
Entretanto, a má notícia aparente pode esconder um dado promissor: 58% dos anunciantes planejam aumentar a remuneração baseada em resultados, o que, na opinião dos executivos entrevistados, incidiria em uma troca de valor mais forte com suas agências.
A intenção é boa, mas esbarra na realidade. Os clientes reconhecem que políticas de success fee dependem de uma transparência inalcançada, dificultada pelas limitações de métricas ainda ineficientes para comprovar a responsabilidade do trabalho das agências nos resultados colhidos pelas marcas: 84% dos entrevistados apontam a falta de dados como barreira e 87% não acreditam que as agências estariam dispostas a abrir todos os seus números — 75% se importam em saber como é o faturamento das agências, mas apenas 28% acreditam que elas têm transparência sobre como o fazem.
Nesse ponto, é preciso salientar que o success fee também depende de transparência nos anunciantes — igualmente ou até mais indispostos a compartilharem dados financeiros. Um executivo de agência convidado pela própria WFA para comentar anonimamente os resultados se saiu com essa: “Se está funcionando e você está vendendo, isso não é toda a transparência que você precisa?”.
O capítulo da pesquisa que investiga as motivações para a necessidade de redução de custos nos clientes é ambíguo. Somente 15% admitem que essa é a razão para a desejada mudança na forma de remuneração. Por outro lado, 61% admitem que as taxas pagas às agências devem aumentar nos próximos três anos. A equação se explica quando os executivos de anunciantes analisam a influência da inteligência artificial no processo: 58% esperam economizar em áreas nas quais a tecnologia for implementada para assumir tarefas comoditizadas, mas há disposição em pagar mais por talentos estratégicos.
Apesar das peculiaridades do modelo de remuneração dominante no mercado brasileiro, orientado por comissões e bonificações calculadas com base na compra de mídia, esse apetite global por mudanças na precificação do trabalho das agências também reverbera por aqui. Há, nos clientes, o desejo de avançar em modelos de remuneração mais sofisticados e orientados ao desempenho. Entretanto, são muitos os desencontros em relação à preocupação crescente das agências com a sustentabilidade econômica de seus negócios.
O peso determinante das mesas de compras dos anunciantes na intermediação das relações com as agências e as concorrências motivadas exclusivamente pela redução de custos são dois exemplos que evidenciam que a disseminação da remuneração por resultados como prática corrente ainda é uma utopia.
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