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Opinião

Publicidade não é sobre causa

Marcas não são ativistas e propósitos não são simples recursos criativos


11 de julho de 2017 - 11h00

Não tenho nenhuma dúvida. Termos incorporado a discussão sobre propósito, além de visão e missão; pessoas, no lugar de consumidores; e atos, no lugar de discursos, é uma das mudanças que mais impactaram o marketing e a comunicação nos últimos 10 anos. Não estou dizendo isso apenas pela visível transformação da manifestação das marcas através da publicidade. Essa é apenas uma dimensão. Uma dimensão que muitas vezes tem sido tratada, equivocadamente, como se fosse a única.

Nos últimos meses, não faltaram posts, artigos e discussões sobre a publicidade estar ou não surfando uma onda, sendo ou não oportunista, se apropriando indevidamente de causas, se transformando em palanque ativista sem legitimidade, assumindo discursos de transformação sem compromissos estruturais — aqueles fundamentais, relacionados a cultura interna, compliance, produtos, cadeia produtiva, velocidade e impacto da inovação.

Foto: Reprodução

Tudo bem. Podemos até querer acreditar que existe um jeito simples e rápido de resolver tudo isso. Podemos criar listas generalizando o que é preciso ser feito para que as marcas tirem nota máxima em comportamento, podemos cobrar coerência, sugerir que as campanhas sejam acompanhadas de uma ou outra iniciativa que atribua credibilidade à mensagem. Talvez tudo isso precise mesmo ser feito. Mas hoje eu resolvi oferecer outra perspectiva.

Por um momento, lembre-se que tudo o que fazemos todos os dias é sobre reforçar, influenciar, legitimar, transformar comportamentos sem colocar em risco a sobrevivência do negócio, ou seja, o lucro. Agora pense comigo: Governos, ONG’s, Mídia e Negócios. Quatro instituições que já ocuparam lugares muito diferentes uns dos outros e que talvez, como independentes, nunca tenham estado tão próximas — o que até poderia ser considerado positivo se não estivesse ocorrendo em um momento onde todas elas se encontram amplamente enfraquecidas.

Por mais um momento, esqueça o top of mind, o quanto a marca para a qual você trabalha foi compartilhada na última semana, a quantidade de comentários na sua timeline, o Glass Lion, o D&AD Impact. Esqueça se você concorda ou não com o artigo do The Guardian sobre Fearless Girl e pense se você realmente já aceitou que ao criar campanhas que transformam comportamentos de consumo você está interferindo no comportamento social. Essa consciência vale muito se aplicada no dia a dia e se, junto dela, vier a consciência de que não existe transformação sem confiança.

Este ano, o The Edelman Trust Barometer, survey online gobal realizado em 13 países, incluindo o Brasil, revelou que a confiança está em crise no mundo todo em relação a todas as instituições, incluindo os negócios. Algo que nunca foi observado desde que o estudo começou em 2012. 53% dos pesquisados acreditam que o sistema atual falhou com eles, é injusto e oferece poucas esperanças para o futuro.

A relação das marcas com a sociedade vem ganhando uma nova dimensão na última década. Diferente da antiga ideia de que a busca pelo melhor resultado para os acionistas é uma missão e um fim em si mesmo, a ideia de que é possível construir lucro enquanto construímos saúde para a sociedade já está sendo colocada em prática em grandes corporações

Isso significa que as pessoas, nesse momento, estão se perguntando: “quem está por mim?”. Este não é um sentimento qualquer.  O que está alimentando esse processo? Segundo o estudo, o medo da corrupção, da imigração, da globalização, da erosão dos valores sociais, do ritmo da inovação.

Quando a combinação entre a falta de fé no sistema e medos profundos encontra nossa busca por estabilidade e segurança, a consequência pode ser o reforço de crenças pessoais conhecidas, o que provoca um aumento de resistência às mensagens que oferecem uma oposição ao que se acredita correto, gerando fortalecimento de valores tradicionais e o conservadorismo. O estudo realizado pela Edelman revela que as pessoas estão quatro vezes mais propensas a ignorar informações que suportam uma posição na qual não acreditam, isso afeta nosso papel central de promover transformações de qualquer natureza.

Tudo o que já começamos faz muita diferença. Crescemos muito ao colocar as pessoas no centro e ao nos reconectarmos com os contextos culturais e sociais mas isso não é apenas sobre publicidade. A publicidade não é apenas sobre publicidade como também não é sobre causas e não faz o suficiente por elas ao tratá-las como simples recurso criativo, principalmente quando o público-alvo são pessoas que não sabem mais em quem confiar.

A relação das marcas com a sociedade vem ganhando uma nova dimensão na última década. Diferente da antiga ideia de que a busca pelo melhor resultado para os acionistas é uma missão e um fim em si mesmo, a ideia de que é possível construir lucro enquanto construímos saúde para a sociedade já está sendo colocada em prática em grandes corporações. Mas precisamos continuar nos esforçando e aprendendo a equilibrar propósito e negócios. De nossas diferentes perspectivas, temos um papel agora. Melhor, cada um de nós, definir qual é o seu.

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