26 de abril de 2016 - 12h58
Internet é um lugar onde você, como se dizia antigamente, navega. Tanto que usa para isso browsers, que em inglês quer dizer “navegadores”. Só que surge agora a internet eternamente conectada, em que você não mais navega nela, ela é que navega em você. E isso muda tudo o que conhecemos de web até agora. Sem contar que muda nossa vida de um jeito que não estamos alertas para quanto será. Vem comigo no meu raciocínio.
Hoje, você se atualiza recebendo informações por um número cada vez maior de plataformas digitais. Claro que você ainda busca coisas na internet, quando precisa delas. Mas até esse seu gesto de procurar proativamente algo na web resulta imediatamente numa contra-ação de push, porque aquilo que você procurou está indexado em algum banco de dados, que por sua vez está conectado a alguma plataforma de mapeamento de comportamento e tagueamento da sua trajetória, e no instante seguinte, você já está sendo navegado por uma série de informações correlatas àquilo que você originalmente buscou. A web é que busca você.
De agora em diante, essa dinâmica vai só evoluir, porque estamos na antevéspera da queda da Dilma, oops, da Internet das Coisas, e a Internet das Coisas significa uma internet que não mais se desliga, está permanentemente on. Os efeitos colaterais dessa nova e revolucionária realidade não são pequenos.
Em última análise, estamos diante do fim daquela máxima que temos ouvido nos últimos anos de que, com o advento da Era Digital e da internet, o consumidor e o cidadão comum assumiram o comando, deslocando dele as instituições constituídas e os grupos de poder. Pois dançou.
Quem vai mandar agora não seremos mais nós, os todo-poderosos internautas, que por um breve período de tempo tivemos de fato em nossas mãos um poder sem precedentes na história, o poder da internet aberta, em que nossa voz ecoou sem fim, sem fronteiras e sem barreiras.
Quem vai assumir esse comando serão os dados e os algoritmos em tempo real, que administrarão a sua vida e a minha, segundo suas próprias vontades binárias, não mais as nossas, tão fragilmente humanas. É o início da tomada de poder pelas máquinas.
Push é a internet do controle e no controle, que tende a centralização, em clusters de domínio (já explico isso melhor), viabilizando a volta da velha lógica de que poucos controlam muitos. Seu relógio conectado, seu refrigerador inteligente, seu tênis ligadão nas redes sociais, seu smartphone então nem se fala, são agentes infiltrados em sua vida, dessa nova invasão em curso. Cuidado com eles!
Clusters de domínio são as estruturas sobre as quais a ditadura do push se sustenta. Basicamente, os aplicativos e ecossistemas que se resolvem e se encerram em si mesmos. Quanto mais aplicativos usarmos, mais estaremos sendo encerrados em um domínio que nos domina e nos envia dados constantemente, mesmo que não estivermos utilizando-os.
Hoje eu recebo do Waze avisos para eu me preparar com antecedência para os trajetos que farei amanhã, porque eu autorizei o app a ficar espiando minha agenda de compromissos, o que ele faz o tempo todo, porque é um software codificado para isso. Ele me diz qual é o tempo estimado dos percursos que vou percorrer no dia seguinte e eu posso, então, não comer bola e sair com o tempo suficiente para não chegar atrasado em lugar nenhum.
Isso é uma maravilha da tecnologia e eu adoro receber esses avisos via push notifications.
Só que é exatamente nessa maravilha que se esconde a lógica da dominação. Apps, coisas conectadas, sistemas de busca, redes sociais, plataformas de dados inteligentes, toda essa parafernália, orientam-se cada vez mais para não desligar nunca e empanturrar-nos de pushes ininterruptos. Nós autorizamos, nós pedimos isso, agora toma!
Temos de entender que se o trade off nos interessa, que venha a era push hiper-conectada. Mas que se ele tomar conta das nossas vidas, pronto, ele tomou conta das nossas vidas. Temos também que entender que data is the new currency. Dados são a nova moeda, a moeda universal da web. Nós entregamos nossos dados voluntariamente, alguns outros nos foram surrupiados indevidamente e canalhamente, e está feita a festa. Push ni nóis!
A internet de silos, a dos apps e dos pushes, é inimiga da internet aberta. Acredito piamente que ambas possam conviver, mas isso depende de uma maturidade que nós, internautas, francamente caro leitor, não temos. Somos megabobinhos e ingênuos, caramurus diante de espelhinhos. Big Data + Algoritmos + Internet das Coisas + Mobile + Push é uma cadeia inter-relacionada de novas tecnologias e de novas lógicas de interação digital desconhecida para nós até hoje. Não dominamos isso direito. Mas, se não tomarmos cuidado, isso um dia ainda vai nos dominar, ah que vai, vai. Se é que já não.