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Opinião

Quando a inovação aberta é inovação furada

É preciso ter uma base sólida e necessária de estratégia e cultura de inovação aberta


26 de janeiro de 2022 - 15h00

(Crédito: shutterstock)

Vivemos a era da inovação. Empresas que não inovam tendem a ser engolidas por um mercado voraz que aprende a resolver dores de maneira exponencial. E como todos sabemos, toda dor mal resolvida é uma oportunidade de negócios. As startups, portanto, se tornam holofotes para jornadas e experiências medíocres de usuários e consumidores.

As empresas entenderam que não conseguem ou não têm a agilidade desejada para resolver algumas dores sozinhas. Recorrem ao ecossistema para inovar, descem do salto, engolem o choro, colocam as sandálias da humildade e reconhecem que precisam e buscam ajuda externa. Para isso, trazem profissionais especializados, criam áreas, projetos, programas e conduzem iniciativas sobre a tão famigerada inovação aberta.

Pelo conceito de inovação aberta, criado em 2003 por Henry Chesbrough (autor de Open Innovation: The New Imperative for Creating and Profiting from Technology), as empresas ganham ao absorver mais rapidamente e de forma fluida o conhecimento externo; o mercado, de forma geral, também ganha com os aprendizados obtidos ao longo dos processos; e, por fim, se estabelece um círculo virtuoso de conhecimento compartilhado.

A inovação aberta traz muitos benefícios consigo, como reduzir o tempo de desenvolvimento e comercialização, cria novos mercados, diminui custos, aumenta a possibilidade de aprovação do produto pelo público e também pode gerar ideias e base de conhecimento.

Ela ajuda a empresa e o ecossistema externo a ela. Vemos, portanto, que estamos falando de uma via de mão dupla. A empresa tira proveito do conhecimento que é produzido externamente, utilizando-o no desenvolvimento de produtos e serviços. Ao mesmo tempo, o mercado como um todo ganha esse novo conhecimento que foi agregado e outros interessados podem fazer uso dele, formando, assim, um círculo virtuoso.

Segundo relatório da Distrito de Open Innovation, o Brasil tem hoje quase 14 mil startups em 694 cidades e perto de 4,6 mil integrantes no sistema. O primeiro semestre fechou com US$ 5,2 bilhões investidos em startups brasileiras, representando um aumento de 296% em relação ao ano de 2020.

A forma como a inovação aberta será implementada, no entanto, vai variar de acordo com a empresa. Cada organização tem requisitos individuais que dependem, por exemplo, de unidades de mercado, B2B ou B2C, indústria em ritmo acelerado ou complexidade das tecnologias e competências aplicadas.

Mas o que todas têm em comum: é preciso ter uma base sólida e necessária de estratégia e cultura de inovação aberta.

Não existe receita de bolo de qual o melhor programa, projeto, estratégia ou um play book de como fazer inovação aberta. No entanto, quero propor aqui um resumo do que uma empresa não deve fazer, evitando, assim, transformar inovação aberta em inovação furada.

1 – Uma pessoa de inovação para tudo – Uma andorinha só não faz verão, já dizia o ditado. Muitas empresas colocam uma pessoa só para transformar uma organização e essa pessoa, heroicamente, tem que lutar contra culturas instauradas, pensamentos retrógrados, ou muitas vezes simplesmente fica sobrecarregada com o tanto que é esperado dela. Chamamos essa pessoa de Willian Wallace da Inovação – fazendo alusão ao filme Coração Valente, quando Mel Gibson enfrenta um exército numericamente superior do outro lado.

2 – Não provisionar budget – É absurdamente alto o número de empresas e executivos que esperam que seus times operem milagres, façam projetos incríveis e grandiosos de inovação, mas sem orçamento para suportar. Inovação precisa de orçamento, precisa de recurso e suporte para acontecer. Sem budget, sem projetos. Quem quer rir tem que fazer rir.

3 – Não faz parte da estratégia – A Inovação aberta não pode e nem deve ser conduzida somente como uma iniciativa egóica e imagética da empresa ou da liderança, somente para sair na imprensa ou no ranking das empresas inovadoras. Ela deve ser pauta estratégica, deve estar inserida dentro do plano de longo prazo da empresa, com objetivos claros de onde espera chegar, o que pretende alcançar. Do contrário, sempre será frágil, e será cortada na primeira oportunidade que a empresa precisar.

4 – Sem foco – Mesmo se estiver inserida dentro de uma pauta estratégica, é preciso definir objetivos claros e pilares de atuação. Foco para qual unidade de negócio estamos trabalhando, para qual fim, onde e de que forma atuamos. Isso pode fazer com que as atividades e resultados sejam otimizados.

5 – Atua através de relações predatórias – Muitas são as empresas que fazem iniciativas como hackathon por exemplo, colocam um desafio épico, juntam 30 startups, que viram 3 noites sem dormir, e a premiação é uma pizza, e uma matéria no jornal. Lembre-se sempre: quem está do outro lado está trabalhando tem sonhos e família envolvidos. Se você é uma empresa grande, ao invés de ter uma relação abusiva com um player pequeno, faça ao contrário, empodere e alavanque o ecossistema. Se você chama 8 players para um concorrência e depois de 5 fases escolhe um player que ainda vai ser completamente reduzido em uma negociação abusiva com compras, então sua empresa ainda precisa se conscientizar. Isso no médio e longo prazo traz mais benefícios e todos irão querer se engajar mais ainda em qualquer iniciativa da empresa.

6 – Não está preparado para trabalhar com players pequenos e startups – Acredite, se você paga uma Nota Fiscal em 90 dias, você não está preparado para inovação aberta. Isso pode falir uma empresa. Um player pequeno depende de receber rapidamente para compor fluxo de caixa, já que por ser pequeno e novo, não tem caixa volumoso. Se você precisa praticar um due diligence completo, e pedir uma investigação de CPI para uma startup, provavelmente você vai inviabilizar a parceria. Se você pede para um fornecedor pagar um sistema de cadastro que é da sua área de compras, você não está preparado para inovação aberta. Seja parceiro, revisite suas jornadas de contratação de um fornecedor.

7 – Quem está dentro não tem abertura para inovar – Lembre-se: Inovação aberta começa sendo aberta internamente para as pessoas poderem também inovar. Não adianta ter uma postura para o externo e outra para o interno. O discurso descolado da ação não dura muito tempo até vir à tona e os colaboradores internos precisam ter também ferramentas e programas para poderem inovar, participar, engajar na inovação. E não confunda isso com caixinha de sugestões. Faça direito! Isso muda o jogo.

8 – Chapéu duplo é o início do fim – Muitas empresas que não tem foco e não querem despender recursos, colocam um ser bem intencionado para trabalhar em uma posição atual, exemplo, gerente de marketing de uma linha de produtos, para também ser o líder de inovação aberta. Isso não funciona. O core business sempre engole a inovação em prioridade, cobrança, foco e recursos. É preciso proteger e empoderar a inovação aberta. Às vezes, essa pessoa com chapéu duplo até consegue, com muito esforço, implementar algo, mas acredite, a probabilidade de a inovação aberta nesta empresa viver para sempre na “Terra do Nunca”, e não crescer seu tamanho, é altíssima.

9 – Sem continuidade – Acredite: nada termina em um pitch day. Muitas empresas começam muitas iniciativas, investem em milhares de ideações, hackathons, que culminam em maravilhosos pitchdays para todos verem, verdadeiros espetáculos. Mas nenhum deles tem continuidade, vai pra frente, tem lideranças que executam e testam, e implementam. Iniciativa sem acabativa não sustenta inovação aberta por muito tempo. Ela, assim como tudo dentro da empresa, precisará mostrar resultados.

10 – Sem mentalidade aberta – A cultura é o maior anticorpo da inovação. Não adianta fazer programas maravilhosos de inovação aberta, se a liderança e a empresa não está preparada para isso, e nem aberta para isso. Em outras palavras, antes de fazer inovação aberta, a mentalidade precisa estar aberta, sem egos, sem preciosismos. É muito comum, por exemplo, uma área de produto criar diversos empecilhos a uma empresa externa de criar e participar do desenvolvimento de novos produtos, simplesmente por que ela acredita que ninguém faz aquilo melhor do que ela. Pratique o desapego.

Inovação aberta é o presente e futuro de como as empresas atuam para crescer e inovar, mas é muito fácil transformar tudo isso em uma furada.

Inovação aberta é diferente de inovação furada.

Acredite, as pessoas e empresas irão saber a diferença.

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