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Opinião

Quanto vale a música?

A discussão em torno do pagamento dos direitos autorais passa bastante longe de ser uma novidade na indústria da música


15 de julho de 2016 - 8h28

A discussão em torno do pagamento dos direitos autorais passa bastante longe de ser uma novidade na indústria da música. Não foram as vendas de compactos e álbuns, as trilhas para o cinema, as campanhas publicitárias, tampouco as execuções públicas em rádios e tvs que geraram as leis que promovem a remuneração aos artistas pelo uso de suas obras. Apesar desta questão ter se intensificado recentemente, ela vem de uma época pouco tecnológica e muito distante dos millennials.

Uma breve pausa pra história: os primeiros empreendedores que ganharam dinheiro “negociando música”, vendiam publicações com as partituras de obras que eram apresentadas em shows itinerantes (como os vaudeville), no início do século passado. Acredite: essa era a única forma de levar “música” pra casa. Não existia mídia gravada. A pessoa tinha que ir a uma loja de música, comprar a partitura para, depois, tocar e cantar as canções no piano de casa. Só assim poderia ouvir de novo as músicas apresentadas nos shows.

Logo depois surgiram os “rolos de piano”, a primeira forma mecânica de reprodução musical a se popularizar. Foi aí que o pau começou a quebrar. As editoras que vendiam partituras enlouqueceram. A questão era óbvia: quem pagaria por partituras (que exigiam alguém tocando e, muitas vezes, cantando) enquanto a nova tecnologia permitia que o piano fizesse o serviço (quase todo) sozinho? Foi neste momento que o primeiro acordo de direitos autorais foi celebrado, definindo que as editoras receberiam royalties sempre que um rolo de piano fosse vendido.

Voltando para o nosso tempo: desde que a música deixou de ser distribuída fisicamente – através dos antigos “discos”, cassetes ou (nem tão antigos) CDs – e passou a voar pelo mundo na forma de “zeros e uns”, a indústria da música vem convivendo de forma mais intensa com os descontentamentos decorrentes da escassez, cada vez maior, do dinheiro que deveria ser pago aos criadores e administradores das obras.

Em 2000, o Metallica foi a primeira grande banda a comprar uma briga pública contra uma plataforma de compartilhamento de músicas – o Napster (à época uma plataforma ilegal) – pavimentando o caminho para as lojas digitais e plataformas que exploram a música como seu principal conteúdo. O tempo passou, o dinheiro apareceu. O You Tube já colocou mais de 3 bilhões de dólares no negócio da música. O Spotify, segundo o próprio serviço, já pagou mais de 500 milhões de dólares em direitos autorais para artistas e gravadoras. Mas, será que as regras de direitos autorais e conexos vigentes atendem adequadamente à realidade do novo modelo de consumo de música?

A insatisfação da indústria com os acordos firmados já vinha provocando o engajamento de muitos artistas mundo afora contra o formato atual, mas com avanços pouco significativos.

Agora, meus amigos, a cavalaria chegou.

Um grupo de 180 artistas e compositores, incluindo pesos-pesados como Taylor Swift e Paul McCartney, além das próprias gravadoras, pedem uma revisão no chamado DMCA (Lei dos Direitos Autorais do Milênio Digital), que regula os direitos autorais online desde 1998.

Essa trupe casca-grossíssima defende a tese de que as plataformas de video que oferecem música gratuita aos seus consumidores (como o You Tube, por exemplo) estão operando com “vantagem competitiva”. Isso porque, pelo acordo antigo, criou-se uma espécie de “porto seguro” às plataformas deste tipo com relação à infração de direitos cometida por terceiros. Mas este não é o único ponto, e nem o que mais dói: há uma certeza de que a gratuidade dificulta o convencimento das pessoas para aderirem aos planos pagos dos serviços de streaming, grande fonte de recursos para artistas e gravadoras. Afinal, “por que pagar pela música, se é possível ouvir tudo de graça”?

A palavra mágica que tira o sono do Spotify, Apple Music, Tidal, artistas e gravadoras é “conversão”. Como fazer um usuário gratuito virar uma usuário pago? Essa é a questão central.

E não imaginem que essa discussão está restrita ao hemisfério norte. Numa recente conversa com o empresário de uma das maiores bandas do Brasil, percebi o quanto nossos artistas estão atentos aos passos que estão sendo dados nos mercados mais maduros. Quando personagens do quilate de um Paul McCartney levanta o braço, o mundo espera o próximo movimento. Artistas, autores e companhias entendem que devem receber pagamentos mais justos daqueles que, de alguma maneira, lucram com sua propriedade. Na outra ponta está uma geração de consumidores que entende a música como uma commodity gratuita e não se sente muito disposta a pagar para ouvi-la.

Os tempos mudaram nossos hábitos brutalmente. O que não mudou foi a velha máxima da indústria da música:

“Everytime the music gets played, somebody gets paid”.

Acrescento: “Or should be…”.

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