Reimaginando a comunicação das marcas
Em um mundo em transformação, o que está em jogo é como e em que medida estão comprometidas com seus consumidores e com o futuro
Em um mundo em transformação, o que está em jogo é como e em que medida estão comprometidas com seus consumidores e com o futuro
Vivemos tempos de inquietação. O mundo, em constante transformação, exige das marcas um posicionamento que transcenda a função de vender produtos ou serviços. A publicidade tradicional, com seus comerciais de 30 segundos, ainda cumpre o papel de desenvolver atributos funcionais, mas já não basta para dialogar com consumidores que buscam mais, demandam conexão, significado e impacto. O que está em jogo não é apenas o que as marcas fazem, mas como e em que medida estão comprometidas com seus consumidores e com o futuro.
Essa demanda reflete o espírito de uma era em que tudo parece precário e transitório. O filósofo Zygmunt Bauman descreveu nossa modernidade líquida como um tempo em que certezas se dissolvem rapidamente. Nesse cenário, as empresas precisam se reconstruir continuamente, tornando seus propósitos visíveis e palpáveis. Não se trata apenas de palavras ou slogans, mas de ações consistentes, integradas à vida cotidiana de seus consumidores e à realidade social.
A marca Patagonia é um exemplo de como os valores podem ser o núcleo de uma estratégia empresarial. Suas campanhas não falam apenas de sustentabilidade, mas incorporam ações concretas, como a doação de 100% das vendas da Black Friday para causas ambientais. É uma mensagem clara: a empresa não existe apenas para lucrar, mas para lutar por algo maior. Essa postura não só fideliza os consumidores, mas os transforma em defensores ativos da marca.
No entanto, uma narrativa do propósito não deve ser uma busca desesperada por relevância; deve ser sincera. Yuval Noah Harari, em Homo Deus (Companhia das Letras, 2016), aponta que as sociedades contemporâneas estão sedentárias por narrativas que façam sentido em um mundo hiperconectado e saturado de informações contraditórias. Nesse contexto, o desafio das marcas é criar histórias que transcendam o ruído e ressoem profundamente, demonstrando um compromisso autêntico com seus valores.
No Brasil, a Natura é um exemplo marcante de como alinhar práticas e discursos. Suas campanhas não apenas comunicam sustentabilidade e inclusão, mas também se baseiam em ações práticas, como o apoio às comunidades extrativistas na Amazônia. Ao integrar essas práticas ao seu modelo de negócios, a Natura mostra que a integração de propósito e lucro pode ser virtuosa, desde que as ações sejam consistentes e integradas.
Mas a inovação na comunicação deve ir além das campanhas. O mundo inquieto de hoje exige experimentação constante e formatos disruptivos. A Ikea, com seus espaços urbanos interativos na Suécia, permite que os consumidores vivam os valores da marca, construindo soluções práticas e sustentáveis para suas próprias casas. Da mesma forma, a Heineken, com o projeto Open Your World , gerou diálogos entre pessoas com visões opostas, mostrando que a marca não apenas vende cerveja, mas promove a tolerância e a conexão humana.
Esses exemplos revelam que o propósito de uma marca precisa se enraizar em ações que tocam diretamente na vida das pessoas. Não é suficiente apresentar programas televisivos patrocinados ou inserir marcas de maneira sutil em roteiros de novelas, séries e reality shows. A comunicação do propósito deve ser ativa, experimental e participativa, rompendo as barreiras da tela e se inserindo na sociedade de maneira tangível.
A inovação também deve ser aplicada aos formatos. Documentários, podcasts, séries e eventos presenciais oferecem oportunidades para marcas contarem histórias que conectam, educam e inspiram. Mas não se pode perder de vista o contexto. Em tempos de algoritmos que moldam o que consumimos, as marcas têm a obrigação de superar a superficialidade e oferecer algo mais profundo, algo que ressoe com a necessidade de um futuro mais inclusivo e sustentável.
Contudo, o caminho não é simples. Peter Drucker, em Desafios Gerenciais para o Século XXI (Pioneira Thomson Learning, 1999), alerta que organizações que não alinham discurso e prática correm o risco de perder a confiança de seus públicos. Esse alerta é ainda mais relevante em um momento em que a transparência não é apenas um ideal, mas uma exigência.
Comunicar propósito é um exercício de humanização e empresas maximalistas entendem profundamente esse conceito. Não se trata apenas de se adaptar ao mundo em constante mudança, mas de moldá-lo, inspirá-lo e conduzi-lo a um futuro mais inclusivo, sustentável e significativo. Essa é a verdadeira essência do marketing no século XXI: ser mais do que um reflexo do mercado, ser uma força que ajuda a definir os rumos do mundo que queremos construir.
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