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Simone Biles não é uma heroína, ela é uma desistente

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Opinião

Simone Biles não é uma heroína, ela é uma desistente

A melhor falhou; Que apropriado para alguém que se autoproclama a maior de todos os tempos


6 de dezembro de 2024 - 6h00

Você demitiria a Simone Biles do seu time? Anos atrás um querido amigo teve um burnout gravíssimo que o tirou do mercado por meses, na volta ele se demitiu da empresa que o adoeceu. Ouvi de uma colega que ele não tinha o que era necessário para estar naquele lugar. “O que era necessário para estar naquele lugar?”, pensei dias depois me lembrando da nossa conversa. E então veio o documentário Simone Biles Rising, disponível na Netflix.

“Simone Biles se destaca como ser humano, mas falha como ginasta”; “Desistentes não são modelo para ninguém”; “Simone Biles é uma decepção nojenta. Ela decepcionou o seu time, o seu país e está sendo abraçada pelos seus técnicos e colegas de equipe. PATÉTICO”; “Que tal a cortesia de não desistir de seus colegas de equipe que confiavam em você?”.

Já parou pra pensar em qual seria o rumo da história olímpica da ginástica artística dos Estados Unidos se a Simone tivesse sido descartada da seleção por ter tido problemas de saúde mental em 2020? Biles ganhou quatro medalhas nos Jogos Olímpicos de 2024, três ouros e uma prata. Ter aberto mão da competição em Tóquio fez com que ela não tivesse valor em Paris? Muito pelo contrário, seus resultados profissionais nunca tiveram tanto valor para ela e para o mundo como nesse retorno.

E agora vem a verdadeira reflexão deste artigo. Tirem da equação o fato dela ser uma atleta de grande visibilidade, vamos pensar em Simone como uma profissional dentro do mercado de trabalho, como qualquer outra pessoa. Esta profissional precisou fazer uma pausa para cuidar da saúde mental. Como ela será recebida de volta na empresa que estava ou como será vista em uma nova oportunidade? Como a gestão vai se referir a ela dentro de portas fechadas?

Eu poderia dizer aqui, porque já estive presente em várias dessas conversas, mas não vale a pena. Vou deixar os posts destinados à Simone na época da sua doença mental – que citei no título e entre aspas algumas linhas acima – falarem por mim.

Sabe o que me incomoda mais? Ver profissionais incríveis serem descartados por problemas que muitas vezes o ambiente fomentado pela própria empresa criou, enquanto assediadores e gestores tóxicos são perpetuados. E o problema segue sendo o colaborador que “não tem o que é necessário”. Quem quer ter o que é necessário para ignorar ambientes tóxicos? Só eles mesmos, que se neutralizam. E o curioso é que os perpetuados são mantidos com o argumento de qualidade de entrega, mas a qualidade de entrega não vale nada se o mental está adoecido.

É mais fácil descartar do que acolher, sem dúvida. Mas acolher é transformador, e por mais que a Simone tenha sido apedrejada, ela foi acolhida. Por seus técnicos, sua equipe e sua família, e tenho certeza que ela nunca teria conseguido voltar se não fosse por esse acolhimento e pela empatia de quem sabe que ela não se define por uma doença mental. Os resultados de Paris tão aí pra lembrar que o caminho mais fácil desemboca em uma rua sem saída.

Te pergunto: a Simone Biles não tinha o que era necessário nos Jogos Olímpicos de Tóquio? Uma jovem talentosíssima, disciplinada, competente, maior medalhista da história da ginástica artística, que criou acrobacias que só ela consegue executar, sobrevivente de assédio sexual no trabalho e admirada no mundo inteiro.

Se este currículo não for suficiente para ela estar em qualquer competição e ter o direito de fazer uma pausa para cuidar da sua saúde mental sem ter sua competência ou até seu caráter questionados, o que resta para nós mortais? A Simone Biles não é uma heroína, muito menos uma desistente. Ela é humana. E nós também.

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