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Sobre Roberto, Maria e Antonio

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Opinião

Sobre Roberto, Maria e Antonio

Por que deixar em casa o que é mais importante, para fazer o que você faz?


6 de junho de 2016 - 11h28

É só a gente bobear e a vida assume o controle. Num piscar de olhos a gente liga o piloto auto- mático e passa a trabalhar para ela. Por um instante, que por vezes dura a vida toda, somos tomados por uma inquietude funcional que racionaliza as coisas em busca de respostas também funcionais, para dilemas idem. E nessa jornada, precisamos de fatores extremos para nos reconectar com a história que queremos verdadeiramente contar. Eu tive três.

O primeiro deles foi o falecimento precoce e abrupto de Roberto, meu pai. Que numa manhã, bem cedo, como fazia há mais de 40 anos, ajustava milimetricamente sua gravata quando teve um infarto fulminante. Foi tudo de repente e muito violento. Aquele nó de gravata que aparentemente não ficou pronto, ficou tão apertado que me tirou o ar por muito tempo. Sentia-me um equilibrista (sem equilíbrio) numa corda bamba, agora, sem a rede de proteção piscando para mim.

No início eu achava que tinha me faltado tempo. Hoje eu entendo, tempo nunca falta, quem falta somos nós (e que falta faz isso). Só queria ter feito uma ligação. Só para me despedir, dizer que o amava e tentar compreender, o que nem ele, que sabia tudo, talvez soubesse: Por que pai? Por que desse jeito? Por que trabalhar tanto há tanto tempo mesmo quando os seus olhos já não brilhavam mais?

Anos depois, com o nascimento de minha filha Maria, por um motivo diametralmente oposto, tive a segunda oportunidade. Um momento mágico, supremo. O significado de minha vida estava lá resumido em 50 centímetros. Minha alma (outrora pesada) estava tão leve que com seus três quilos poderia voar. É como se a vida fosse um compilado de placas tectônicas que agora se encaixavam. Durante quase um mês fui somente uma coisa: pai. E no dia de voltar ao trabalho, lembrei do meu. Da pergunta que queria ter feito a ele e que podia agora fazer a mim mesmo. Por que fazer o que eu faço? Por que deveriam se importar com isso? Por que deixar minha Maria em casa para fazer o que eu faço?

Claro, quase automaticamente, vem a resposta racional, funcional: “dinheiro, meu caro, lembra?” Talvez a mesma resposta que o meu pai teria me dado. A mesma que fez com que chegássemos confortavelmente até aqui. A mesma que me será eternamente desconfortável, sempre que me fizer lembrar dos olhos de meu pai, 40 anos depois, indo trabalhar, mas deixando a alma em casa.

A busca por significado nem sempre é uma tarefa fácil. Exige um trabalho quase destemido. É uma escolha vulnerável que nos conecta com nossos sentimentos. O fato é que aprendemos a fazer isso com marcas. E, de certo modo, contamos a história delas muito bem. Mas não aprendemos a fazer o mesmo com nossas vidas — um pequeno grande detalhe que pode ser a diferença entre fazer algo extraordinário e algo que não fará a menor diferença para gente e nem para ninguém.

E ao escrever esse texto, ainda em licença paternidade, envolto em fraldas e numa atual noite maldormida, me volto a essa reflexão. A vida me deu há duas semanas essa terceira oportunidade: duplicou meu coração de tamanho para o nascimento de meu tão esperado filho Antonio. Mais um capítulo da minha história. Mais uma vez, bate na porta, o sentimento de que preciso fazer algo mais. Que fazer publicidade por fazer é muito pouco. Que se por um lado até lustra o ego, por outro, também me envergonha pela sua luxúria e insignificância.

Não tenho a resposta. Mas é essa inquietude que vai sempre fazer meus olhos brilharem — fazer boa publicidade, de um jeito legal e sobre coisas boas. Seja lá o que isso signifique.

Volto hoje a trabalhar e de uma coisa não abro mão: posso até não gostar do que eu venha a fazer, mas sempre, por mim e pelos meus filhos, vou em busca de fazer o que eu gosto, do que me faça feliz. É isso que verdadeiramente a vida quer da gente. E é para isso que ela serve. Não para ser nossa chefe, mas para ser nossa maior inspiração.

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