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Opinião

Sonhar e agir

Enquanto idealizam clientes ousados, inovadores e praticantes de remuneração justa, agências de publicidade convivem com – e aceitam – a mesma prática que mais condenam: as concorrências predatórias


17 de setembro de 2024 - 14h00

Certamente, não existe o “cliente ideal”, assim como não há a “agência ideal”. O dicionário já ensina que ideal é o “que só existe na imaginação”. Apesar disso, em diversos momentos das relações pessoais ou empresariais, a busca do ideal não somente nutre sonhos como pode impulsionar avanços práticos. Para aplicar essa teoria na avaliação que as agências fazem dos relacionamentos que mantêm com os anunciantes, Meio & Mensagem repete nesta edição uma pesquisa que realizou há dez anos. Para possibilitar a comparação, a metodologia é a mesma, propondo três questões abertas a líderes de 50 das maiores e mais importantes agências de publicidade atuantes no País.

Um dos exercícios foi o de listar as principais características que gostariam de encontrar no “cliente ideal”. Um dos aspectos que mudou na última década foi a valorização da ousadia e da inovação nos anunciantes. Esse tópico saltou de 17% de citações em 2014 para 34% agora, assumindo o topo da lista das práticas mais valorizadas pelas agências. Outros traços que apontam para um desejo de que os clientes sejam mais arrojados são a coragem, cujas menções subiram de 11% para 16%, e a criatividade, que se manteve estável, na faixa dos 20%.

Entre as dez características mais citadas, há duas eminentemente financeiras: remuneração justa, que há dez anos foi citada por 35% e agora aparece com 26%, e verba relevante, que não aparecia entre as principais menções em 2014 e na pesquisa atual foi citada por 16% dos entrevistados.

Uma segunda questão pediu para os líderes de agências listarem as práticas mais condenáveis da atualidade na relação com os clientes. O maior incômodo continua sendo o mesmo de dez anos atrás: as concorrências predatórias, foco dos maiores índices de citações de toda a pesquisa, com 48%. As queixas incluem a motivação de reduzir custos, o excesso de agências convidadas, a falta de remuneração para as participantes, a ausência de critérios claros e os retornos demorados e inconsistentes. Sempre que se debate a roleta russa das concorrências — e o lamento das agências é muito anterior à pesquisa de 2014 — é preciso considerar parcela de culpa das próprias agências, que aceitam a prática que condenam e não conseguem se afastar desses processos que são sua principal fonte de prospecção de contas.

O terceiro tópico da pesquisa tem o objetivo de construir o ranking dos clientes mais desejados do mercado nacional. A reportagem pediu que os respondentes indicassem as três empresas que mais gostariam de atender, considerando apenas aquelas com as quais não têm relacionamento comercial neste momento. Os 50 participantes indicaram 42 anunciantes diferentes, colocando no topo o mesmo cliente vencedor da pesquisa feita em 2014: o Itaú, citado por 40% dos entrevistados. Embora com um índice menor do que os 54% marcados na pesquisa anterior, impressiona a capacidade do banco de se manter como principal objeto de desejo da publicidade brasileira. As coincidências com o ranking de dez anos atrás praticamente param por aí, pois somente outra marca se repete: a Volkswagen, que marcou 16% e ficou em quinto lugar em 2014, e agora aparece com 10%, na décima colocação. A renovação na lista dos clientes mais desejados reflete as mudanças ocorridas na indústria na última década, com ascensão de marcas como Mercado Livre, Heineken, Amazon, Nubank, Santander e Burger King.

Uma das características que os líderes de agências gostariam de encontrar no “cliente ideal” é a manutenção de uma relação longeva. É curioso notar que esse é um dos traços das duas marcas que se repetem nos rankings de anunciantes mais desejados de 2014 e de 2024. O Itaú foi o cliente inaugural da Africa, no final de 2002. Atualmente, a agência divide a conta com a Galeria, que nasceu em 2021 e também tem o banco como uma de suas contas fundadoras — é preciso considerar, aqui, que a Galeria foi fundada pelo grupo de líderes que comandava a DPZ (então DPZ&T), agência que atendia o Itaú desde 1972. A Volkswagen, segunda marca reincidente, trabalha com a AlmapBBDO desde 1956 — isso mesmo, nada menos do que 68 anos.

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