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Sonho, substantivo masculino

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Opinião

Sonho, substantivo masculino

Como nos velhos tempos, proporei que façamos uma das nossas redações completamente ilógicas


31 de maio de 2023 - 15h55

(Crédito: Divulgação)

Carlos Tarcha era o número oito na chamada da 5ª série A. Eu era o sete. Além da coincidência de sermos xarás, tínhamos algo mais em comum: um modo muito peculiar de fazer redações.

O colégio era bem puxado. Mas antes de prepararmos nossas composições escolares, escrevíamos outras, na paralela, totalmente sem sentido.

Catávamos palavras do dicionário Caldas Aulete e as juntávamos, a esmo, para formar textos absurdos. Então, no recreio, cada um puxava a folha de papel almaço e discursava sua redação nonsense para os colegas, que caiam na gargalhada.

Hoje, Carlos Tarcha é professor titular de percussão na Hochschule für Musik Köln, Escola Superior de Música de Colônia, na Alemanha. Atua em séries de concertos e festivais nos Estados Unidos e Europa em diversas formações camerísticas.

Sempre vejo suas performances no Youtube e me encanto com o modo como o vizinho de carteira percute suas baquetas trazendo o melhor da música contemporânea a nossos ouvidos.

Como virei redator, cristalizei nas palavras. E, recentemente, realizei um sonho que vem desde a 5º A: ser parte de um dicionário.

Há um ano, li uma reportagem que expunha as dificuldades do Houaiss, o mais completo glossário brasileiro, para manter suas atividades. Seu lexicógrafo, Mauro Villar, hoje com 83 anos, declarava que o Houaiss só existia porque ele estava trabalhando diariamente. E que não sabia dizer o futuro do dicionário quando decidisse se aposentar.

Não estamos preparando ninguém neste momento para me suceder – alertava Villar.

O depoimento finalizava com este parágrafo:

Vai haver um momento em que não será possível manter o trabalho da forma em que está. Teremos que reestruturar, talvez vender nossa sede. Por enquanto, conseguimos levar. Eu não sei dizer se estamos no meio ou no fim. Mas certamente não estamos no começo. Trabalharei no dicionário enquanto tiver forças — e, neste momento, eu tenho bastante.

 Decidi fazer contato com Mauro Villar e o ajudei a montar suas redes sociais. Com o diretor de arte Fernando Cardamone, criei campanha para o digital. Com Marcelo Maia, o primeiro anúncio do Houaiss, veiculado, em maio, no jornal literário Rascunho.

Mas ainda é pouco. Uma obra de referência com cerca de 240 mil palavras cadastradas merecia uma atenção milhares de vezes maior. Espero, em breve, poder efetivar algo que estimule empresas a assinarem o Houaiss Corporativo, a versão online do livro impresso, perfeita para os colaboradores terem em seus computadores, celulares e tablets.

Quando esta crônica sair, a primeira coisa que farei será enviá-la ao Tarcha. Como nos velhos tempos, proporei que façamos uma das nossas redações completamente ilógicas. Já posso vê-lo rindo do convite. Mas, dessa vez, consultaremos o Houaiss.

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