4 de abril de 2025 - 14h00
A decisão da OpenAI de restringir a geração de imagens que imitam o traço do Studio Ghibli no ChatGPT reacende um debate central para o mercado criativo e tecnológico: os limites da propriedade intelectual na era da inteligência artificial. Se, inicialmente, a discussão se concentrava em conteúdos textuais – como nos embates com o New York Times, Reddit e outros portais -, agora o foco se amplia para obras visuais com identidade artística consolidada.
O estopim foi a viralização de imagens geradas por IA no estilo do estúdio japonês, o que levou a OpenAI a implementar um bloqueio parcial dentro do gerador de imagens do ChatGPT. A justificativa oficial fala em uma “abordagem conservadora”, mas o gesto sinaliza algo maior: o reconhecimento de que estilos visuais também são ativos criativos protegidos — e, portanto, passíveis de licenciamento.
Licenciamento: o caminho inevitável para criadores e plataformas
Em vez de discutir se a IA “mata a arte” ou se é um “novo processo criativo”, o mercado caminha para uma lógica mais pragmática: o uso de obras autorais – sejam textos, imagens, vozes ou estilos visuais – deve ser autorizado por seus detentores e, idealmente, monetizado via licenciamento.
É esse modelo que tem sido adotado por plataformas como o Reddit e a Associated Press, que fecharam acordos com a OpenAI para o uso de seus acervos no treinamento de modelos de linguagem. Em contrapartida, o New York Times decidiu bloquear completamente esse tipo de uso, citando remuneração insatisfatória e o risco de concorrência direta com seu próprio produto digital.
Esse embate sinaliza o que está por vir para o setor audiovisual. Se um artista ou estúdio não deseja que sua estética seja replicada por inteligência artificial, cabe a ele a prerrogativa de negar ou conceder esse uso mediante contrato. A questão, portanto, não é técnica – é contratual.
Um mercado fragmentado e assimétrico
O desafio está em como aplicar essa lógica num mercado fragmentado. Enquanto grandes grupos de mídia contam com estrutura jurídica robusta e poder de barganha para negociar diretamente com empresas como a OpenAI, artistas independentes enfrentam sérias dificuldades para fiscalizar e proteger o uso de suas criações.
Nesse cenário, ganha força a necessidade de intermediários especializados na gestão de direitos digitais. Assim como o mercado fonográfico viu o surgimento de distribuidoras como OneRPM e TuneCore para viabilizar a presença de músicos independentes nas plataformas de streaming, o setor visual tende a caminhar para soluções semelhantes — plataformas ou startups que representem os interesses de artistas e facilitem o licenciamento coletivo de suas obras.
Além disso, é preciso considerar o aspecto jurídico. No Brasil, a legislação já prevê que o uso indevido de uma obra pode ser contestado, mesmo com contrato assinado, se houver violação à honra ou à reputação do autor. Isso reforça a importância de acordos claros e equilibrados, que protejam tanto os criadores quanto o uso legítimo da tecnologia.
O caso Ghibli é só o começo
A movimentação do Studio Ghibli é simbólica – um estúdio consagrado tomando as rédeas sobre sua identidade visual em um momento de aceleração da IA generativa -, mas está longe de ser um episódio isolado. Com o avanço da inteligência artificial sobre campos cada vez mais criativos, a questão central não será mais o que a tecnologia pode fazer, mas sim quem tem o direito de decidir como sua obra será utilizada.
O futuro da inteligência artificial será moldado tanto pelos engenheiros que desenvolvem os modelos quanto pelos artistas, advogados, plataformas e criadores que lutarão para garantir que a inovação respeite o valor – e os direitos – da criação humana.