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É crescente a participação de fundos de venture capital nos esportes, mas essa incursão deve ser feita com responsabilidade


13 de janeiro de 2025 - 14h00

A maior transformação na indústria do esporte nos últimos anos foi a enxurrada de investimentos provenientes de fundos de investimento e empresas de venture capital (VC), principalmente americanos. Há 20 anos, raríssimos fundos sérios considerariam um clube, liga ou direitos de transmissão como um “asset class” respeitável.

Quem investiu cedo, ganhou muito. Em cinco anos, o preço de uma franquia da NFL quase triplicou. O Carolina Panthers foi vendido em 2018 por US$ 2,2 bilhões. Em 2023, o Washington Commanders alcançou US$ 6 bilhões. Na Major League Soccer (MLS), o crescimento foi ainda mais acelerado. Em dez anos, a “taxa de adesão” (o direito para lançar uma nova equipe) cresceu de estimados US$ 100 milhões (Atlanta United, 2014) para US$ 500 milhões (San Diego FC, 2025).

Essa valorização de franquias esportivas nos Estados Unidos mostrou aos investidores que o esporte era um mercado que oferecia potencial de ganhos financeiros iguais ou melhores que projetos de tecnologia, infraestrutura ou bens de serviço.

Com o mercado americano supervalorizado, os fundos e VCs começaram a olhar para outras oportunidades, especialmente o futebol europeu.

Atualmente, metade dos clubes da Premier League possui proprietários americanos. O grupo inclui equipes como Manchester United, Liverpool, Chelsea e Arsenal. Na Série A italiana, são sete dos 20 clubes. AC Milan, Fiorentina e AS Roma são apenas alguns exemplos. O mesmo fenômeno ocorre em muitos outros países.

Com a criação da Lei das Sociedades Anônimas de Futebol (SAFs), o Brasil também se beneficiou dessas novas fontes de capital. Com diferentes níveis de profissionalismo e sucesso, agentes como o City Football Group (Bahia), John Textor (Botafogo), 777 Partners (Vasco da Gama) e outros investiram na compra de ativos de futebol por todo o Brasil.

Essa tendência positiva representa uma transformação significativa para a indústria, trazendo novos players, estratégias e exigências que estão redefinindo a dinâmica financeira do esporte.

Se, por um lado, essas novas fontes de capital permitem que os clubes contratem jogadores, construam novos estádios, paguem dívidas e atraiam melhores administradores, por outro, eles também exigem mudanças fundamentais na administração. Os novos investidores chegam com expectativas de retornos financeiros semelhantes aos alcançados em seus projetos fora do esporte. Para isso, demandam rápida profissionalização e melhores gestões financeira e esportiva, até então inexistentes em muitos clubes.
O impacto desses novos parceiros pode ser visto de formas diferentes em diferentes países.

Na Europa, muitos começaram a cortar despesas consideradas supérfluas. O Manchester United, por exemplo, demitiu 250 funcionários, substituiu o tradicional bônus de Natal por um “vale-cesta” e deve diminuir investimentos no futebol feminino. O Chelsea realizou manobras financeiras (legais, mas questionáveis) para alocar menos despesas no curto prazo e melhorar seus resultados. Outros clubes chegaram a demitir até seu mascote para cortar gastos.

No Brasil, as transferências de jogadores para clubes irmãos na Europa devem ocorrer com mais frequência. Como muitos donos de SAFs também são proprietários de clubes europeus (o Bahia faz parte da “família” do Manchester City), veremos cada vez mais jogadores sendo “expatriados” dentro de seus próprios grupos, a preços que geralmente beneficiam o comprador. O caso mais recente são as transferências de dois dos principais jogadores do campeão Botafogo para o Lyon, na França. Ambos os clubes pertencem a John Textor.

Outra área já impactada pela ação de investidores é a mídia. Muitos dos clubes que aderiram à Liga Forte Futebol venderam um percentual (entre 5% e 20%) das suas receitas futuras. Se os investimentos feitos hoje não forem bem administrados, é provável que essa “taxa futura” cobrada pelo investidor comprometa o faturamento e o desempenho destes clubes por várias décadas.

A parceria do esporte com fundos de investimento e empresas de venture capital pode ser muito benéfica para clubes e ligas, mas precisa ser feita com responsabilidade. É fundamental lembrar que o objetivo dos investidores é maximizar o retorno financeiro, e não melhorar o esporte. No mundo ideal, ambos podem coexistir, mas a prioridade será sempre o lucro.

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