W, primeira letra
Washington Olivetto foi mestre na arte de agregar, misturou referências, bebeu nas melhores fontes, liderou a criação da publicidade popular brasileira e encabeçou o movimento que a globalizou
Washington Olivetto foi mestre na arte de agregar, misturou referências, bebeu nas melhores fontes, liderou a criação da publicidade popular brasileira e encabeçou o movimento que a globalizou
No alfabeto histórico da publicidade brasileira, a primeira letra é o W. Qualquer pessoa com um mínimo de contato com o setor sabe o que ela representa. A morte de Washington Olivetto, dia 13, tira de cena o profissional que mais influenciou a atividade no País, mas não apaga sua maior estrela, que continua guiando sonhos e inspirando trajetórias de uma legião de admiradores. A repercussão em diversos segmentos da sociedade prova que ele deixa sua marca pessoal na vida e na carreira de profissionais de várias gerações, incluindo boa parte dos líderes atuais da indústria de comunicação, marketing e mídia.
Olivetto colocou sua inicial no nome da lendária W/Brasil, um dos maiores celeiros de talentos da comunicação no País, além da antecessora W/GGK e da sucessora WMcCann, que ainda a estampa, mesmo sete anos após sua saída — e o W continuará sendo a letra mais importante da história do setor, mesmo quando não estiver mais lá, pelo menos no nosso tempo, já que não há configurações visíveis que possibilitem o surgimento de um publicitário com tamanho prestígio em tantos segmentos da sociedade.
“Durante muito tempo eu não tive dúvida de que os dois melhores países para ser publicitário eram Brasil e Inglaterra. Países onde o público é receptivo, de diferentes maneiras, à comunicação comercial. Credito muito da receptividade do brasileiro à miscigenação. A mistura de raças gerou um povo musical, bem-humorado, sensual, emotivo. E isso nos faz receptivos a mensagens talentosas, inteligentes, brilhantes”, me disse, em 2016, numa das entrevistas que fiz com ele.
Em artigo publicado na semana passada, no site de Meio & Mensagem, Rynaldo Gondim, que se tornou amigo de seu ídolo, contou que Olivetto era chamado na agência de “Letra” e trabalhava ao lado de um sofá no qual recebia amigos famosos nas mais variadas áreas, do jogador Sócrates ao cantor Arnaldo Antunes, da atriz Maitê Proença ao jornalista Fernando Morais (autor de Na toca dos leões, a principal biografia do publicitário). “Uma agência que não tem um clima alegre normalmente tem um trabalho triste, coisa que em comunicação não funciona”, dizia.
Olivetto relançou hits da música popular brasileira a partir de releituras nos filmes de Rider, ele próprio tornou-se hit popular na voz de Jorge Ben Jor e militou nos bastidores do esporte pelo movimento Democracia Corinthiana. “É melhor ser coautor de coisas brilhantes do que autor solitário de coisas medíocres” é um dos mantras que mais repetia.
Reconhecido pelo sucesso na arte de agregar, misturou referências, bebeu nas melhores fontes, liderou a criação da publicidade popular brasileira e encabeçou o movimento que a globalizou. “Tentar ser original o tempo inteiro é praticamente impossível. Agora, a nossa obrigação é sempre tentar fazer o novo de novo, mesmo sendo filho do já existente”, ensinava.
Cannes era a sua base de lançamento para o mundo — tanto que até comprou uma casa nos arredores. Foi o primeiro a entender e a usar a repercussão do principal festival de publicidade do mundo a favor da reputação pública de seu nome e das agências que defendeu. Foi em Cannes que Olivetto recebeu o convite para se associar à suíça GGK. Também foi de lá, durante o festival de 1986, que foi a Zurique assinar contrato com a multinacional para o lançamento da W/GGK. Em 1989, mais uma vez, foi na viagem ao Festival de Cannes que Olivetto e seus sócios emendaram novamente até Zurique para acertar a compra das ações da suíça, o que tornaria a agência 100% nacional, com a adoção da marca W/Brasil.
Na entrevista de 2016, ele citou uma frase que não é de sua autoria, mas que acabou adotando até como título de uma de suas palestras mais famosas: “A aventura pode ser louca se o aventureiro for lúcido”. E assim complementou: “Você pode fazer algo muito atrevido, desde que tenha controle da situação”.
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