Inclusão requer desconforto e investimento
"Também temos poder de consumo. Quando esquecem de incluir, perdem dinheiro”, afirma Ivan Baron, pedagogo, influenciador digital e ativista PCD
"Também temos poder de consumo. Quando esquecem de incluir, perdem dinheiro”, afirma Ivan Baron, pedagogo, influenciador digital e ativista PCD
Fernando Murad
11 de abril de 2023 - 23h27
Você está familiarizado com o teste do pescoço? Olhe para o lado. Se não encontrar pessoas diversas, o teste falhou. Embora o debate sobre a agenda de diversidade e inclusão tenha avançado, a sociedade ainda manifesta muito preconceito e desconhecimento sobre grupos minorizados, como PCDs e o púbico 50+. Colocar todos num mesmo grupo é uma leitura equivocada, por exemplo.
“Somos pessoas, cada uma tem uma subjetividade. Paralisia cerebral são diversas: algumas pessoas usam bengala, outras cadeira de rodas. Algumas não têm fala. Não dá para colocar todos numa caixinha com o símbolo de cadeira de rodas. Não me representa. Assim como pessoas com síndrome de down”, explicou Ivan Baron, pedagogo, influenciador digital e ativista PCD.
Por mais que tenha a visibilidade das redes sociais – soma mais de um milhão de seguidores –, Ivan diz sofrer capacitismo. “Assim como o racismo, o capacitismo é um problema da sociedade. Não existe escala de respeito, mais ou menos LGBT, mais ou menos preto. Todos devem ser respeitados com suas diferenças”.
Ivan se engajou na causa porque nem ele mesmo sabia o que era o preconceito que sofria e não queria que o conhecimento adquirido na faculdade ficasse restrito ao meio acadêmico. “A principal forma de combater é identificar. Quis trazer isso para as redes sociais. Queria apontar o erro de forma mais amigável possível e dar uma solução de educar, com humor”.
Citou como exemplo um vídeo que fez para o TikTok em que brinca com a frase “quem tem deficiência vai para o Céu”. “Não! Também cometo pecado. É preciso parar de nos tratar como anjinhos, com extremismos. Nem mais, nem menos, queremos que naturalizem nossa vivência”, defendeu.
O estereótipo de criador de conteúdo para as redes sociais é o jovem produzindo vídeos para o TikTok. As pessoas mais novas, que nasceram na geração digital, se comunicam bem nas redes sociais. Já as gerações que chegaram antes, vieram com o aprendizado ancestral da oralidade. “Não é que as pessoas mais velhas não se comuniquem bem. Vemos frutos disso nas redes”, diz Egnalda Côrtes, CEO da Côrtes e Companhia, ressaltando a frase dita a ela por uma PCD trans, PhD em literatura: “meu maior aprendizado foi com minha avó, que me ensinou a contar histórias”.
Fundadora da primeira agência de influenciadores negros da América Latina, criada em 2015, e na faixa etária de 50+, Egnalda defende que o futuro será feito por jovens, crianças, velhas e velhos. “Quem não valoriza os mais velhos está destinado a ser colonizado de novo. Uma pessoa mais velha pode ter rugas ou botox, ter corpo musculoso. É preciso quebrar estereótipos. Vivemos séculos de uma ideia única. Para construir algo novo, é preciso que as pessoas venham sem estereótipos”, analisou.
Atrelado ao longo de décadas à padrões ideais nada diversos e à busca por evitar marcas do envelhecimento, o setor de beleza está mais avançado na pauta de diversidade e inclusão na comunicação e nos produtos. “Quando compramos algo, tem a ver com autoestima. Então, nada mais natural do que trabalhar para incluir mais pessoas”, afirmou Rony Santos, gerente de diversidade, inclusão e equidade do Grupo Boticário.
Segundo o executivo, uma grande parcela da população não se reconhecia na TV e nos comerciais, e o setor de beleza foi pioneiro. “Não está onde deveria estar; já percorreu algum lugar, mas tem muito para avançar. Somos um povo diverso, feliz e alegre. A marca que não se comunica com esse público, exclui grande parte da população”, pontuou, destacando que a diversidade é um desafio quantitativo e a inclusão, qualitativo.
No caso do Grupo Boticário, a jornada para ser uma marca inclusiva segue cinco passos. O primeiro é ter lojas acessíveis a todos, além de produtos também acessíveis, em segundo lugar. Em seguida, consultores preparados e colaboradores diversos na indústria e na rede de fornecedores. Por fim, diversidade nas campanhas.
“Para que tudo isso aconteça, envolvemos 30 áreas. Quando me perguntam quantas pessoas trabalham com diversidade não digo 8, mas os 13 mil funcionários. Diversidade não pode estar restrita. Não é um destino, é uma viagem”, salientou Rony.
Como sociedade em eterna construção, coerência é fundamental. “Se digo que a população 50+ que hoje representa 8% do consumo representará 18% em 2030, significa que vai lucrar mais. Inclusão é lucro”, disse Egnalda. Ainda segundo a CEO da Côrtes, uma marca inclusiva é inteligente, racional e inovadora. É necessário investimento, desconforto e não se conformar com letargia, pois não há solução mágica. “Não é possível que a Luiza Trajano precise de três reuniões com o conselho do Magalu para conseguir vagas afirmativas”, ilustrou.
Para Ivan, a inclusão não pode ser banalizada. “Não é 1001 maravilhas. Requer desconforto e investimento. Depois vira natural e espontâneo”, comentou. Questionado sobre o que é uma marca inclusiva, emendou: “Que eu me sinta representado, que pessoas como eu se vejam e que marcas pensem que todos podem consumir. As embalagens de cerveja, refrigerante ou maquiagem são acessíveis? Também temos poder de consumo. Quando esquecem de incluir, perdem dinheiro”, alertou.
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