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Olimpíadas

Décadas de superação

A atuação de marcas nos Jogos Olímpicos foi uma quebra de paradigmas e representa algo novo nos 152 anos de vida da versão moderna do evento


18 de julho de 2016 - 17h27

Reportagem publicada na edição Meio & Mensagem Marketing na Olimpíada em novembro de 2015.

Luiz Gustavo Pacete

Felipe-Sarno---MVP-SportsEscrever sobre os Jogos Olímpicos é tratar de história, superação, dedicação e política, mas, também, de números. Somente para a Rio 2016, a estimativa do Comitê Olímpico Internacional (COI) é de que os patrocinadores invistam R$ 1,2 bilhão. As altas cifras não param por aí. Serão mais R$ 1 bilhão movimentado no turismo e outro R$ 1 bilhão na venda de produtos licenciados — em uma operação que envolve 40 mil pontos de venda, 150 lojas oficiais e 37 empresas, entre patrocinadores, apoiadores e fornecedores.

Esse espaço tão fértil em termos de negócios, porém, nem sempre foi receptivo. A atuação de marcas em parceria com o COI se intensificou apenas alguns anos depois da Segunda Guerra, na década de 1950. A geração “baby boomer”, dos nascidos entre 1946 e 1964, causou um impacto econômico relevante elevando o consumo e, por tabela, criando um período fértil para o marketing juntamente com o início das transmissões dos jogos pela TV, o que ampliou a exposição dos atletas. “Naquele momento, em que muitas marcas passaram a se interessar pelos Jogos, o COI não possuía uma estrutura de negócios e isso gerou problemas”, diz Anderson Gurgel, autor do livro Futebol S/A: A Economia em Campo.

Até então, os principais parceiros dos Jogos Olímpicos eram Coca-Cola e Adidas, mas as ações eram tímidas e pontuais.­ A Coca-Cola havia iniciado sua relação com o Movimento Olímpico em 1928, quando enviou mil caixas do refrigerante para a delegação americana em Amsterdã, na Holanda. Outro parceiro dos primórdios foi a Adidas, na época ainda conhecida como Calçados Dassler, que, em 1932, na Olímpiada de Los Angeles, calçou o velocista alemão Arthur Jonath. “Desde então, essas marcas estiveram presentes na evolução das competições e na elaboração da estrutura de marketing olímpico como um todo”, lembra Gurgel.

A partir do final da década de 1960, com as tensões geradas pela guerra fria, as arenas se tornaram palco de manifestações políticas e atos de terrorismo. Em 1968, na Cidade do México, há dez dias do início da Olimpíada, tanques, metralhadoras e atiradores de elite cercaram a principal praça da cidade para cercear manifestantes, centenas de pessoas morreram. Outra tragédia, e das mais emblemáticas, foi quando 11 integrantes da equipe olímpica de Israel foram tomados de reféns pelo grupo terrorista Setembro Negro. Todos os atletas foram mortos — e a tragédia esvaziou o evento. Em 1980, na Olímpiada de Moscou, um grupo de delegações ocidentais, liderado pelos Estados Unidos boicotou a competição. A resposta veio em 1984, nos Jogos de Los Angeles, quando União Soviética, Cuba e Alemanha Oriental não enviaram atletas.

Um marco para o marketing
Em 1986, os Jogos Olímpicos estavam no radar das empresas, o que motivou a criação do The Olympic Partner (TOP), um grupo de patrocinadores de todos os eventos promovidos pelo COI. O TOP foi criado por Michael Payne, então diretor de marketing do comitê. Em entrevista ao site Máquina do Esporte, em 2006, Payne comentou a dificuldade de convencer os potenciais patrocinadores. “Criamos programas para motivar os empregados e a comunidade investidora a mostrar casos de sucesso”, disse Payne.

Segundo Payne, que também contou a história no livro Virada Olímpica, o TOP teve uma grande contribuição não somente para os Jogos Olímpicos, mas para o marketing esportivo. “Convencidas, as marcas ajudaram a criar um novo herói que era o marketing. As patrocinadoras entenderam que pertencer ao programa olímpico era algo poderoso.” A iniciativa atraiu Visa e Panasonic que, juntos com a Coca-Cola, são fundadoras do TOP. Atualmente, esse grupo é composto por 12 empresas: Coca-Cola, Bridgestone, Atos, Dow, GE, McDonald’s, Panasonic, P&G, Samsung e Toyota.
Uma nova fase teve início em 1992, na Olímpiada de Barcelona. Na época, muitas delegações voltaram a enviar seus competidores aos Jogos. A União Soviética e 12 territórios optaram por uma única equipe. A África do Sul retornou após a suspensão de 32 anos, ocasionada pelo regime do apartheid, e a Alemanha competiu como uma única nação após a reunificação.

Muitas das marcas construíram seus legados a partir do TOP. “Naturalmente, a forma como cada marca cresceu desde que se associou aos Jogos Olímpicos dependeu muito mais dela própria do que do evento, diz Clarisse Setyon, consultora de marketing.

O marketing evoluiu e as marcas evoluíram na utilização do evento, porém, novos desafios surgiram. A Olímpiada de Pequim, em 2008, ficou conhecida como a mais cara da história. Foram gastos cerca de R$ 65 bilhões na criação de obras que não se pagaram como o estádio Ninho de Pássaro, que consumiu US$ 500 milhões. Desde então, esse modelo de interferência do COI nas grandes cidades e a sustentabilidade do evento passaram a ser temas recorrentes de críticas e debates. As discussões continuaram na Olímpiada de Londres, em 2012. No Brasil, durante os protestos de 2013, os Jogos chegaram a ser citados, juntamente com a Copa, como eventos dispensáveis.

Relações de longo prazo
Atualmente, o The Olympic Partner (TOP) possui 12 marcas parceiras, algumas delas, com décadas de relacionamento

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Coca-Cola

Desde 1928, a marca mantém um relacionamento com o Movimento Olímpico sendo a primeira patrocinadora do evento.
Em 2005, estendeu o acordo de parceria por 12 anos, até 2020.

Omega
A primeira parceria da marca suíça de relógios com o evento foi na Olímpiada de Los Angeles, em 1932, com o fornecimento de relógios e serviços de cronometragem para as competições.

McDonald’s
O McDonald’s tornou-se patrocinador oficial em 1976, mas já atuava com o Movimento Olímpico desde 1968, nos Jogos de Inverno de Grenoble, na França.

Panasonic
A Panasonic fornece equipamentos de áudio e vídeo desde 1987, mas começou o relacionamento com os Jogos em 1984 como fornecedor de sistema de som e vídeo.

Samsung
A marca sul-coreana juntou-se ao COI em 1988, durante os Jogos de Seul. Dez anos depois, entrou para o grupo dos patrocinadores globais na categoria equipamentos de comunicação.

Atos
A Atos, empresa europeia de serviços digitais, é parceira desde 2001. Fornece serviços de tecnologia da informação para os Jogos Olímpicos e Paralímpicos.

GE
Desde 2005, a GE é patrocinadora mundial e fornece infraestrutura para as instalações dos eventos. A companhia renovou a parceria até 2020.

Dow
A empresa química tornou-se parceira do COI em 2010 e na Olímpiada de Londres, em 2012, foi responsável pela fabricação da estrutura de estádios e arenas.

P&G
A P&G e suas marcas confirmaram, em 2011, o patrocínio global para cinco Jogos, começando por Londres 2012 e se estendendo até os Jogos de 2020, incluindo Rio 2016.

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Visa
Parceiro mundial desde 1986, a Visa entrou para o grupo em 2011 e, desde então, é a marca oficial da venda de ingressos e transações financeiras.

Bridgestone
A Bridgestone anunciou em 2014 o acordo com o COI para ser patrocinadora oficial dos Jogos Olímpicos desde o Rio 2016 até 2024.

Toyota
Em março deste ano, a Toyota entrou para o TOP em um acordo estimado em US$ 835 milhões pela divulgação da marca até a Olímpiada de Tóquio, em 2020.

Adaptação aos novos públicos
Dentre os desafios atuais, está a necessidade de se reinventar. Para alguns especialistas, os Jogos Olímpicos falam para um público que está envelhecendo. “As marcas estão exigindo um rejuvenescimento dos Jogos já que, em parte, elas já não atingem os jovens”, ressalta Gurgel. “O COI está de olho nisso, mas essa mudança radical não vai acontecer. Acredito que a interatividade pode melhorar esse aspecto”, observa Clarisse.
No caso do Brasil, os problemas relacionados à evolução do marketing esportivo ainda são consideráveis. De acordo com José Estevão Cocco, consultor esportivo, que na década de 1970 cuidou do marketing da Caloi, explica que ainda há muito o que se avançar no marketing esportivo no País. “Em geral, 80% dos investimentos são destinados ao futebol e o restante distribuído para outros esportes”, diz Cocco. O executivo lembra da dificuldade na época que a Caloi foi pioneira no apoio ao ciclismo. “Existia ali um problema de incompreensão entre apoiar atletas e se aproveitar de atletas, isso mudou, mas ainda vivemos resquícios”, diz Cocco.
Felipe Sarno, sócio da MVP Sports, agência que possui cases com marcas envolvidas com o esporte olímpico, acredita que nesse momento o interesse pelas empresas nos Jogos e nos atletas tem aumentado. “Antes dos Jogos Pan-Americanos o mercado estava retraído, com muitas especulações, mas com poucos contratos fechados, muito afetado pelo reflexo da economia brasileira. Hoje, após o desempenho dos atletas no Pan, a procura vem aumentando”, explica.

Em prol da transparência
No Brasil, um dos principais temas em relação ao esporte olímpico é a transparência na relação entre marcas, governos e organizadores. A entidade Atletas pelo Brasil, o Instituto Ethos e a LIDE Esporte, com apoio do Mattos Filho Advogados, mobilizaram mais de 20 empresas para discutir regras de patrocínios a entidades esportivas.
Entre essas companhias estão Banco do Brasil, Bradesco, BRF, Centauro, Coca-Cola, Correios, Decathlon, Ernst & Young, Estácio, Gol Linhas Aéreas, Itaú Unibanco, Johnson & Johnson, McDonald’s, Nestlé, P&G, Pão de Açúcar, Somos Educação, TAM, TetraPak, Vivo e Volkswagen. “As empresas integrantes estão em sintonia com a sociedade brasileira, que pede mais gestão e transparência no esporte. O acordo trará melhorias ao mercado esportivo, ao trabalho dos atletas, bem como resultados e benefícios ao público que gosta de esporte”, diz Daniela Castro, diretora executiva da Atletas pelo Brasil.

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