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Olimpíadas

Em busca da maturidade

Após experiência da Copa do Mundo, profissionais de agências esperam que a realização dos Jogos Rio 2016 acelere o desenvolvimento do mercado brasileiro de marketing esportivo


19 de julho de 2016 - 9h15

Reportagem publicada na edição Meio & Mensagem Marketing na Olimpíada em novembro de 2015.

Por Fernando Murad

Entre outubro de 2007 e outubro de 2009, o mercado publicitário brasileiro acompanhou com satisfação os anúncios da Fifa e do Comitê Olímpico Internacional (COI) de que o Brasil sediaria a Copa do Mundo de 2014, e o Rio de Janeiro, os Jogos Olímpicos de 2016. Será apenas a quarta vez na história que um mesmo país receberá os dois maiores eventos esportivos num período de dois anos, e a primeira vez neste século acelerado pela tecnologia da informação.

O marketing esportivo ainda não era nem sombra da plataforma de relacionamento e negócios que se tornou nas décadas seguintes quando o México recebeu a Olimpíada de 1968, na Cidade do México, e o Mundial de 1970, e a Alemanha foi o palco dos Jogos de 1972, em Munique, e da Copa de 1974. Meca dos negócios do esporte, os Estados Unidos viveram situação semelhante à do Brasil nos anos 1990, quando Atlanta foi a cidade olímpica em 1996, logo após a Copa do Mundo de 1994.

O ciclo dos grandes eventos esportivos no Brasil chega à reta final com um clima de quero mais no ar. Apesar do sucesso da Copa do Mundo do ponto de vista operacional e esportivo, o clima quente nas ruas do País após as manifestações de junho de 2013 prejudicou as ativações dos patrocinadores. Ficou a sensação de que o mercado poderia ter avançado mais. A Olimpíada, evento com menores oportunidades comerciais — nenhum local de competição exibe o logo dos patrocinadores, por exemplo — é a nova oportunidade de acelerar o desenvolvimento do setor.

“Eu definitivamente acredito que os Jogos Olímpicos darão um novo impulso na maturidade da indústria brasileira de marketing esportivo assim como a Copa do Mundo”, aponta Aykan Azar, diretor-geral da Octagon Brasil. No entanto, o profissional alerta que fatores externos, como a situação econômica, podem distorcer o cenário da indústria do esporte em particular e levar muitas pessoas a acreditar que o mercado não cresceu como o esperado após a Copa.

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Sem a presença de marcas nas arenas, patrocinadores oficiais, como a Nissan, deverão investir fortemente em ativações e ações que valorizem a experiência da torcida Crédito: Divulgação

Com a experiência de ter atuado em quatro escritórios da agência em três diferentes continentes, Azar considera três elementos como os principais legados para o mercado local após os eventos esportivos: a capacitação dos profissionais, o maior entendimento sobre as oportunidades que o patrocínio oferece para solucionar desafios mercadológicos e atingir objetivos de negócio, e a ratificação da paixão da população brasileira pelos esportes e pelo entretenimento.

“Dada a natureza internacional desses eventos, temos visto um movimento vindo do exterior, por exemplo, por meio de marcas que estão sediadas fora do Brasil, agências que entraram no mercado, profissionais que foram enviados para o País. A indústria tem sido exposta a uma série de últimas tendências e pensamentos. Além disso, uma grande quantidade de talento local foi treinada, e isso proporcionará um benefício duradouro para o mercado e permitirá que a indústria amadureça além 2016”, projeta o diretor­geral da Octagon Brasil.

Com 40 anos de atuação no mercado brasileiro, Jose Estevão Cocco, presidente da J.Cocco Sport Marketing e da Academia Brasileira de Marketing Esportivo (Abraesporte), não compartilha desse otimismo. “Na época das matérias da chegada das agências de fora eu disse que as multinacionais estavam explorando, indo atrás das verbas dos próprios clientes deles que queriam ativar o patrocínio, que as agências eram simples departamentos e seriam desativados. Não deu outra. Algumas fecharam antes mesmo da Copa”, recorda.

Ainda de acordo com Cocco, outro problema para o desenvolvimento do setor é que o marketing esportivo virou moda de dez anos para cá. “Gente que nunca ouviu falar, virou especialista. Surgiram escritórios de internet ou mala de carro. Isso acaba desacreditando. O mercado patrocinador é pequeno, se não tem o resultado esperado, a marca não faz mais. Com a Copa, apareceu mais gente sem formação e experiência que prometeu coisas que não aconteceram. Os anunciantes não têm pessoas específicas. Não há interlocutores à altura. Querem saber preço e exposição. Não se discutem os pontos importantes. O esporte virou apenas tema de campanha. Estou descrente”, afirma Cocco.

Desafio olímpico

O movimento de entrada de grupos de comunicação internacionais no Brasil foi muito acelerado e intenso no começo, mas foi prejudicado pelos acontecimentos sociais do País, segundo Rodrigo Coelho, diretor de patrocínios, esporte e entretenimento da Momentum. “A realidade mudou várias estratégias. Existia a expectativa de muita experiência de marca, mas os patrocinadores decidiram concentrar em ações menos arriscadas como promoção e publicidade. Foi menos experiência e mais visibilidade”, analisa Coelho.

No entanto, essa fórmula parece estar longe da ideal quando se fala de Jogos Olímpicos e até mesmo das expectativas do público em torno da competição. “A Olimpíada demanda um amadurecimento muito grande. É um evento clean brand. Não é tratado como a Copa, que ainda é baseada em exposição de mídia, algo ultrapassado em marketing esportivo. Exige muito de marketing de guerrilha, esforço de ativação e abre espaço para concorrentes ativarem de forma criativa”, opina o diretor da Momentun.

Os desafios dos patrocinadores — e também dos demais anunciantes — são tão grandes quanto os números dos Jogos Olímpicos Rio 2016: audiência global de três bilhões de pessoas com as cerimônias de abertura e encerramento, 7,5 milhões de ingressos para 42 esportes disputados em 32 arenas de competições localizadas em quatro regiões da cidade (Barra da Tijuca, Deodoro, Ipanema e Maracanã). Além de compensar a ausência de seus logos nas arenas esportivas, as marcas deverão driblar o ambiente político, econômico e social conturbado do País e a falta de atenção do grande público brasileiro para modalidades fora do futebol.

Mesmo sendo disputado por seleções sub-23, o torneio olímpico de futebol é a competição que atrai a maior atenção dos torcedores no País. Segundo o estudo Ipsos Consumo Olímpico, 56% dos entrevistados que acompanharão os Jogos têm interesse no futebol. Na sequência aparecem ginástica olímpica (55%), atletismo (36%) e basquete (26%). Já a maior motivação para acompanhar a disputa é a participação de atletas brasileiros (68%), seguida do gosto pelo esporte (42%). A presença de um ídolo é determinante para a exposição da modalidade.

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Presente em Jogos Olímpicos desde 1938, a Coca-Cola é a marca mais lembrada pelo público brasileiro, segundo o estudo Ipsos Consumo Olímpico | Crédito: Gideon Mendel / In Pictures / Corbis / Latinstock

“A Olimpíada não desperta a paixão da Copa e o mesmo espaço de mídia. É praticamente tudo na mesma cidade (Belo Horizonte, Salvador, São Paulo e Manaus também receberão jogos do torneio de futebol). Não é uma grande oportunidade nacional de ativação, a não ser para os patrocinadores”, diz Cocco, destacando que a atividade das federações não tem contribuído para o marketing esportivo. “Elas deveriam deixar a modalidade em evolução técnica e criar ídolos. Mas é uma mesmice, não valorizam os produtos. No Brasil vivesse de ídolos e não se massifica o esporte”, ressalta.

A preferência nacional pelo futebol é mais uma oportunidade do que um desafio na opinião de Azar, que na Octagon trabalha em projetos para Skol, Cisco e Estácio para a Rio 2016. “Num evento de um único esporte, como a Copa, torna-se confuso e caro obter espaço para sua voz. Um evento multiesportivo permite que as marcas ampliem o foco e abracem certos esportes onde a barreira de entrada pode ser menor. Isso torna o processo mais experiencial e permite que as marcas apresentem algo novo para o consumidor. As federações podem usar os Jogos como uma plataforma para promover seu esporte. Os patrocinadores corporativos desempenham um papel importante nessa equação. O rúgbi é um exemplo muito bom no Brasil”, cita o executivo.

Pegando carona na volta da modalidade ao programa olímpico justamente na Olimpíada do Rio, a Confederação Brasileira de Rugby (CBRU) iniciou um projeto de profissionalização da gestão e de comunicação e marketing que, acompanhado do desempenho das seleções em campo, atraiu mídia, público e patrocinadores para o esporte. A confederação tem o patrocínio de 15 empresas, como Bradesco, Topper, Heineken, Outback, JAC Motors, Dove e Kibon, além de nove fornecedores e apoiadores. Os valores obviamente não se comparam com os da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), mas em número de parceiros o rúgbi ganha: 24 a 16. A seleção canarinho tem 13 patrocinadores — como Nike, Itaú, Vivo e Guaraná Antarctica, Sadia e Chevrolet — e três parceiros.

Pódio à vista

Para Coelho, o fato de não existir a presença de marcas na arena deixa o campo aberto e embaralha patrocinadores e não patrocinadores. “O mercado de marcas esportivas é muito específico, mas com telefonia, banco, automóveis o jogo fica mais interessante. Fica aberto por não poder se associar diretamente ao evento, o que demanda um nível de inteligência e ativação muito alto. É um trabalho de longo prazo. Quem não começou, não vai alcançar os resultados. Quem já conseguirá construir relacionamentos”, projeta o executivo da Momentum, parceira de Bradesco, Microsoft, Nissan e TAM nas ações para a Olimpíada.

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Confederação de ruby tirou profeito da Olimpíada para alavancar a modalidade: são 24 parceiros Crédito: Divulgação

Com a evolução da sociedade os consumidores têm se tornado cada vez mais exigentes. No entanto, esse fato não parece influenciar negativamente a opinião da torcida brasileira em relação à presença das marcas no universo esportivo. Segundo o Dossiê dos Esportes, também da Ipsos, 64% dos entrevistados concordam que as empresas que patrocinam esportes são empresas de qualidade. Além disso, 46% dizem valorizar as marcas que patrocinam o esporte e 20% preferem comprar produtos das empresas que patrocinam seu time.

Já na briga pela atenção do público, o ranking do estudo Ipsos Consumo Olímpico mostra que não patrocinadores também podem ter vez na disputa. A lista é liderada pela Coca-Cola (patrocinadora mundial), com 32%, seguida pelo Bradesco (patrocinador oficial), com 26%. O primeiro não patrocinador é o Itaú (cotista do pacote de futebol da Globo), que aparece em terceiro com 11%, empatado com a Visa (patrocinadora mundial).

Correios e Claro (ambos patrocinadores oficiais) aparecem na sequência com 10% cada um. Banco do Brasil (tradicional parceiro do vôlei) e Caixa (patrocinadora de mais de uma dezena de clubes das séries A, B e C do Brasileirão) são os outros não patrocinadores no ranking com 9% cada um. Por fim, Embratel e Nissan, também patrocinadores oficiais, somam 8% cada.

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