B3: Investimentos e sustentabilidade em jogo
Cesar Sanches, superintendente de sustentabilidade da B3, analisa os impactos de postos de trabalho ESG e avanço da agenda no mercado
B3: Investimentos e sustentabilidade em jogo
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Giovana Oréfice
5 de abril de 2023 - 6h06
Além da demanda de agentes da sociedade, a aceleração da adoção do ESG tem como fonte um requisito do mercado financeiro por práticas mais sustentáveis e empresas guiadas por propósito. No ano passado, em sua carta anual aos clientes da BlackRock, multinacional de investimentos, o CEO e chairman, Larry Fink, afirmou que “é por meio de um capitalismo de stakeholders eficaz que o capital é alocado de maneira eficiente, as empresas obtêm lucratividade duradoura e o valor é criado e mantido em longo prazo”.
No âmbito do Brasil, Cesar Sanches, superintendente de sustentabilidade da B3, analisa os impactos de postos de trabalho ESG e imagem das corporações frente aos acionistas.
Meio & Mensagem — De que forma a criação de cargos específicos em ESG reforça o compromisso das companhias com a agenda? E qual é a sua avaliação da evolução da área?
Cesar Sanches — A criação de cargos específicos em ESG demonstra que a empresa está disposta a investir em áreas relacionadas à sustentabilidade e à responsabilidade social, indicando uma mudança de cultura organizacional para uma abordagem mais consciente e responsável em relação a todos os seus stakeholders. Além disso, permite que a companhia tenha uma estrutura formalizada para lidar com o tema, garantindo que as questões ambientais, sociais e de governança corporativa sejam tratadas de maneira estratégica e sistemática. Outro benefício é que aumenta a visibilidade e integração da agenda dentro da empresa, engajando outros funcionários e a alta liderança sobre a importância de abordagens mais sustentáveis e responsáveis. Em termos de evolução, especialmente desde 2020, tem havido um aumento significativo na criação de cargos específicos em ESG. Isso se deve, em parte, à pressão dos consumidores por práticas mais sustentáveis, mas também ao aumento da conscientização dos investidores sobre a relevância da agenda, passando a enxergar ESG como negócio. Boas práticas ambientais, sociais e de governança geram valor para a companhia, atraem talentos, reduzem custo de capital e riscos. Isso tudo está diretamente ligado a ganhos de performance, produtividade e de imagem por parte das empresas investidas. Muitas empresas têm criado áreas inteiras focadas em ESG, sustentabilidade e responsabilidade social. Porém, no mercado brasileiro, o grau de maturidade das companhias ainda é muito variável. Temos hoje diversas novas empresas, inclusive de pequeno porte, nascendo já com um olhar de sustentabilidade integrado ao negócio. Ao mesmo tempo, diversas grandes companhias listadas iniciaram recentemente a incorporação de aspectos ESG às metas e estratégia, e a monitorar indicadores de forma padronizada e recorrente. Até então, a atuação em relação ao tema frequentemente estava sob a responsabilidade de áreas como comunicação e relações com investidores. Outras companhias, ainda, mal iniciaram a jornada, e há grande potencial de desenvolvimento dessa agenda no futuro próximo.
M&M — A maior participação de profissionais especializados em ações de sustentabilidade, social e governança garante maior credibilidade frente aos acionistas?
Sanches — Os investidores e acionistas estão cada vez mais preocupados com questões ESG, e muitos consideram esses fatores ao tomar decisões de investimento e engajamento junto às companhias investidas. Essa tendência é reflexo de evidências cada vez mais claras de que a integração de práticas sustentáveis nas operações pode ajudar a melhorar a gestão de riscos e a criar valor de longo prazo, além de ajudar a mitigar possíveis impactos negativos na reputação e na imagem da companhia. Assim, a presença de profissionais especializados em ações de sustentabilidade, social e governança na empresa pode ajudar a demonstrar um compromisso sério com essa agenda e ampliar a confiança dos investidores. Além disso, especialistas em ESG podem ajudar a empresa a desenvolver e implementar políticas e práticas mais efetivas e a garantir que as questões ESG sejam devidamente consideradas nas decisões estratégicas. Isso pode contribuir para uma melhor performance da empresa como um todo e, consequentemente, aumentar sua credibilidade aos olhos dos investidores e acionistas.
M&M — O Índice de Sustentabilidade Empresarial vem sendo um critério de peso na classificação de empresas para ações relacionadas à temática. Qual é o impacto da crescente criação de postos do tipo nas companhias que aderem ao índice?
Sanches — O Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE B3) tem como objetivos apoiar as empresas na jornada ESG e auxiliar investidores no desenvolvimento de estratégia de investimento, promovendo as melhores práticas ESG, aumento de transparência e acesso a dados. Por ser um índice de entrada ativa, demandando a mobilização das companhias participantes, que devem responder a um questionário setorizado dividido em cinco dimensões (capital humano, capital social, governança corporativa e alta gestão, modelo de negócios e inovação, meio ambiente) e até 28 temas gerais e específicos, a presença de profissionais especializados e dedicados ao tema dentro da companhia é essencial para viabilizar e coordenar todo o processo de participação adequadamente. Assim, a crescente criação de postos em ESG e sustentabilidade pode ter relação com o número recorde de companhias engajadas nas modalidades do índice: em 2022, foram 183 companhias inscritas, crescimento de 38% em relação a 2021, sendo 83 elegíveis à carteira e 100 que participaram do Simulado ISE B3. Dentre as elegíveis, 69 cumpriram todos os critérios de inclusão e compõem a carteira 2023 do ISE B3. A carteira de 2022 era composta por apenas 46 empresas, o que mostra a evolução da agenda no mercado brasileiro. Em contrapartida, o ISE B3, como iniciativa pioneira na América Latina e quarto índice de sustentabilidade criado no mundo, é também um importante instrumento de referência para apoiar os investidores na tomada de decisão de investimento considerando aspectos ESG. Dessa forma, induz as empresas a adotarem as melhores práticas de sustentabilidade, o que inclui a criação de postos de trabalho específicos para a gestão da agenda.
M&M — A criação de cargos continuará sendo uma tendência?
Sanches — A importância de contar com profissionais especializados nas temáticas de sustentabilidade e ESG para as companhias será cada vez mais notória. Segundo o Relatório de Riscos Globais 2023 do World Economic Forum, 8 dos 10 riscos de maior impacto para a humanidade nos próximos 10 anos estão diretamente relacionados a problemas ambientais, como falha na ação climática e perda de biodiversidade; sociais, como erosão da coesão social; e tecnológicos, relacionados à cibersegurança. Todos esses temas, que estão dentro dos pilares do ESG, pedem a resiliência das organizações a longo prazo, caso as companhias não disponham de estratégias sólidas de mitigação e adaptação. Assim, a demanda por cargos específicos tenderá a aumentar no mercado, não apenas devido à pressão de clientes e investidores por boas práticas, mas também para contribuir na manutenção do valor do negócio. É preciso salientar, porém, que a visão de sustentabilidade precisa estar cada vez mais integrada ao conjunto de atividades das companhias, não devendo estar restrita apenas a áreas ou profissionais específicos. Portanto, no horizonte, espera-se que a consciência sobre a importância da agenda ESG permeie todos os funcionários e seja considerada nas decisões das empresas em todos os níveis.
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