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Opinião

A arte vê antes

Como o cinema e as artes em geral antecipam e refletem mudanças na sociedade, tendências emergentes e ideias antes de serem amplamente reconhecidas


7 de agosto de 2024 - 9h04

(Crédito: Reprodução/Instagram)

[4/12] série NÓSemMIM

A arte vê antes!

Sim, a arte sintoniza antes o porvir.

Não sei se o algoritmo vai gostar do que vem a seguir, mas não dá pra agradar todo mundo.

Não é incrível que 25 anos depois, “Matrix” já pode ser visto como um documentário? Ops. Mas não é uma obra de ficção?

É sim uma obra de ficção, mas explora temas filosóficos e sociais tão relevantes e profundos que algumas pessoas têm discutido a ideia de que o filme pode ser visto, metaforicamente, como um “documentário”.

A jornada de Neo para descobrir a verdade sobre a Matrix pode ser vista como uma alegoria do despertar espiritual ou intelectual.  A escolha entre a pílula vermelha e a pílula azul tornou-se uma metáfora cultural. “Tomar a pílula vermelha” significa buscar a verdade, por mais desconfortável que seja, enquanto “tomar a pílula azul” seria permanecer na confortável ignorância. Esta dicotomia é usada em discussões sobre conformidade social versus a busca por conhecimento e verdade.

A sequência acima é uma das mais lembradas quando “Matrix” aparece nas conversas, no entanto o filme de 1999, produzido na minha tenra juventude, que me chacoalhou no assento como um simulador, traz muitos outros temas que continuam chacoalhando os debates de hoje como realidade virtual e simulação, controle e manipulação, inteligência artificial, automação e filosofia, muita filosofia.

Talvez 25 anos seja pouco tempo, então posso voltar um pouco mais; que tal 1968 com “2001: Uma Odisseia no Espaço” ou “Blade Runner”, de 1982, ou “O Show de Truman”, de 1998? De volta ao século 21; “Minority Report”, de 2002, e o tão próximo “Her”, de 2013, que é quando nos pegamos falando com a Siri, Alexa ou Google Assistant, nossas companheiras/funcionárias/confidentes do dia a dia.

O cinema e as artes em geral têm um longo histórico de antecipar e refletir mudanças na sociedade, captar tendências emergentes e ideias antes de serem amplamente reconhecidas. Por isso, muitas e muitas vezes são vistos como uma expressão precursora ou um reflexo das mudanças culturais, sociais e políticas.

Um grande viva aos artistas, pois é graças à liberdade criativa que eles exploram novos conceitos, desafiam o status quo e provocam reflexões sobre questões que ainda não foram totalmente compreendidas.

A capacidade dos artistas de ver o mundo e expressá-lo de maneiras únicas e inovadoras está intimamente ligada a duas qualidades essenciais: perspectiva empática e introspectiva. Essa combinação permite que os artistas antecipem tendências, revelem verdades ocultas e inspirem sociedades inteiras a ver além do óbvio.

Desde o princípio dos tempos, a arte tem sido um reflexo da alma humana, uma janela para o que não é dito, mas sentido profundamente.

Mas se a arte vê antes, o que será que ela está nos dizendo hoje sobre o futuro?

Talvez devêssemos começar com outra pergunta: qual é o universo das preocupações artísticas atuais? Só assim conseguiríamos decifrar as mensagens que esses artistas estão tentando nos transmitir sobre o futuro (que é logo ali).

Entendo o cinema como uma das formas de arte mais eficazes para absorver e compreender mensagens, uma ferramenta poderosa para a expressão e a reflexão sobre questões importantes da sociedade.

Sendo assim, nada melhor do que um oráculo capaz de cativar, entreter e provocar, como os filmes “Parasita”, que aborda desigualdade social, luta de poder e privacidade; “Não olhe para cima”, que trata da inação diante das mudanças climáticas; a corrupção e a violência contra povos indígenas em “Assassinos da Lua das Flores”; e, por fim, “Bacurau” nosso anti-western que traz a resistência, desigualdade e discriminação como temas principais. Indo para a TV ainda temos as séries; “I May Destroy You” e “Little Fires Everywhere”, que tratam de assuntos como consentimento, trauma e racismo.

Ao abordar temas cruciais, os artistas de hoje não apenas refletem e sentem nosso mundo contemporâneo, mas também nos oferecem visões poderosas do que está por vir. A arte vê antes, não apenas pela sua capacidade de capturar o “zeitgeist”, mas pela sua habilidade de desvendar futuros possíveis, incitando reflexões e inspirando mudanças, nos convidando a repensar nossas estruturas e valores.

…………………-pausa pra respirar-………………………………………

Dar uma trégua. Dar um tempo. Ficar quieta. Abrir espaço no dia, no texto, no caos. Vale?

E foi exatamente o que fiz nesse tempo fora. Me desculpem se criei alguma expectativa ou causei algum ressentimento, mas precisei. Respirei e respirei.

E entre as inspirações e expirações me aprofundei na premissa de que “a arte vê antes” e de que o cinema — uma das nossas mais importantes expressões artísticas — apresenta a mitologia do contemporâneo.

Inevitavelmente o próximo NÓSemMIM vai para além da ficção científica. Vamos vasculhar a ficção e a arte de reverenciar as dores e cicatrizes do nosso tempo. Quem sabe, decifrando um futuro de valor raro.

 

……

 

Como não é impune estar no W2W, segue a promessa de trazer ao final de cada artigo desta série highlights de algumas das aladas* que me (nos) inspiram.

Daniela Schmitz

Talentosa profissional de negócios de comunicação e marketing, formada em historia da arte, que entende profundamente muito do refletimos aqui neste artigo: a arte como expressão do espirito do tempo. Pois sabe estudar e ler com profundidade as manifestações da arte, seus ciclos (e nuances) e como podemos ganhar mais capacidade de nos comunicar  – e isso com sinapses recheadas de alma.

Denise Jardim

Incrível advogada especialmente nas áreas de direito autoral e entretenimento, com significantes atuações na Comissão de Direito do Entretenimento da OAB e como Membro da Associação Brasileira de Direito Autoral (ABDA). Traz cuidado, proteção e clareza para autores e empresas.

Barbara Sturm

Super curadora e diretora de conteúdo, tem uma busca constante na comunicação de um filme com a sociedade e, principalmente, o de entender seu posicionamento, suas formas e maneiras de contato com o público. Refinou seu olhar com estratégias criativas e afetivas. Este mergulho tão profundo no território do cinema está fazendo nascer nela também uma cineasta (aguardem).

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Próximo:
[5/12] série NÓSemMIM
O que a ficção tem revelado sobre nós?
Mitologia, dores e amores.

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Obs: agradecimentos à parceira de longa data, Ana Sardinha, por organizar as sinapses que me habitam, e refinar as ideias deste texto.

 

*Alados são os talentosos profissionais que fazem parte da ASAS.

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