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A carreira internacional de lideranças femininas na criação

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A carreira internacional de lideranças femininas na criação

O número de juradas de Cannes cresceu e parte trabalha em outros países; conheça a trajetória internacional de liderança de algumas dessas profissionais


6 de novembro de 2024 - 9h51

Muitas vezes, a busca por novos horizontes profissionais não tem como documento o fim de um contrato na carteira de trabalho, e sim o passaporte. Angela Bassichetti, head of creative shop APAC na Meta em Singapura; e Bianca Guimarães, partner and executive creative director da Mischief, e Luciana Cani, diretora criativa executiva da AKQA, ambas nos Estados Unidos, são exemplos de profissionais que foram buscar em outros países novas fronteiras profissionais.

As três fizeram parte do grupo de 12 brasileiros selecionados para o júri deste ano do Festival Internacional de Criatividade, ou o Cannes Lions, que não trabalham no País. Os caminhos que as levaram ao exterior são tão diversos quanto suas próprias trajetórias. Em comum, porém, são motivos frequentes nas falas de profissionais em transição de carreira mais reconhecimento, equilíbrio e ambiente de trabalho mais saudável.

Com Bianca, tudo aconteceu quase por acaso. Há 15 anos, ainda no início de carreira, trabalhava em agência do setor imobiliário e já estava de olho em outras oportunidades que pudessem dar vazão ao seu desejo por desafios. “Mas, poderia ser no Brasil”, relembra a executiva que, por ser caseira e apegada à família, não acalentava a vontade de morar fora. Uma prima foi estudar em Nova York e a ideia de ter companhia e um lugar para ficar a motivou a carimbar o passaporte para, inicialmente, estudar também. Não chegou nem a começar o curso e nunca mais voltou. “Consegui uma espécie de estágio de três meses na J. Walter Thompson em Nova York. Pude me provar e fui contratada”, recorda.

Bianca Guimarães, da Mischief (Estados Unidos): “Consegui uma espécie de estágio, pude me provar e fui contratada” (Crédito: Arquivo pessoal)

Como o começo da carreira internacional coincidiu com o início da própria trajetória em agências, os desafios eram mais parecidos com os de outros profissionais que emigram. “Eram coisas básicas como a língua, o jeito como as pessoas pensavam, como se preparavam para uma reunião. Era me acostumar com outra cultura”, afirma. Àquela época, o mercado norte-americano já era mais diversificado do que o brasileiro. Bianca, que respondia a duas diretoras de criação no primeiro emprego, relata não ter sentido discriminação. E, por estar em uma cidade cosmopolita, ser brasileira também não foi um problema para sua ascensão, que contou com passagens por outras grandes agências. Há quatro anos, se uniu aos sócios para fundar a Mischief, na qual a maior parte dos líderes têm filhos. Mãe de duas crianças, afirma que há um alinhamento em relação ao horário de trabalho e o tempo com a família.

A experiência se opõe à de Angela, da Meta. Há cinco anos em Singapura, sua carreira começou há 20 anos. “Eram bonitos os mandos e desmandos, o diretor de criação humilhar publicamente e dar feedbacks nada construtivos em tom irônico. Uma liderança era considerada forte se fosse agressiva, não construtiva e pouco acolhedora”, relembra. À medida que a carreira avançava, o ambiente se impunha. Angela, que sempre desejou ser diretora de criação, não se identificava com a cultura. “Cheguei a achar que não servia para ser diretora de criação porque não tinha essa violência dentro de mim e que nunca seria recompensada.” Por isso, o grande motivador para sair do País foi a busca por uma “cultura menos tóxica”. Pesou, ainda, a falta de clareza para as promoções e as políticas de bônus. “Queria uma organização onde me sentisse feliz com a maneira como sou tratada pelos superiores e como poderia tratar as pessoas do meu time”, afirma.

Angela Bassichetti, da Meta (Singapura): o grande motivador para sair do País foi a busca por uma “cultura menos tóxica” (Crédito: Arquivo pessoal)

Conciliar a rotina em agências com a maternidade também motivou a mudança. “Eu estava tentando ser diretora de criação quando tive minha filha. Meu chefe não entendia que, grávida de nove meses, eu não podia trabalhar até às 10 da noite. Ou que era importante, no Dia das Mães, eu estar com a minha filha, e não em uma concorrência”, desabafa. “Aqui fora, consegui balancear. Minha filha já tinha 14 anos, mas consegui ser mais presente na vida dela pela primeira vez.”

O acaso levou Bianca aos Estados Unidos, a busca por equilíbrio levou Angela para Singapura e o sonho de desbravar o mundo levou Luciana, que vive em Portland (EUA), para quatro diferentes continentes em 17 dos seus 23 anos de carreira. “Sempre tive grande vontade de viver a experiência de morar em outro País. Como não tive a oportunidade de estudar fora, foi o trabalho que abriu as portas para que esse sonho se realizasse”, explica.

O primeiro voo foi rumo a Lisboa, em 2007. “Quando comecei, lembro de ouvir que certas agências não contratavam mulheres na criação. Não saí do Brasil por isso, mas trabalhar em outro mercado me abriu os olhos. Em Portugal, as grandes agências já tinham mulheres na liderança. Não muitas, mas um número mais significativo do que no Brasil”, compara. Foi lá, depois de quatro anos, que veio o primeiro cargo de liderança.

Luciana Cani, da AKQA (EUA): “Aprendi a me apropriar da diferença e isso foi um ponto de virada na minha trajetória” (Crédito: Arquivo pessoal)

No entanto, ao deixar Lisboa rumo a Chicago foi mais complicado. “Liderar em um mercado completamente novo foi desafiador. A falta de contexto cultural, a necessidade de pensar em outra língua e entender os processos e nuances exigiram muita adaptação”, lembra Luciana. Mas seu estilo de liderança empática foi fundamental para navegar no novo ambiente. “Entendi que podia ser vulnerável, que não precisava ter todas as respostas e que, em colaboração, poderíamos construir uma relação de ajuda e respeito mútuo”, afirma.

Luciana diz que contou com o apoio de muitos homens ao longo da carreira, mas também enfrentou a falta de credibilidade por ser mulher e, principalmente, estrangeira. Ser mulher em um ambiente majoritariamente masculino ou ser estrangeira em contexto local, proporciona perspectiva única: um olhar que foge do padrão, que questiona as estruturas e traz soluções inovadoras. “Aprendi a me apropriar dessa diferença e isso foi um ponto de virada na minha trajetória”, acredita.

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