A jornada de liderança global de Débora Mattos na Coca-Cola
A gerente geral para Chile, Bolívia e Paraguai fala sobre os desafios e aprendizados da carreira internacional
A jornada de liderança global de Débora Mattos na Coca-Cola
BuscarA gerente geral para Chile, Bolívia e Paraguai fala sobre os desafios e aprendizados da carreira internacional
Lidia Capitani
7 de janeiro de 2025 - 6h29
Débora Mattos tem uma sólida trajetória de 20 anos na indústria de bebidas, marcada por experiências diversificadas e posições de liderança em grandes empresas do setor. Economista formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), começou a carreira na Ambev, onde passou por áreas como finanças, logística e planejamento estratégico. Sua busca por conhecimento a levou a um intercâmbio na Universidade Técnica de Lisboa e, posteriormente, a um mestrado na Duke University, nos Estados Unidos, com foco em difusão de tecnologias e economia institucionalista.
Após retornar ao Brasil, ingressou na Diageo, onde liderou a criação de uma área inovadora de avaliação de investimentos, aproximando-se do consumidor e das estratégias de marketing. Em seguida, foi para a Coca-Cola, ocupando posições de destaque em finanças e franquias. Lá, passou pelos desafios da pandemia, que impactou severamente o setor. Atualmente, Débora é gerente geral da empresa para Chile, Bolívia e Paraguai, posição que a desafia diariamente a sair da zona de conforto e aprender com os contextos regionais.
Nesta entrevista, Debora Mattos fala sobre os desafios de se aventurar numa carreira internacional e sobre a coragem necessária para assumir a responsabilidade de ser uma liderança. Além disso, ela também comenta sobre seu estilo de gestão e a importância da confiança e do networking para o desenvolvimento de carreira de mulheres.
Sei que tenho uma responsabilidade. Sou uma mulher negra em uma grande companhia, liderando uma agenda importante fora do Brasil. Isso me faz sentir uma obrigação de estar aqui, para abrir caminho e permitir que outras pessoas, de diferentes origens e experiências, cheguem também. Envolve diversidade em todos os sentidos, não apenas de gênero ou raça. Acredito que tenho a responsabilidade de ser autêntica e de ser quem eu sou, para que as pessoas ao meu redor se sintam à vontade para fazer o mesmo.
Sempre falo sobre coragem. Acredito que, especialmente após a Brené Brown, ficou claro que coragem não é a ausência de medo, mas agir apesar dele. Nas posições que ocupei, muitas vezes senti medo. Perguntava a mim mesma: “será que vou conseguir? Vai dar certo?”. Mas o que me dá coragem é justamente entender a responsabilidade que carrego e o caminho que estou abrindo para outras mulheres.
O maior desafio para qualquer pessoa é sair do seu próprio país. Para mim, isso foi gigantesco. Cada lugar tem suas idiossincrasias, e quando você lidera uma marca global, com o desafio de localizar e adaptar a agenda local, é fundamental entender e se conectar com as diferentes culturas. Isso é bem diferente do que você aprendeu onde nasceu e cresceu. Sair do meu país, do meu ambiente de conforto, onde eu sabia como as coisas funcionavam, e entender como se conectar e usar as ferramentas certas em cada país foi, sem dúvida, o maior desafio da minha carreira até agora.
E esse desafio vai além do aspecto de negócios. Para fazer a agenda de negócios funcionar, você precisa primeiro se empatizar com o local. O que preocupa o chileno? Qual é a agenda do Chile? E da Bolívia? Como vou, como Coca-Cola, conectar e mover nossa agenda nesses países? Isso tem sido, e continua sendo, um aprendizado constante.
Tenho muito claro agora que grandes executivos com uma carreira global, como os que admiro, sempre precisaram sair da zona de conforto. É sobre desaprender o que você sabe e aprender de novo, com novas culturas e novos países. Esse processo de adaptação tem sido o meu maior desafio, e sei que continuarei sendo desafiada, já que minha carreira agora é internacional.
O grande desafio de uma empresa global é entender as necessidades locais e o que deve ser feito em cada país. Tivemos um marco importante este ano, que foi a inauguração de uma planta no Chile. Essa planta, que fabrica garrafas a partir de outras garrafas, usa resina reciclada. Foi a primeira planta de reciclagem “garrafa por garrafa”, e é muito interessante porque reflete a necessidade local, conectando com a realidade do país.
Esse projeto é um exemplo claro de como continuamos com nossa forte agenda de sustentabilidade, alinhando nossas ações às necessidades da sociedade em que operamos. A planta Reciclar é um grande exemplo de como atuamos com a agenda de sustentabilidade, tanto nos países que lidero quanto globalmente.
Sempre tive o desejo de sair do Brasil para entender como as operações funcionam em outros lugares. Quando tenho um problema para resolver, costumo dizer que sou “obsessiva”, no bom sentido, porque fico pensando constantemente até encontrar a solução. Queria me provar e me testar fora do meu ambiente confortável, sair da minha zona de segurança. Já estava planejando isso para a minha carreira, quando surgiu a oportunidade.
Também tenho ‘sponsors’, o que considero superimportante, especialmente para mulheres. É essencial construir uma rede de contatos e ter pessoas que falem por você, inclusive em salas fechadas, onde você não está presente. Esses sponsors acreditam no meu trabalho e me convidaram para essa posição, justamente porque sabiam que eu precisaria operar de uma forma diferente, reaprender a me conectar com as pessoas e entender como a agenda de negócios em outro país poderia ser muito distinta da do Brasil.
Esse movimento foi muito bem pensado e, como falei, foi um caminho de aprendizado. No início, você vem com a bagagem de experiências que tem na cabeça e vai vendo que certas coisas não funcionam da mesma maneira. Então, você precisa se adaptar, aprender novas formas de fazer as coisas.
Esse foi o meu maior desafio profissional, mas o pessoal também foi significativo. Estar sozinha, longe de casa, sem conhecer ninguém, foi um grande desafio. Foi lá que conheci meu marido e meus dois cachorrinhos, e tudo isso fez parte da minha adaptação.
Sou uma pessoa introvertida. A introversão, para mim, é sobre como você recarrega suas energias. O que me dá energia é estar com minha família, então no final de semana, aproveito para passear com meu marido e meus cachorrinhos. Claro, foi super desafiador, mas não me arrependo de nada. Teria feito tudo igual, porque o que aprendi nesses três anos fora do Brasil é mais do que um MBA. Foi uma experiência incrível.
Uma reflexão para mulheres que possam ler isso: a coragem, como mencionei antes, é fundamental. Muitas vezes, não acreditamos em nós mesmas, mas é importante lembrar que, à medida que crescemos, nossa posição se torna mais séria, e é nesse momento que precisamos nos fortalecer internamente. Mesmo quando as pessoas dizem que não estamos fazendo a coisa certa, é essencial ter a confiança de que estamos no caminho correto.
O tema da coragem e da confiança em nosso papel é crucial. Como disse, não sou uma gerente geral por acaso, estou trilhando um caminho com muito apoio e, ao mesmo tempo, com desafios internos. É necessário ter confiança no que você está fazendo e entender o que te move. Para mim, isso é abrir caminho para que outras pessoas também cheguem lá.
Além disso, o network é essencial. Muitas mulheres têm dificuldade de construir essa rede de contatos por receio de como serão interpretadas. Mas é importante entender que, em algum momento da nossa jornada, sempre há uma pessoa que não pertence ao nosso grupo, mas que acreditou em nós e nos trouxe até onde estamos. Por isso, é fundamental ser intencional na nossa carreira, ter clareza sobre o que queremos e fazer as conexões certas, sempre comunicando nossos objetivos. Quando as oportunidades surgirem, as pessoas lembrarão de você e do que você expressou.
Então, para mulheres e aliados que possam estar lendo isso, minha mensagem é que devemos ser líderes da nossa própria carreira. Isso é algo que precisamos fazer de maneira intencional e sem medo de mostrar o que realmente queremos.
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