24 de março de 2023 - 14h47
(Crédito: Adria Vidal/Shutterstock)
Ao longo das últimas semanas, durante este mês da Mulher, fui impactada por centenas de conteúdos que tratavam da nossa longa e desafiante jornada em busca da equidade de gênero e todas as suas interseccionalidades.
A medida com que consumia atentamente a artigos, entrevistas, vídeos, eventos, percebia algo diferente. Tinha a sensação de que além do volume ser muito maior do que anos anteriores, o conteúdo me tocava, provocava e incomodava mais.
Num primeiro momento me ocorreu que a minha percepção poderia estar influenciada por mudanças no meu próprio amadurecimento e envolvimento com tema. Meus próprios hábitos e comportamentos na busca por conteúdo relacionado ao assunto tem mudado muito. Naturalmente, à medida que mais me aprofundo, eu amplio e qualifico a minha rede de autores, influenciadores e produtores de conteúdo que sigo. O tema ganha relevância e prioridade nos meus “feeds”.
Mas ainda não era só isto. Continuei refletindo porque neste ano, especialmente, continuava me sentindo mais impactada. Quando tive um insight e conclui que, de forma mais acentuada que nos anos anteriores, neste mês eu havia me deparado com um aumento significativo de depoimentos pessoais e autorais.
Foram diversas mulheres relatando como conquistaram seus espaços, sentiram e ou reagiram a ambientes e situações de desigualdade, falta de respeito, micro agressões, assédio, ou outras situações desconfortáveis decorrentes do machismo estrutural.
Confesso que cada uma dessas leituras me trazia muita angústia. Atropelava minha falsa ilusão e o meu legítimo otimismo de que avançamos muito e que já tínhamos superado muitos desses obstáculos. Era a confirmação do quão necessário é o assunto continuar em pauta, e com grande intensidade. Não podemos sair do estado de alerta permanente nesta longa jornada.
Contudo, por outro lado, começava a sentir um pequeno alívio, de que estamos conseguindo falar e compartilhar, mesmo com dor, nossos desafios muitas vezes velados e como lidamos e superamos muitas destas situações. Ter vontade e coragem de externalizar dores e conquistas nos mostra um sinal de que, aos poucos, sentimos mais confiança e mais acolhimento para nossa exposição. E de maneira mais consciente e amadurecida, entendemos que esse é um dos pilares importantes para a transformação.
Assim, quando recebo menos felicitações pelo “nosso dia” e leio mais textos de mulheres vocalizando as suas experiências em relação a situações de desconforto à desigualdade, sinto que de fato começamos a entender o que é celebrar o dia 8 de Março.
Essa reflexão aconteceu exatamente algumas semanas após ter publicado um artigo aqui nesta coluna sobre o meu processo de racionalização e entendimento do quanto é importante identificarmos em nossas experiências o tamanho do desafio. O que sentimos e vivemos não é definitivamente uma simples coincidência, mas faz parte de algo sistêmico e estrutural.
Ao viver a experiência mais uma vez, na prática, e agora também de um lugar de escuta, confirmo o meu sentimento do quanto precisamos contar, ouvir, acolher e debater. Se não somos capazes de externar os nossos incômodos e conhecer o das outras, normalizamos as situações no dia a dia, e nos enganamos achando que são apenas coincidências. Ouvir e acolher, certamente nos prepara para um debate plural, que coletivamente nos permite buscar soluções.