Alessandra Poggi explica o fenômeno de Garota do Momento
Autora da atual novela das seis fala sobre como o passado e o presente se conectam na trama e como a história conquistou a geração Z
Alessandra Poggi explica o fenômeno de Garota do Momento
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Lidia Capitani
9 de abril de 2025 - 9h19
Alessandra Poggi, autora e roteirista da novela “Garota do Momento” (Crédito: Globo/Léo Rosário)
Alessandra Poggi é a autora e roteirista da novela Garota do Momento, da TV Globo, no ar desde novembro de 2024, na faixa das 18h. Sob direção artística de Natalia Grimberg, a trama se passa na década de 1950 e têm feito muito sucesso, sendo considerada a novela das 18h mais comentada da década, de acordo com dados da Kantar Ibope e da BrandWatch.
A autora é formada em jornalismo pela UFRJ, mas sempre soube que gostava mais de escrever histórias do que notícias. Logo após a graduação, Alessandra se inscreveu e foi selecionada para a Oficina de Autores da Globo, um curso para aprender a escrever novelas. “Nunca tinha me imaginado escritora de novela – embora minha mãe diga que, quando criança, eu dizia que queria ser.” Apesar de não ter sido contratada ao final do curso, o desejo por ser uma autora da dramaturgia ficou na sua cabeça, e seguiu fazendo cursos na área enquanto trabalhava como assessora de imprensa.
A segunda chance veio em 2000, quando a Globo lançou uma oficina de formação de autores de humor, e ela resolveu tentar. Desta vez, foi contratada. Assim, começou na emissora como colaboradora de programas infantis, como Gente Inocente, apresentado por Márcio Garcia, e Mundo da Imaginação, com a Xuxa. Após alguns anos, foi convidada a colaborar em Malhação, onde permaneceu por sete anos, dando seu pontapé inicial na dramaturgia.
Trabalhou por alguns anos ao lado de Miguel Falabella na novela Aquele Beijo (2011) e na série Pé na Cova (2013). Nesse meio tempo, desenvolveu a sinopse de sua primeira novela, Os Dias Eram Assim, ao lado de Ângela Chaves, e que estreou em 2017. Finalmente, sua primeira novela solo, Além da Ilusão, que foi ao ar em 2022. No ano passado, lançou Garota do Momento, que acabou de ser esticada com mais 18 capítulos, finalizando em junho de 2025.
Nesta entrevista ao Women to Watch, Alessandra Poggi reflete sobre os elementos que compõem o sucesso da novela Garota do Momento, como a nostalgia, os temas atuais e a conexão com os jovens. Além disso, a autora também fala sobre como a novela aborda temas como machismo, homofobia e racismo.
Alessandra Poggi: Gosto de escrever sobre mulheres. Claro que a gente tem um público masculino que assiste, mas eu, como mulher, gosto de escrever para elas. Gosto de falar sobre as relações humanas, românticas e femininas. Nas três novelas em que fui titular, todas foram de época. Os Dias Eram Assim se passa nos anos 1970 e 1980. Depois fui pros anos 1930 e 1940, e agora estou nos 1950 e 1960. E o que eu gosto de fazer mesmo é pesquisar muito sobre como as mulheres viviam em cada período.
Teve um livro que eu usei como base: “Mulheres dos Anos Dourados”, uma tese de doutorado. Ele fala sobre o comportamento feminino a partir de matérias de jornais voltados para mulheres. Coisas como: como era para casar, para noivar, o primeiro namorado, como funcionava o desquite na época — porque nem existia divórcio —, a ideia da “rainha do lar”, do “chefe da família”. Além de abordar toda a questão do machismo da época.
Isso é muito importante porque são temas que a gente ainda vê hoje. Ainda lidamos com misoginia, machismo, violência doméstica. Então, quando a gente olha pro passado e analisa tudo que as mulheres já passaram, a gente vê o quanto já conquistamos, mas também percebe o quanto ainda falta. Tento fazer esse casamento de levantar as questões que continuam sem solução e provocar reflexão. Por isso, minhas protagonistas são sempre mulheres fortes, empoderadas, que lutam contra a opressão e a submissão.
AP: Tanto em Além da Ilusão quanto nas outras novelas, a gente focou muito no contexto histórico. Agora, nessa nova novela, estou em 1958. Então eu trago os acontecimentos marcantes daquele ano e tento inserir os personagens comentando sobre eles. Com isso, já trago o espectador para dentro daquele momento.
A gente pesquisa as músicas que tocavam na época, os livros que eram lidos, os filmes em cartaz e coloco os personagens falando sobre aquilo, assistindo, comentando. Por exemplo, agora, a gente trouxe o rock and roll, que é uma coisa que já ficou lá atrás, mas que, quando as pessoas veem os personagens dançando, bate uma nostalgia.
Nessa novela, também estou trazendo personagens históricos que realmente foram importantes naquele período. A gente trouxe a Alaíde Costa (cantora brasileira), por exemplo — e ela mesma veio assistir a homenagem. Teve uma cena com a personagem Alaíde jovem cantando, enquanto a cantora real estava na plateia assistindo. Foi muito emocionante. E tem também a Copa do Mundo. Tem uma geração inteira, muita gente jovem hoje, que nunca viu o Brasil ganhar uma Copa. E é muito bonito ver todo mundo se abraçando, se emocionando. Dá vontade de ter vivido aquela época. Acho que isso conecta muito o espectador com a história.
Essa conexão entre passado e presente vem também pelos temas que a gente levanta. Falamos de preconceito, inclusive contra homossexuais. Teve uma cena bem forte do Nelson (personagem do ator Felipe Abib), quando ele vê o filho com o namorado. Ele é um homem muito machista, e ali ele fica desesperado. E esse discurso, infelizmente, ainda é muito presente hoje em dia. Tem também a questão do preconceito racial, que a gente trabalha muito com a nossa protagonista. Ela sofre várias injustiças, mas não abaixa a cabeça. Ela vai pra luta, fala a verdade, enfrenta. Acho que essa é a missão: provocar reflexão.
AP: A gente tem muitos personagens jovens na novela. Acho que mais de dez, dá quase um terço do elenco. E, com isso, a gente consegue falar sobre as descobertas amorosas, como foi, por exemplo, a primeira vez da Celeste (personagem de Debora Ozório) com o Edu (interpretado por Caio Manhente). Isso se conecta com o público porque o jovem, em qualquer época, está aprendendo o que é a vida. Ele está começando a entender o que é se apaixonar. Esses dilemas não mudam com o tempo.
Então, quando a gente traz essas histórias mais voltadas para os jovens, a gente atrai esse público, que eu sinto que está um pouco carente de algo no estilo de Malhação. Como eu trabalhei muitos anos em Malhação — foram sete anos —, acho que tenho uma mão boa pra contar histórias para esse público, mesmo numa novela de época. São tramas que ainda conversam com as questões dos adolescentes e jovens de hoje.
AP: Acho que vem de todos esses ingredientes. Temos atores muito jovens e também nomes consagrados, como a Lília Cabral, a Carol Castro, o Fábio Assunção, a dona Bete Mendes. Mas tem essa mistura: atores experientes com jovens que estão começando agora. Alguns já são bem conhecidos, como a Maísa, que está no elenco e está muito bem. A gente tem também a Klara Castanho, a Duda Santos — que já tem uns cinco anos de carreira e é uma estrela —, e o Pedro Novaes, que vem renovando esse elenco. Então acho que é esse casamento de coisas que deram certo.
A direção também está muito afinada com o texto. A Natalia Grimberg (diretora artística) tem uma visão incrível, ela lê e entende exatamente o que eu quis dizer quando escrevi. E minha equipe toda também — cenário, figurino, produção de arte — tudo está muito alinhado. Acho que o sucesso é isso: todo mundo junto e um conjunto de fatores que combinaram e deram certo.
AP: As torcidas são bem animadas, digamos assim. E a gente está num momento da história em que a personagem precisa cair pra depois subir, né? É uma curva dramatúrgica: ela cai, os vilões começam a se dar bem, e aí o público fica nervoso. Eu estou super segura do que estou fazendo, mas incomoda um pouco ficar lendo tanta crítica. Por isso, estou parando de olhar um pouco. Mas o que eu acho muito legal é que estão comentando bastante. A novela foi considerada a mais comentada da década (dados do Kantar Ibope e da BrandWatch), com um crescimento bem grande no Globoplay, comparado a outras do mesmo horário.
Tem uma galera que chega pelo TikTok, outros assistem pelo YouTube. As pessoas vêm de várias formas. E acho que isso tudo faz parte do sucesso hoje em dia. Não é só audiência de TV ligada — o sucesso vem de um conjunto de fatores. E um deles, com certeza, são as redes sociais.
AP: O que eles queriam mesmo era que a novela já tivesse acabado, porque querem ver todo mundo junto logo, tudo dando certo, sem ninguém sofrer. Acho que essa é a grande questão: eles não aguentam ver os personagens sofrendo. Da minha parte, tenho uma preocupação de que a história esteja sempre acontecendo. Isso vem também do ritmo das séries, que começaram a dominar com o boom da Netflix e, depois, dos outros streamings. Então, nós, autores, passamos a ter essa preocupação de manter o ritmo, com muitos acontecimentos e ganchos fortes no final dos capítulos, para prender a atenção.
Vejo isso como mais trabalhoso, mas também como um desafio maior como autora. Às vezes, uma cena só da pessoa sentada tomando café, comentando o tempo, passando manteiga, aquela coisa bem Manoel Carlos, não sei se hoje em dia funciona, porque as pessoas não têm paciência. Mas tenho essa preocupação de ter coisas acontecendo sempre.
AP: Mudou principalmente no ritmo. Mas, ao mesmo tempo, é complicado cravar o que vai dar certo e o que não vai. Pantanal, por exemplo, é uma história de 1990 que fez o maior sucesso agora com o remake. E era uma história com um ritmo bem mais lento, e o povo amou. Então, é difícil dizer: “isso funciona, isso não funciona”. Mudou, sim, mas talvez o jeito antigo ainda funcione muito bem. Acho que o que as pessoas querem mesmo é ver uma boa história sendo contada, se emocionar, torcer por casais e pelos personagens. O segredo é esse: gerar torcida e emocionar.
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