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Opinião

Anestesia

Como nos mantermos na superfície, na perspectiva de paisagens coloridas que nos fazem visitar memórias ancestrais e ficarmos conectados com emoções valiosas, tesouros da alma?


21 de dezembro de 2022 - 10h59

(Crédito: Melanie Kreutz/Unsplash)

Anestesia. Tomamos doses cavalares todos os dias. Todos os tipos dela, vai uma chuva de distração aqui, muito de ansiedade ali, uns quilos de dispersão para compor a fórmula. Difícil não falar de forma superlativa e com muito exagero daquilo que grita dentro de nós. Usando a anestesia como uma droga, conseguimos facilmente nos desconectar dos sentimentos e nos conectamos com a apatia.

Parece um reflexo automático mergulhar na melancolia quando as emoções se escondem.

Muito mais complexo é nos mantermos em rios que nos permitem ver as paisagens das emoções de primeira ordem, o amor, a compaixão, a alegria, o contentamento, o prazer. A anestesia parece ter um comando telepático do leme do barco e nos direciona para paisagens cinzas, pensamentos vazios, a tal ausência de sentimentos, emoções e entusiasmo, apatia.

E, dentre os elementos que compõem a tal anestesia, dois me chamam muito a atenção: a distração e a ansiedade. E olha, que dupla, que dupla! Juntas elas nos desconectam de qualquer coisa, pessoa, sentimento ou saudade.

Nossa distração em pó, em forma de chip, está a um dedo de distância. Pronto. Boom. Já mergulhamos no portal que leva para o mar sem fim de nada. É imediato, basta um segundo de ansiedade, um segundo de tédio, e lá vamos nós mais uma vez mergulhar no mar infinito de distração infinita. E, o pior, a cada micro tentativa de algum assunto nos conectar, lá vem o tubarão da ansiedade te rondar com direito a trilha sonora em ondas mentais e letais. Pronto, estamos presos na armadilha mais bem feita de todos os tempos.

Saímos do barco para a água, nadando, mergulhando, nos perdendo muito rapidamente. Em um segundo estamos lá observando as paisagens de primeira ordem, no outro as paisagens cinzas, e quando menos esperamos estamos em paisagens abissais, nas profundezas escuras do nada.

E como nos mantermos na superfície, na perspectiva de paisagens coloridas que nos fazem visitar memórias ancestrais e ficarmos conectados com emoções valiosas, tesouros da alma?

Uma palavra: propósito. Não à toa, os gurus de gestão, que nada mais são do que gente perdida pelas mesmas águas, cunharam a expressão “mostre-me o propósito”, em substituição ao famoso e por muito tempo em cartaz “mostre-me o dinheiro”.

Se formos colocar as duas expressões na régua do tempo, veremos um mundo pós Grande Depressão de 1929, em que se acreditava que só a produção incessante poderia gerar valor e, portanto, dinheiro. Passado o susto, percebemos que a grande depressão é gastar toda nossa energia apenas com um objetivo. Sem um “para quê”, que é muito mais importante do que o “porquê”, as coisas perdem o sentido. E somo a isso um outro questionamento que com o tempo ficou muito importante, o “com quem”.

Meu propósito nesta coluna é me conectar com mulheres e de alguma forma ajudar a empoderá-las. Para elas acreditarem, para nós acreditarmos, que podemos qualquer coisa. E podemos.

Por várias vezes eu me perco nesse e em outros propósitos, mas eu tento, para que essa volta perdida não seja em vão, e busco de alguma forma que os momentos de vagar pelo menos tragam alguma reflexão e força.

Quem sabe percorrer mares distantes com um pouco de atenção, me faça encontrar outras marinheiras — ou marinheiros perdidos, por que não? –, que ligaram o farol da observação, para juntas chegarmos a algum lugar.

São as visitas surpresas que nos fazemos — sejam nas memórias, nos cafés, nos almoços de domingo, nos olhares cruzados, nos risos sincronizados, nos choros desconcertados ou nas cápsulas de anestesia deixadas no escaninho — que nos encontramos para nos reconhecermos e, em algum lugar da contaminação psíquica, nos lembremos do nosso propósito.

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