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Opinião

Assédio no Carnaval: caminhos para uma folia mais segura

Quando uma mulher decide participar da folia, ela infelizmente não carrega apenas o desejo de se divertir


28 de fevereiro de 2025 - 14h36

(Crédito: Antônio Cruz/ABr)

Durante as festividades de Carnaval, um tema sempre permeia as discussões: o assédio ou a importunação sexual, comportamentos que afetam de maneira desproporcional as mulheres. Quando uma mulher decide participar da folia, ela carrega não apenas o desejo de se divertir, mas também o receio de ser importunada, desrespeitada, assediada ou de enfrentar outras formas de violência de gênero.

De acordo com o Relatório Anual Socioeconômico da Mulher (Raseam-2024), em 2022, no Brasil, foram registradas 67.626 ocorrências de estupro, o que equivale a dizer que uma mulher foi vítima a cada 8 minutos. Neste cenário, em que crimes contra a dignidade sexual estão presentes não só nas estatísticas, mas representam um risco cotidiano à vida de todas as mulheres, é necessário trazer, no momento do Carnaval, não apenas campanhas de conscientização contra o assédio e outras formas de violência, mas também apontar caminhos na busca por atendimento, acolhimento e proteção.

Segundo o Mapa Nacional da Violência de Gênero, plataforma criada pelo DataSenado e a organização Gênero e Número, em parceria com o Instituto Natura, que reúne os principais dados públicos e indicadores de violência contra mulheres, 60% das vítimas de algum tipo de violência no contexto doméstico e familiar não fazem denúncia no sistema de justiça. Estima-se que o número de subnotificações de violência sexual seja ainda maior. Entre as razões para isso, estão o medo de julgamento e revitimização. São sentimentos vinculados, em grande parte, aos crimes contra a dignidade sexual. Isso porque as mulheres ainda são questionadas sobre local, hora e trajes em que os atos acontecem, como se tais requisitos fossem determinantes para a ocorrência dos crimes.

Em 2024, o Instituto Patrícia Galvão divulgou dados da pesquisa do Instituto Locomotiva e da QuestionPro sobre a percepção do assédio no Carnaval, realizada em fevereiro de 2024. As entrevistas com 1.507 pessoas acima de 18 anos apontaram que 7 em cada 10 brasileiras têm medo de sofrer assédio sexual no período.

Isso demonstra que, das mulheres entrevistadas, 50% já sofreram assédio durante o Carnaval e 73% têm medo de sofrer novamente ou passar por isso pela primeira vez. E, mesmo havendo campanhas que alertam sobre assédio e outras violências de gênero, para 60% das pessoas entrevistadas, as mulheres ainda estão muito vulneráveis aos assédios no Carnaval.

É importante destacar que, no decorrer dos anos, algumas legislações foram criadas nos âmbitos municipais, estaduais e federal, com foco na conscientização, formação e no enfrentamento do assédio, importunação sexual e outras violências contra as mulheres em festas, shows, baladas e outros eventos. No contexto federal, temos a Lei 14.786/2023, conhecida como Lei do “Não é Não”, e, em São Paulo, o protocolo “Ninguém se Cala”.

Estes são esforços que criam um “compromisso social” de empresas privadas, que em sua maioria são ligadas ao contexto de entretenimento, para atuarem junto com entes públicos, e assim propiciar espaços seguros e acolhedores para que as mulheres possam se divertir em segurança.

Contudo, fica evidente que nem toda estrutura do legislativo é capaz de impedir comportamentos históricos vinculados à objetificação do corpo feminino. Ele é tido, muitas vezes, como “público” quando ocupa espaços públicos e, assim, equivocadamente lido como um corpo disponível e impedindo que as mulheres vivenciem momentos festivos em segurança.

O suporte legislativo é apenas um dos caminhos possíveis para o enfrentamento das questões vinculadas ao assédio. É importante que os espaços de eventos, sejam eles em ambientes fechados ou de rua, estejam preparados para disponibilizar áreas de acolhimento e apoio a vítimas que passem por situações como essas durante a folia e, assim, oferecer um suporte imediato e necessário.

Outro caminho passa por comportamentos que coíbam a postura assediadora. Ao presenciar uma situação de assédio, importunação sexual ou qualquer outra forma de violência, é importante buscar apoio, seja junto aos órgãos de segurança pública ou nos bares e espaços de eventos. É provável que esses locais tenham adesão aos protocolos “Não é Não” no Brasil e “Ninguém se Cala”, no caso de São Paulo.

Conhecer e buscar outros mecanismos de proteção e ter acesso às ferramentas disponibilizadas por meio de canais de atendimento também é um caminho muito importante, pois uma escuta humanizada e acolhedora é essencial. O Ligue 180, canal de atendimento à mulher do governo federal, está disponível 24h e atende a qualquer lugar do Brasil.

Para circunstâncias que envolvam violência doméstica, o Instituto Natura tem disponível para todas as mulheres da sociedade o Canal Ângela. Basta enviar uma mensagem para o número de WhatsApp (11) 94494-2415 e, assim, um diálogo com a assistente virtual é iniciado. De acordo com as respostas, a mulher será direcionada para o atendimento humano de uma profissional especialista, que fará uma escuta detalhada e realizará os encaminhamentos necessários, avaliando caso a caso.

Não há uma solução única ou respostas prontas e eficazes para enfrentar o assédio, mas enquanto sociedade é fundamental manter postura comprometida com ações que visam garantir o direito das mulheres de frequentar todos os espaços, seja durante o Carnaval ou em qualquer outro momento do ano.

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