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Como garantir felicidade e produtividade no trabalho?

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Como garantir felicidade e produtividade no trabalho?

Especialista em felicidade corporativa reflete sobre o que significa ser feliz no trabalho e como empresas podem equilibrar metas ambiciosas com um ambiente seguro


20 de março de 2025 - 11h15

Renata Rivetti, especialista em felicidade corporativa e fundadora da Reconnect Happiness At Work & Human Sustainability: “Quanto mais profissionais felizes, melhores os resultados para os negócios” (Crédito: Divulgação)

A busca por um ambiente de trabalho mais humano e equilibrado nunca foi tão discutida. Com o retorno de muitas empresas ao escritório após a pandemia, o burnout e a insatisfação profissional cresceram, afetando especialmente os brasileiros, que lideram o índice de rotatividade de funcionários em todo o mundo, com uma taxa de 56%. O levantamento é da Robert Half, com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).

Em 2023, 421 pessoas foram afastadas do trabalho no Brasil devido ao burnout, o maior número registrado nos últimos dez anos, de acordo com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Além disso, uma pesquisa da Pluxee e The Happiness Index revelou que os profissionais no País estão 9% mais insatisfeitos do que a média global. O estudo também aponta que, globalmente, homens são mais felizes e engajados no trabalho do que mulheres, que apresentam índices mais baixos em crescimento pessoal e desafios profissionais. 

Diante desse cenário, empresas de diversos setores passaram a enxergar o bem-estar dos funcionários como essencial para produtividade e sustentabilidade, e um conceito tem se consolidado cada vez mais, aparecendo em cargos e departamentos: a felicidade corporativa.  

Renata Rivetti, especialista no tema e fundadora da Reconnect Happiness At Work & Human Sustainability, lidera esse movimento, auxiliando organizações como Unilever, Nestlé e Itaú a construir ambientes que aliam alto desempenho e satisfação profissional. 

Nesta entrevista, Renata compartilha insights sobre o que realmente significa ser feliz no trabalho, o impacto das relações e da flexibilidade na motivação dos funcionários e como empresas podem equilibrar metas ambiciosas com um ambiente de segurança psicológica. Afinal, felicidade e produtividade podem – e devem – caminhar juntas. 

M&M: De acordo com as suas pesquisas, o que representa ser feliz no trabalho para os brasileiros? 

Renata Rivetti: Hoje, há um grande número de pessoas infelizes no trabalho no Brasil. Fizemos uma pesquisa em parceria com a Pin People sobre sustentabilidade humana e felicidade no trabalho e encontramos um eNPS (Employee Net Promoter Score) de bem-estar de -9. Entre os entrevistados, tivemos somente 27% promotores, 35% neutros e 36% detratores.  

Quando avaliamos o que de fato faz as pessoas felizes no trabalho, são três grandes aspectos: o trabalho da pessoa, o quanto ela gosta do que faz, se sente motivada e realizada e vê sentido nas suas atividades diárias; as relações, ou seja, o quanto ela tem relações positivas, se sente incluída, pertencente, em um ambiente de segurança psicológica, onde se sente reconhecida e valorizada; e a a qualidade de vida, quando a pessoa tem um trabalho mais integrado na sua vida e tem mais flexibilidade e autonomia.  

M&M: Programas de saúde e bem-estar já existem há um tempo no mundo corporativo. Qual é a diferença entre felicidade e bem-estar no trabalho? 

RR: A gente ainda associa o bem-estar, muitas vezes, a programas de saúde física ou mental. Então, quando pensamos em programas de bem-estar corporativo, imaginamos o incentivo a exercícios físicos, alimentação, meditação, terapias. São programas que as empresas normalmente oferecem. Mas, quando falamos em felicidade corporativa, estamos olhando para a pessoa em relação ao seu próprio trabalho, ao dia a dia profissional, e não desse momento em que, fora, ela vai buscar um equilíbrio pessoal com uma aula de yoga, por exemplo. A felicidade corporativa tem mais a ver com a pessoa em relação ao seu ambiente de trabalho. Nesse sentido, olhamos para três grandes aspectos: as relações que ela tem no trabalho; o próprio trabalho; e a flexibilidade e redução de sobrecarga. Enquanto os programas de bem-estar já são oferecidos pelas empresas, a felicidade corporativa tem mais a ver em como as pessoas se sentem em relação ao trabalho e às relações corporativas. 

M&M: Qual é a responsabilidade e o papel das empresas sobre a felicidade dos funcionários? 

RR: Certamente, a felicidade é uma responsabilidade compartilhada. É algo que precisa, sim, de autoconhecimento, autorresponsabilidade e intenção. Ninguém vai fazer por você. O papel da empresa, hoje, é não ser mais um ofensor na saúde mental das pessoas. Uma organização não vai nos fazer felizes, isso é um fato, mas não pode mais contribuir para a piora da nossa saúde mental. A companhia deve entender a responsabilidade dela nessa construção, preparar líderes para serem mais humanizados e empáticos, ter processos que reduzam a sobrecarga, e oferecer os recursos necessários para que as pessoas possam, também, se desenvolver, aprender e se sentirem realizadas no dia a dia da empresa. 

M&M: A nova ideia de felicidade corporativa parece ter a ver com um ambiente de segurança emocional e psicológica. Como as empresas podem criar essa cultura frente a tantas incertezas internas e externas dos nossos tempos? 

RR: As empresas continuarão enfrentando desafios, metas agressivas e pressão por resultados. Felicidade corporativa não significa eliminar essas dificuldades, mas, sim, redesenhar o trabalho. Isso envolve três aspectos principais. O primeiro é reduzir a sobrecarga, trazendo ferramentas para o dia a dia das pessoas que aumentem a produtividade de forma consciente. Vivemos em uma sociedade sempre ocupada, mas pouco produtiva, perdendo tempo em reuniões e retrabalho. O desafio é otimizar o tempo para melhorar a qualidade de vida. O segundo é redesenhar atividades e funções. Muitas pessoas procrastinam ou realizam tarefas sem sentido para elas. Líderes precisam ajudar seus times a identificar motivações, encontrar e desenvolver habilidades e forças individuais, e atuar além das descrições de cargo. O terceiro é fortalecer as relações. Criar um ambiente de relações positivas, segurança psicológica, onde as pessoas possam ser quem são e se sintam reconhecidas e valorizadas, é essencial. Redesenhar tempo, trabalho e relações é fundamental para combater a sobrecarga constante, ambientes tóxicos, desmotivação e falta de engajamento. 

M&M: Há uma crença, nos bastidores, de que priorizar o bem-estar dos funcionários pode entrar em conflito com a produtividade. Como conciliar um ambiente feliz e de alta performance? 

RR: Cada vez mais, temos falado o quanto a cultura de bem-estar é aliada aos resultados. Esses dois pontos não são antagonistas. Na pesquisa que fizemos, concluímos que as pessoas que se sentem mais produtivas são mais felizes no trabalho, e quem é mais feliz no trabalho é mais produtivo. Então, está na hora de as pessoas entenderem que a sustentabilidade dos negócios virá da sustentabilidade humana. Quanto mais pessoas felizes, com redução de sobrecarga, gostando do que fazem e com boas relações, melhores os resultados para os negócios. 

M&M: Programas de felicidade no trabalho podem expor aspectos da vida pessoal dos funcionários, incluindo desafios dcomo a violência doméstica. É possível ser feliz no trabalho sem estar bem na vida pessoal? Como as empresas podem definir limites entre o profissional e o pessoal e, ao mesmo tempo, apoiar colaboradores que enfrentam questões graves? 

RR: Cada vez mais, entendemos que somos seres integrais. Não dá para separar um aspecto da vida e esperar ser feliz apenas em outro. Os problemas pessoais geralmente afetam o desempenho profissional, mas, quando o ambiente de trabalho oferece apoio, segurança e proteção, ele pode se tornar um fator positivo para a saúde mental, trazendo esperança e força até mesmo para enfrentar desafios pessoais. Funcionários que estão bem, naturalmente, contribuem mais para a empresa. Por isso, as organizações precisam reconhecer que não devem ser mais um fator prejudicial à saúde mental, especialmente em um mundo onde já vamos encontrar desafios pessoais o tempo todo. Cuidar das pessoas e apoiá-las em momentos de vulnerabilidade não apenas cumpre um papel social essencial, que deveria ser o mínimo esperado, mas também resulta em melhores desempenhos e resultados. 

M&M: Pesquisas apontam que problemas de saúde mental impactam mais as mulheres no trabalho. Quais fatores devem ser levados em conta ao construir uma agenda de felicidade que atenda às necessidades específicas das mulheres? 

RR: Para a felicidade das mulheres no trabalho, teremos que acabar com alguns mitos e crenças, como, por exemplo, a de que o workaholic é quem gera resultado. A palavra-chave para a felicidade da mulher no trabalho é flexibilidade. A mulher tem uma jornada dupla, às vezes tripla, ou seja, mais horas de atividades e responsabilidade na vida. Às vezes é a pessoa que cuida dos filhos e dos pais. Então, quando falamos em futuro do trabalho, a primeira crença que temos de acabar é que produtividade tem a ver com horas trabalhadas.  

A neurociência tem demonstrado que trabalhar mais de 50 horas por semana torna as pessoas menos produtivas, porque ninguém consegue manter cognição e atenção plena por tanto tempo. Além disso, as mulheres, de modo geral, têm maior propensão a adoecer. É fundamental compreender que empresas que oferecem flexibilidade, autonomia e a possibilidade de um melhor gerenciamento da agenda pessoal podem gerar resultados superiores, tanto em termos de produtividade dessas mulheres quanto de felicidade no trabalho, criando um ciclo virtuoso. Precisamos desmistificar a ideia de que quem trabalha mais gera mais resultado. Posso passar 10 horas na frente do computador apenas procrastinando, ou trabalhar 4 horas com hiperfoco e alcançar resultados muito melhores. Então, como rompemos com esse mito, que muitas vezes beneficia apenas os homens que têm menos responsabilidades familiares? 

M&M: O que as empresas podem fazer para ter funcionários mais felizes? 

RR: A empresa pode atuar nas três frentes principais que mencionei. Primeiro, reconhecer a improdutividade causada pelo excesso de trabalho e reduzir a sobrecarga; dar mais flexibilidade, criando modelos mais flexíveis e deem mais responsabilidade para as pessoas cuidarem de suas agendas. Isso não significa perder resultados, mas sim redesenhar o trabalho para que possamos produzir melhor, e não apenas mais. 

O segundo ponto é enxergar o potencial de cada profissional e ampliar as possibilidades dentro da empresa. Isso pode envolver um modelo baseado mais em projetos e habilidades do que em descrições fixas de cargos, incentivando a presença de mais generalistas, e não apenas especialistas. As pessoas devem atuar com aquilo que gostam e sabem fazer melhor. 

Por fim, é essencial criar um ambiente seguro, fortalecer as relações e reconhecer o valor de cada colaborador. Isso passa por pautas essenciais como inclusão, diversidade e equidade, além de promover uma cultura mais humana e empática no ambiente de trabalho. 

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