Como os videogames fomentam a criatividade infantil
Os jogos vão muito além do entretenimento: com o apoio e a mentoria de pais e educadores, eles podem incentivar o desenvolvimento cognitivo das crianças
Como os videogames fomentam a criatividade infantil
BuscarOs jogos vão muito além do entretenimento: com o apoio e a mentoria de pais e educadores, eles podem incentivar o desenvolvimento cognitivo das crianças
10 de junho de 2024 - 7h23
Os primeiros videogames surgiram na década de 1950, com programas de computador simples que os desenvolvedores utilizavam para se distrair nas horas vagas. Em 1962, um grupo de estudantes e pesquisadores do Massachusetts Institute of Technology (MIT) desenvolveu o Spacewar!, uma combinação de jogo de tiro e de estratégia.
Ele rodava em um supercomputador PDP-1, que à época custava mais de US$ 120 mil nos valores daqueles tempos e era acoplado a uma TV e a dois joysticks rústicos. O primeiro console próprio para games, o Magnavox Odyssey, foi lançado em 1972. O resto é história.
Por muito tempo, esse mercado foi baseado em produtos de jogabilidade simples, com foco no entretenimento. Corriam em paralelo, com sucesso menor, os jogos educativos – o pioneiro, lançado em 1968, se chamava The Sumerian Game. Ele era conectado a um computador IBM 7090 e colocava os estudantes para administrar uma cidade antiga.
Mas, como bem sabe toda pessoa que gostava de games na infância, como eu, do ponto de vista da maioria dos pais de antigamente, os jogos tradicionais representavam apenas uma distração e uma fonte de preocupação.
Acontece que as fronteiras entre produtos para diversão e para educação foram derrubadas ao longo dos anos. Atualmente, os videogames, mesmo os mais populares, podem, sim, servir como ferramentas para estimular a criatividade e o desenvolvimento cognitivo das crianças. São muito benéficos – sem deixar de serem divertidos. A ciência vem constatando este fato com diferentes pesquisas, realizadas em vários pontos do globo.
Por exemplo, recentemente, cientistas do Karolinska Institutet, na Suécia, avaliaram o desempenho de crianças de 9 e 10 anos de idade por dois anos. Fizeram testes cognitivos em todas, no início e no fim do experimento, comparando aquelas que passavam mais tempo diante da TV, de forma passiva, em relação às adeptas de games. Resultado: o grupo que ficava mais tempo jogando melhorou o desempenho, na média, 2,5 pontos a mais do que os jovens focados principalmente nos programas televisivos.
Mas quais são os principais benefícios dos games? Em primeiro lugar, eles desenvolvem os reflexos, a coordenação motora e até mesmo a memória. O Minecraft é um caso concreto: ele incentiva a capacidade de planejamento e o desenvolvimento de projetos de construção, que aplicam diretamente noções de física e matemática.
Além disso, estimulam o pensamento crítico, a resolução de problemas e a criatividade. No caso de jogos online disputados em equipes, como o Counter Strike, eles ainda incentivam habilidades cruciais para o mercado de trabalho, como a capacidade de agir em grupo e lidar com conflitos.
São qualidades incentivadas também por outros games multiplayer, como World of Warcraft, que requer habilidades de organização e colaboração para organizar os chamados raids, atividades em grupos grandes, com dezenas de participantes, na qual os jogadores se unem para enfrentar desafios mais difíceis.
Mais ainda: muitos games são ambientados em contextos que podem ser explorados por educadores – como fez um professor que viralizou ao utilizar Assasin’s Creed em suas aulas de história. Ele não representa um caso isolado: os videogames têm sido integrados em ambientes educacionais para complementar métodos de ensino tradicionais.
Os resultados são mensuráveis e impressionantes: de acordo com uma pesquisa publicada no International Journal of Human-Computer Interaction, as escolas que usam games e aplicativos educativos reconhecem um aumento de quase 90% no desempenho escolar. Outro levantamento, este realizado em parceria da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (FIRJAN) com a Fundação Coppetec, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), aponta que o uso de jogos online para o ensino da matemática aumenta em mais de 70% o interesse de estudantes pela disciplina.
A cada dia, mais vozes se levantam em defesa dos games. É o caso de Sir Demis Hassabis, cofundador e chefe do DeepMind, uma empresa comprada pelo Google em 2014. Ele diz, com todas as letras, que os pais que “arrancam os cabelos” porque os filhos passam horas no videogame deveriam, em vez disso, encorajar o uso criativo da tecnologia.
Mas é claro que os benefícios educativos dos videogames dependem de um trabalho de mentoria dos pais e dos educadores. Orientar as escolhas dos jogos, demonstrar interesse pelas escolhas das crianças e dos adolescentes, e utilizar os games como ponto de partida para inspirar curiosidade é trabalho dos adultos, e eles podem muito bem contribuir com essa missão: reunir o útil ao agradável, o entretenimento ao educativo.
Demonstrar interesse pelas escolhas dos filhos e dos alunos já ajuda a abrir um canal de conversa. A partir dessa interação, passa a fazer muito sentido para os jovens trazer informações adicionais sobre os jogos (como fez o professor que transformou Assasin’s Creed em material didático). O passo seguinte pode ser ajudar a procurar novos jogos, que sejam tanto educativos quanto divertidos, com ganhos múltiplos para os jovens.
O melhor caminho é o diálogo, uma vez que os jogos irão nos acompanhar em todas as fases da vida e estão cada vez mais ganhando espaço em locais antes inimagináveis, como na plataforma LinkedIn. A rede social, com foco no recorte profissional das nossas vidas, anunciou que irá suportar alguns jogos com o intuito de aprofundar e reacender os relacionamentos no trabalho, além de ser uma ferramenta para iniciar conversas e quebrar o gelo entre as conexões da rede.
Por outro lado, a orientação de adultos é importante para evitar excessos. Como mãe de dois meninos que, aos 5 meses, já conhecem, mesmo que de maneira inconsciente, o mundo colorido das telas e dos jogos, considero fundamental que as tecnologias sejam usadas de maneira responsável. É importante dosar o tempo de tela para mantê-lo dentro de limites saudáveis e prevenir excessos de estímulos em adultos e crianças, mas isso é assunto para um próximo artigo. A indústria está ciente desses desafios e monitora de perto as valiosas possibilidades educativas oferecidas por seus produtos e serviços.
Uma coisa é certa: se usados de maneira saudável, com monitoramento e participação ativa de pais e educadores, os games podem trazer muitos benefícios para os jovens, inclusive no desenvolvimento de habilidades importantes para suas carreiras. Sou gamer e, agora que sou mãe, vejo ainda mais os jogos como uma oportunidade significativa para o desenvolvimento dos meus filhos.
Compartilhe
Veja também
Como as marcas podem combater o racismo na publicidade?
Agências, anunciantes e pesquisadores discutem como a indústria pode ser uma aliada na pauta antirracista, sobretudo frente ao recorte de gênero
Cida Bento é homenageada pela Mauricio de Sousa Produções
A psicóloga e ativista vira personagem dos quadrinhos no projeto Donas da Rua, da Turma da Mônica