Comportamento e comunicação: estratégias para campanhas climáticas
Ouso dizer que, se entendermos a pessoa por trás da campanha, talvez consigamos criar mensagens que de fato vão gerar transformação
Comportamento e comunicação: estratégias para campanhas climáticas
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21 de fevereiro de 2024 - 7h48
Não é de hoje que o mundo da publicidade recorre à ciência comportamental para ter insights para suas campanhas. A constante busca por inovação e impacto tem conduzido os profissionais a mergulharem ainda mais profundamente nos frameworks de análise de comportamento de consumo a fim de entender melhor quem vende e quem compra. Porque, no final do dia, sabemos que nossa relação com o consumo é emocional.
Hoje quero falar sobre uma das teorias mais exploradas pela ciência comportamental para explicar as relações humanas: a teoria dos estilos de apego, uma contribuição fundamental de Dr. John Bowlby, posteriormente expandida por Mary Ainsworth. Esta teoria, que inicialmente visava compreender os vínculos emocionais entre crianças e cuidadores, na minha perspectiva oferece insights preciosos sobre a dinâmica de equipes criativas e como isso pode se manifestar nas campanhas publicitárias, especialmente naquelas voltadas para desafios socioeconômicos e ambientais globais como as mudanças climáticas.
A classificação em estilos de apego – seguro, ansioso, evitativo e desorganizado – ilumina as abordagens individuais frente à resolução de problemas e colaboração, elementos essenciais para o sucesso de campanhas que buscam não apenas informar, mas motivar ação e mudança comportamental duradoura. Para mim, esta abordagem multidisciplinar, que engloba desde a psicologia cognitiva até a neurociência social, é um diferencial, e assim como o entendimento profundo dos mecanismos de atenção, percepção e tomada de decisão dos consumidores, permite às equipes criativas desenvolverem estratégias melhores e a integrarem essas teorias e frameworks com a criação das campanhas.
Mas Kami, e na prática, como eu observo isso nas pessoas? Aqui vão as minhas notas de como os estilos de apego se manifestam nas lideranças da indústria criativa.
Profissionais criativos com um estilo de apego seguro podem ser os pilares nas campanhas sobre mudança climática, promovendo a união e o engajamento coletivo. No geral são aqueles que de alguma maneira já estão sensibilizados e agindo pela agenda em nível pessoal. Lideram pelo exemplo, mostrando como a colaboração e a ação coordenada podem amplificar o impacto de iniciativas locais em uma escala global. Campanhas lideradas por seguros são marcadas pela confiança e pelo otimismo. Em geral, os insights desse tipo de liderança criativa são mais inspiradores, com tom de voz de esperança e positividade.
Você já deve ter encontrado alguém na agência que precisa de afirmação da qualidade do trabalho o tempo todo, e que, se você não der feedback, não elogiar, o mundo dessa pessoa acaba. Eu chamo essas pessoas de inovadores ansiosos, que utilizam sua sensibilidade e necessidade de conexão e aprovação para criar produtos de comunicação que falam diretamente ao coração das pessoas. São mestres em contar histórias que destacam os efeitos tangíveis das mudanças climáticas na vida das pessoas, transformando preocupações abstratas em questões pessoais e urgentes. Essa abordagem aumenta a conscientização, e também gera uma resposta emocional que pode ser o catalisador para a mudança de comportamento da audiência. O risco aqui é a mensagem ser unicamente focada no terror e, ao interagir com o conteúdo, o público congelar e escolher a alienação, porque as informações geram mais ansiedade.
Aqui é a turma do “sem tempo irmão!”. As pessoas que considero estrategistas evitativos tem em sua personalidade um traço marcado pela preferência por independência e soluções baseadas em dados. Trazem para as campanhas uma perspectiva focada na eficiência e na praticidade. Em geral são aquelas pessoas que entendem muito do produto, sabe? Eles desenvolvem ferramentas que permitem ao público entender e reduzir seu impacto ambiental de maneira simples e acessível. Por meio de uma abordagem pragmática, demonstram que pequenas mudanças comportamentais podem ter grandes efeitos no combate às mudanças climáticas. O risco é cair no reducionismo e afirmar que o comportamento individual vem antes das mudanças sistêmicas necessárias, aquela máxima de “botar a culpa na vitima”.
Mas existem também aquelas pessoas que pensam completamente fora da caixa. Essas eu chamo de “criativos desorganizados”. Eles se consideram a força motriz por trás das campanhas mais inovadoras e disruptivas sobre mudanças climáticas. Têm uma capacidade de pensar fora dos padrões estabelecidos, o que leva à criação de projetos que quebram barreiras, desafiam expectativas e capturam a atenção de maneira inesperada. São especialistas em criar momentos de impacto que deixam uma impressão duradoura, motivando o público a refletir e agir. Para essas pessoas, sentir e experienciar é muito importante.
Particularmente, me vejo numa mistura de evitativa com desorganizada, mas aí isso é papo para um próximo artigo.
Ouso dizer que, se entendermos a pessoa por trás da campanha, talvez consigamos criar mensagens que de fato vão gerar transformação e mudança de comportamento em quem for impactado. Ou, além: se identifico meu perfil como pessoa criadora, posso construir campanhas mais efetivas usando o máximo do meu potencial.
Por fim, a integração da teoria do apego na criação de campanhas publicitárias sobre mudanças climáticas pode ser uma estratégia que reconhece a complexidade da experiência humana e a diversidade das respostas emocionais e comportamentais, ao mesmo tempo que oferece mensagens que geram identificação.
Ao alavancar essas diferenças, podemos criar campanhas que são ao mesmo tempo informativas, inspiradoras e transformadoras. É na sinergia dessas diversas abordagens que encontramos o caminho para uma comunicação mais impactante e para a promoção de um futuro mais sustentável.
E, se por acaso você quiser saber o seu tipo de apego, tem uma série de testes que você pode fazer e também conversar com psicoterapeutas para te guiar nesse processo.
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