As lições de empreendedoras negras de sucesso
Para celebrar o empreendedorismo feminino, elas dão conselhos para quem está no início da jornada ou com dificuldades no caminho
As lições de empreendedoras negras de sucesso
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Meio & Mensagem
19 de novembro de 2024 - 12h14
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 34% dos negócios no Brasil estão sob a liderança de mulheres, totalizando mais de 10 milhões de empreendedoras. Contudo, desse recorte da população, são muitas as camadas.
A pesquisa mais recente do Monitor Global de Empreendedorismo mostra um avanço do empreendedorismo feminino no Brasil. Entre 2022 e 2023, o País registrou um crescimento da participação das mulheres entre os chamados empreendedores estabelecidos, aqueles com maior maturidade de negócios. Embora os homens continuem liderando nesse perfil de empreendedores, houve um crescimento de aproximadamente 18% na proporção de empreendedoras estabelecidas quando comparado a 2022.
Outra pesquisa do Consulado da Mulher, intitulada “Nano Empreendedorismo Feminino: Desafios e Motivações”, traz uma característica importante dessas mulheres empreendedoras. Embora 97% das entrevistadas tenham algum tipo de empreendimento, 25% não se consideram empreendedoras. Isso levanta a questão: a falta de maturidade do negócio é o principal fator ou existe uma insegurança em se autodenominar empreendedora?
Neste estudo, 70 empreendedoras estão na categoria de mais experientes, com negócios funcionando há mais de 10 anos. No entanto, quase metade (48,5%) ainda está no início da jornada, com menos de 1 a 3 anos de atividade. Um grande obstáculo identificado é a dificuldade em conciliar as responsabilidades domésticas com o trabalho. Embora 64,5% dessas mulheres afirmam receber ajuda de familiares ou do marido, quase metade (47,8%) dedica cerca de 35 horas semanais aos cuidados do lar.
Já no levantamento “Empreendedoras e seus negócios” de 2024, feito pela Rede Mulher Empreendedora, conseguimos mais informações sobre as empreendedoras negras brasileiras. De acordo com o relatório, as mulheres negras empreendedoras são menos escolarizadas em relação às mulheres brancas. Dentre aquelas que possuem ensino superior completo, 61% são brancas e 44% são pretas e pardas.
Ainda segundo a pesquisa, 58% das empreendedoras são chefes de famílias, sendo que 62% delas são mulheres pretas e pardas. Além disso, 61% delas têm rendimento individual de até 2 salários mínimos, enquanto para as mulheres brancas, este número cai para 39%. Do total de empreendedoras negras, 49% têm faturamento mensal de até 2 mil reais, e 52% delas estão endividadas.
As pesquisas trazem um contexto sobre como o empreendedorismo ainda é um desafio para as mulheres, por inúmeras questões, seja falta de oportunidades ou falta de autoconfiança. Quando adicionamos o recorte de raça, as barreiras são ainda maiores — mas não impossíveis.
Por isso, para o dia do empreendedorismo feminino, 19 de novembro, pedimos para empreendedoras negras de sucesso alguns conselhos que dariam para outras mulheres negras que estão no início de sua jornada empreendedora. E a lição que tiramos delas é: acredite no seu potencial e na sua visão, porque sua perspectiva é muito valiosa para o mercado.
Confira o que elas disseram.
“Algo que tem tomado boa parte das minhas reflexões e que desejo dividir é que, em tempos de IA, é necessário um esforço recorrente de usarmos a nossa poderosa imaginação para projetar futuros que caibam a nossa população negra. O caos do presente não foi idealizado por nós. Ele foi moldado pela imaginação de pessoas que não refletiam sobre as nossas necessidades. Então, deixo a provocação para empreendedoras e lideranças de todos os setores: A hora de imaginar e moldar futuros onde nossas vozes e experiências lideram a inovação é agora.”
“Valorize sua autenticidade. Sua história, suas raízes e a sua individualidade são seus maiores ativos. Não tenha medo de trazê-los à tona em seu negócio, pois isso te tornará única em um mercado cheio de opções.
Além disso, encontre e cultive uma rede de apoio. Conectar-se com outras empreendedoras negras pode ser uma fonte poderosa de inspiração, aprendizado e suporte. Compartilhe suas vitórias, mas também suas dificuldades, pois isso fortalece laços e cria um ambiente colaborativo. Lembre-se de que a sua jornada pode ter obstáculos, mas cada desafio é uma oportunidade de crescimento e aprendizado. Seja resiliente, mantenha-se fiel aos seus valores e nunca perca a paixão pelo que você faz. O mundo precisa da sua visão e do seu propósito. Estamos todas juntas nessa.”
“O empreendedor muitas vezes é apaixonado pela solução ao invés do problema. Então, se eu pudesse aconselhar uma empreendedora, diria para nunca perder do seu norte a escuta ao cliente, para constantemente validar se o produto ou serviço que oferece realmente atende a uma necessidade do consumidor.”
“Se o convite não chegar, se autoconvide. Não espere que as pessoas ou o sistema mudem, você é quem pode transformar isso ao virar suas chaves internas e se permitir ocupar os espaços que acha que deveria estar. Quando vê aquele simpósio ou conferência e pensa ‘eu deveria estar ali’, ao invés de esperar ser chamada, pergunte-se: quais caminhos você pode traçar para estar naquele lugar? Se for uma viagem ou uma experiência que você deseja, que tal, se possível, se planejar para estar lá, mesmo sem o convite?
Talvez os convites não cheguem, ou talvez você não faça parte dos círculos que poderiam te convidar e te dar visibilidade. Isso acontece, em grande parte, devido a um sistema que nos invisibiliza. No Brasil, negros e brancos nem sempre convivem como deveriam, em diferentes camadas da sociedade, além do campo profissional e superficial. Por isso, muitas vezes, é necessário que a gente se autoconvide mais para ocupar os espaços que são nossos por direito — ou que deveriam ser. Isso nos ajuda a hackear o sistema, romper bolhas e desbloquear oportunidades, aliados, parceiros e até financiamento, pois essa jornada também precisa de recursos. Então, autoconvide-se mais.”
“Eu poderia aqui dar conselhos para incentivar e impulsionar, mas acho redundante e desnecessário quando se trata de empreendedoras negras. Nós, mulheres negras, estamos sempre dando nosso máximo e nosso melhor em tudo que fazemos. Além disso, somos nós que fazemos a economia girar no Brasil.
Segundo uma pesquisa realizada pelo Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), em 2021, 47% das mulheres que empreendem no Brasil são negras. Sendo assim, minhas palavras para essas mulheres que estão dando os primeiros passos da sua jornada empreendedora são: você está fazendo um ótimo trabalho. Essa jornada não é uma corrida de 100 metros com barreira, e sim uma maratona, então vai com calma e se abasteça de conhecimento de mercado e ponha à prova múltiplas vezes o teu modelo de negócio. Não caia na superstição de não conversar com as pessoas sobre seus planos, pois você precisará de ajuda e contatos nessa jornada.
E se, por fim, der tudo errado, não necessariamente foi tudo culpa sua. Lembre-se de que há fatores externos e variáveis que você não controla e muitos deles estão entranhados nas estruturas de nossa sociedade.”
“Confie em si mesma e em sua visão. Empreender é um caminho desafiador e, como mulheres negras, enfrentamos barreiras que vão além das dificuldades comuns do mercado. Aproveite as oportunidades para construir uma rede de apoio e de afeto, conecte-se com outras empreendedoras e busque mentorias que fortaleçam seu conhecimento e suas habilidades. Lembre-se de que sua perspectiva única é um ativo poderoso. Esteja sempre aberta a aprender e a se adaptar, e, acima de tudo, mantenha-se fiel ao impacto que quer gerar. O mercado precisa da sua voz, e as pessoas que você vai impactar também.”
“Construa uma narrativa que potencialize as suas forças e diferenciais. Foque em seu plano e não se distraia com vozes sabotadoras, pois ter autoconfiança vai te levar além. Construa uma rede de networking com parcerias estratégicas que possam te ajudar a alavancar sua visibilidade e atuação em sua área. Cuide de sua imagem e valorize seu serviço independentemente do número de seguidores que você tenha. Saber precificar e posicionar seus negócios faz toda a diferença para que você avance e prospere.”
“A maioria das mulheres tem que conciliar empresa, casa, família e estudos. Por isso, ter o próprio negócio requer disposição e garra para dar conta de tantas atividades. O preconceito é outro grande desafio que o empreendedorismo feminino enfrenta, principalmente uma mulher preta, mesmo que tenhamos as mesmas competências técnicas que o homem para exercer determinada função.
Quando comecei, não tinha muito incentivo, nem órgãos que podiam me dar apoio, e hoje existem muitas opções. Então, a minha dica é: busquem instituições que possam te orientar no seu negócio, caso ele já exista, ou no sonho que você tem na cabeça ou no coração. Outro ponto fundamental para mim é investir em algo que seja bom para o outro, não só para você. Ame o que faz, porque empreender cansa e se a gente não amar muito, tudo fica mais difícil e pesado. E, claro, nunca desista. Acredite sempre em você.”
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