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Da IA ao open health: como executivas estão inovando o setor de saúde

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Da IA ao open health: como executivas estão inovando o setor de saúde

Lideranças da Eurofarma, Grupo Sabin, Roche Farma, Weleda e ViewMind revelam como estão moldando o futuro do segmento no Brasil


17 de abril de 2025 - 11h53

O setor de saúde no Brasil é um dos mais expressivos da economia nacional. Composto pelo ecossistema de indústrias farmacêuticas, hospitais públicos e privados, operadoras de planos de saúde, laboratórios de diagnóstico, clínicas, healthtechs e empresas de biotecnologia, movimenta mais de R$ 700 bilhões por ano, de acordo com a última Conta-Satélite de Saúde, realizada pelo IBGE. Isso representa cerca de 9% do PIB, e mais da metade desse valor é investido pelo setor privado.

Nos últimos anos, esse ecossistema foi colocado à prova com a chegada da pandemia da Covid-19, que expôs vulnerabilidades estruturais e intensificou desafios já existentes no setor. Hospitais e sistemas de saúde enfrentaram sobrecarga, escassez de insumos e profissionais, além da urgência por respostas rápidas em pesquisa, diagnóstico e vacinação.

Se é possível tirar pontos positivos da crise sanitária, que tanto demandou e afetou a área, foram a valorização da ciência, da colaboração entre setores público e privado e da necessidade de ampliar o acesso à saúde de forma equitativa.

A pandemia acelerou, também, inovações que estavam em curso e uma transformação digital sem precedentes na indústria. A telemedicina foi regulamentada e adotada em larga escala, a inteligência artificial ganhou protagonismo na análise de dados e triagem de pacientes, e houve um avanço significativo na digitalização de processos hospitalares e laboratoriais.

Para Lorice Scalise, presidente da Roche Farma no Brasil, apesar de todo o movimento fundamental de digitalização do setor, o legado humano e o peso das decisões governamentais foram alguns dos principais aprendizados do período. “O que determinou o acesso das pessoas foram as decisões políticas. Por isso, os espaços de diálogo e a construção de pontes entre os setores público e privado são tão ou mais importantes do que o próprio desenvolvimento da ciência.”

Lorice Scalise, presidente da Roche Farma no Brasil: “Os espaços de diálogo e a construção de pontes entre os setores público e privado são tão ou mais importantes do que o desenvolvimento da ciência” (Crédito: Divulgação)

A relevância de uma liderança mais empática também foi uma lição para quem ocupa posições de comando no segmento. “A pandemia reforçou a importância da comunicação clara, da autenticidade e da liderança com empatia, a capacidade que se constrói não apenas por meio de resultados tangíveis, mas também pelo impacto que geramos na vida das pessoas, especialmente em momentos de adversidade”, avalia Renata Campos, CEO da Eurofarma no Brasil desde novembro de 2023.

Maria Claudia Villaboim Fontes, CEO da Weleda no Brasil e América Latina, concorda. “Nunca foi tão importante ter uma liderança mais acolhedora, que entende esse lado humano e que também possa engajar e dar sentido ao trabalho. Na pandemia, orquestramos pessoas que estavam online, principalmente no backoffice, mas também quem estava no campo de batalha. Na fábrica e nas farmácias, produzimos para atender uma grande demanda de medicamentos. Tivemos um crescimento bastante expressivo no período.”

“Nunca foi tão importante ter uma liderança mais acolhedora, que entende esse lado humano e que também possa engajar e dar sentido ao trabalho”, diz Maria Claudia Villaboim Fontes, CEO da Weleda no Brasil e América Latina (Crédito: Divulgação)

A executiva começou a jornada profissional na Natura e passou por empresas como Haarman & Reimer e Sanofi-Aventis, foi responsável pela chegada da primeira linha de dermocosmético no Brasil, a Eau Thermale Avene, e pelo lançamento do botox, a toxina botulínica Dysport. Depois, em 2000, esteve à frente do lançamento dos genéricos no Brasil, uma mudança importante para o setor. No comando da Weleda desde 2016, tem a missão de desenvolver a marca suíça e seus medicamentos antroposóficos e cosméticos naturais e orgânicos na região.

Propósito como ponto de partida

Muitas lideranças femininas do segmento de saúde começaram suas carreiras na área movidas pelo desejo de melhorar a vida das pessoas. Renata Campos resume: “Meu sonho para minha carreira era impactar positivamente a vida das pessoas e, por isso, escolhi me tornar farmacêutica, por acreditar que a saúde é um campo fértil para concretizar esse propósito”.

Renata é formada em farmácia bioquímica pela Universidade de São Paulo. Nos últimos 10 anos, ocupou posições de liderança como presidente da Takeda na Turquia, Argentina, Brasil, América Latina e Mercados Emergentes.

Lidia Abdalla, presidente-executiva do Grupo Sabin, onde entrou como trainee, em 1999, também relata uma paixão antiga, desde quando decidiu o curso que faria na faculdade. Primeiro, considerou a medicina, mas optou pela farmácia, um segmento mais amplo. “Nos primeiros anos, me encantei pelas análises clínicas, que são minha verdadeira paixão. Sempre levei muito a sério essa missão e responsabilidade, no meu lugar de privilégio, de ajudar as pessoas”.

Renata Campos, CEO da Eurofarma no Brasil: “Meu sonho para minha carreira era impactar positivamente a vida das pessoas” (Crédito: Divulgação)

Já Renata Afonso trilhou um caminho distinto até o setor de saúde, mas cheio de propósito. Após mais de 20 anos como executiva de mídia, passando por empresas como CNN Brasil, TV Tem (afiliada da Globo no interior paulista) e HBO, ela decidiu fazer uma pausa na carreira e tirou pouco mais de um ano sabático. Em 2024, retornou ao mercado em uma nova direção: assumiu a liderança da ViewMind na América Latina, uma healthtech especializada em saúde neurocognitiva.

“Amo mídia, mas queria me experimentar, ir para uma empresa de tamanho e velocidade diferentes. Hoje, temos o desafio importante como sociedade de cuidar da saúde mental. Com a população envelhecendo, há um aumento natural das questões neurológicas e cognitivas, que vão estar mais presentes. Para tudo isso, precisamos de ferramentas. A ViewMind preenchia tudo isso para mim.”

Tecnologia: tão longe, tão perto

A percepção sobre a aceleração da transformação digital na saúde é unânime entre as executivas. Lorice, da Roche Farma, destaca que a inteligência artificial já faz parte do cotidiano da empresa, sendo utilizada desde a fase de desenvolvimento de novas moléculas até a condução de estudos clínicos, ampliando a eficiência e a precisão dos processos.

“A IA pode ser um caminho incrível para buscar soluções para problemas atuais e futuros. Traz eficiência e perspectivas diferentes, facilita o dia a dia de todos os profissionais, ampliando conhecimento e tornando os processos mais assertivos.”

Renata Afonso encara a tecnologia como uma necessidade frente às inúmeras demandas do setor, que carece de profissionais. “A tecnologia tem revolucionado a área da saúde, e agora vai ganhar tração com a chegada da inteligência artificial. Teremos diagnósticos mais precisos, com velocidade e eficiência. O mundo não tem médicos suficientes para a quantidade de pessoas que existem, então precisamos disso. Há, obviamente, as questões de privacidade de dados e de informação, mas tudo isso está muito endereçado com os governos do mundo inteiro.”

A ViewMind usa óculos de realidade aumentada para identificar sinais precoces de Alzheimer, Parkinson e outros distúrbios do cérebro. O produto, já aprovado no Brasil, é um caminho para a prevenção, algo que, segundo Renata Afonso, é o principal caminho para a saúde, mais do que o tratamento.

“Alguns países já estão mais avançados nesse caminho do que nós. O quanto antes você detecta o Alzheimer, por exemplo, um dos diagnósticos mais desafiadores que as pessoas podem ter, mais você consegue retardar a evolução da doença”, aponta.

Para a executiva, a prevenção das doenças neurocognitivas ainda são um desafio no Brasil e na América Latina como um todo. “Quando fazemos um checkup, realizamos uma série de exames. Vemos como está nosso coração, mas não vemos como está nosso cérebro. No entanto, pesquisas apontam que, na pandemia, as pessoas tinham mais medo de ter Alzheimer do que Covid, ou até câncer.”

Entre o open health e o acesso

Um dos temas centrais na discussão sobre tecnologia aplicada à saúde é o conceito de open health, inspirado no modelo do open finance. A proposta é permitir o compartilhamento seguro de dados pessoais para oferecer serviços e produtos mais eficientes e personalizados no setor. Enquanto no open finance os dados dizem respeito à vida financeira dos usuários, como informações bancárias, de seguros e investimentos, no open health o foco está em dados clínicos e históricos de saúde.

No Brasil, um sistema com essa proposta está em desenvolvimento por um grupo de trabalho do governo em parceria com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). O objetivo é transformar o cuidado com o paciente por meio de um prontuário eletrônico unificado, que integrará informações entre os diversos agentes do setor. A ideia é facilitar a portabilidade dos planos de saúde e reduzir desperdícios. Previsto para ser implementado em 2028, o projeto traz importantes desafios relacionados à LGPD e ao tratamento dos dados sensíveis dos pacientes.

Lorice Scalise avalia que o sistema trará mudanças positivas para todo o ecossistema da saúde. “Penso no dia em que todas as pessoas terão seus históricos de saúde em uma plataforma única e espero que esse momento chegue logo, porque será um divisor de águas na forma como seremos atendidos e acompanhados pelos profissionais da área.”

Para além do open health, uma discussão constante no setor é a falta de acesso da população a todos os serviços e produtos, sobretudo os que têm a tecnologia como aliada, do diagnóstico ao tratamento. “Inovação sem acesso não cumpre seu propósito. O grande desafio do setor é garantir que as descobertas científicas cheguem a quem realmente precisa”, avalia Scalise.

“A tecnologia é uma realidade, mas ainda falta democratizar e levá-la para a população em geral. Porque temos o Brasil dos melhores hospitais, de que devemos morrer de orgulho, mas também temos o Brasil profundo, onde o médico mais próximo está muito distante, inacessível por transporte público. Acho que a tecnologia vai ajudar nessas situações. Mas, por enquanto, temos um Brasil absolutamente tecnológico, de ponta, e um País em que essa tecnologia ainda precisa chegar”, diz Renata Afonso.

Lidia Abdalla exemplifica com o projeto Rita Saúde, do Grupo Sabin, uma plataforma que democratiza o acesso a consultas e exames com atendimento humanizado e suporte contínuo via aplicativo. “Na era digital, as novas tecnologias ampliam o acesso a serviços de saúde que, até então, estavam distantes da população de baixa renda.”

Futuro inclusivo, digital e colaborativo

Para os próximos anos, as executivas apontam tendências claras: digitalização, descentralização, medicina preventiva, olhar atento para o envelhecimento da população, parcerias público-privadas e novos modelos de remuneração na saúde.

“Penso no cuidado cada vez mais próximo do paciente, atendendo às suas necessidades, respeitando seu lugar de origem e suas condições. Além disso, vejo como tendência a medicina baseada em valor, que remunera instituições e profissionais de saúde de acordo com os resultados dos procedimentos e tratamentos”, aponta Lorice.

“Na era digital, as novas tecnologias ampliam o acesso a serviços de saúde que, até então, estavam distantes da população de baixa renda”, avalia Lidia Abdalla, presidente-executiva do Grupo Sabin (Crédito: Wenderson Araújo/Divulgação)

Lidia Abdalla acredita em um futuro em que inovação tecnológica, sustentabilidade e ética se integram em um ecossistema com serviços qualificados e sustentáveis. “Transformação digital, qualidade dos serviços e responsabilidade ambiental e social devem ganhar cada vez mais destaque.”

O envelhecimento populacional e as mudanças climáticas também reforçam, para as executivas, o papel estratégico do diagnóstico na prevenção, predição e gestão das doenças. Segundo Lorice, reforça que, para que isso aconteça, as parcerias público-privadas são cruciais para uma atuação com relevância no setor.

“Menciono, novamente, o valor da aliança entre governos, instituições de saúde e outros parceiros para tornar o sistema de saúde mais eficiente. Dessa forma, podemos alimentar o sistema com as informações de todos esses entes, para garantir que possamos antecipar tendências e oferecer suporte contínuo para os pacientes e sua longevidade.”

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