Da periferia à Amazônia: Kamila Camilo usa a influência para promover a agenda ESG
A ativista fundou o projeto Creators Academy que leva influenciadores para vivenciar a região Amazônica e gerar impacto em suas comunidades
Da periferia à Amazônia: Kamila Camilo usa a influência para promover a agenda ESG
BuscarA ativista fundou o projeto Creators Academy que leva influenciadores para vivenciar a região Amazônica e gerar impacto em suas comunidades
Lidia Capitani
20 de julho de 2023 - 8h23
Nascida na Zona Leste de São Paulo, Kamila Camilo não se imaginava palestrando em eventos internacionais em nome do Fórum Econômico Mundial. Por meio de oportunidades bem aproveitadas, estudo e muito trabalho que Kamila se torna uma voz influente dentro do ativismo ambiental. Reunindo suas experiências, contatos e vontade de fazer barulho, a ativista criou o programa Creators Academy, que em sua segunda edição, levará influenciadores à região da Amazônia para contar histórias e conscientizar suas comunidades sobre a questão ambiental.
Nesta entrevista, Kamila Camilo narra sua trajetória profissional, conta como surgiu o projeto da Creators Academy, explica o que é a “mentalidade regenerativa” e como ela é fundamental para criarmos um futuro sustentável.
Conte um pouco sobre você e sua trajetória profissional.
Eu comecei a trabalhar aos 11 anos e já tive diversas experiências profissionais, desde monitora de festas infantis até fotógrafa. Minha jornada profissional começou de forma mais formal aos 18 anos, quando fiz voluntariado em uma comunidade religiosa, trabalhando como assistente de fotografia em um coletivo de artistas.
Posteriormente, tive a oportunidade de trabalhar como fotógrafa de campanha política. Foi nesse contexto que conheci Daniel Annenberg, que me ofereceu uma oportunidade de trainee na Secretaria Municipal de Inovação e Tecnologia de São Paulo. Eu brinco que sou filha da educação não formal. Tudo que eu fui aprendendo foi de muita curiosidade e Google. Na Prefeitura, eu tive a primeira oportunidade de me desenvolver como profissional com 24 anos, porque alguém olhou para mim e falou “você aprende rápido e eu vou investir em você”. Esse cara foi o Daniel.
Depois de passar por diferentes equipes, cheguei ao FabLab Livre SP, um programa de educação e tecnologia. Nesse ambiente, pude explorar minha curiosidade e paixão por aprendizado. Durante meu tempo no FabLab, liderando a presença da Prefeitura na Campus Party por três anos, tive a oportunidade de promover inclusão e diversidade através de campanhas e eventos.
Você é líder do Davos Lab Brazil, do Fórum Econômico Mundial. Como é participar desses espaços internacionais?
Meu trabalho no FabLab também rendeu reconhecimentos, como minha participação no Young Leaders e na rede Global Shapers, do Fórum Econômico Mundial. Fazer parte do Global Shapers foi uma revolução na minha vida, e assumi a liderança da comunidade em 2020. Aqui vale um disclaimer, porque a comunidade existia há 10 anos no Brasil e tinha apenas duas pessoas negras. Quando eu recebi o primeiro e-mail do Fórum, eu entrei em pânico porque estava em inglês, e eu não falava a língua naquela época. Mas eu me inscrevi para uma bolsa de um curso de inglês e consegui aprender.
Graças ao Global Shapers eu conheci a minha sócia, as minhas melhores amigas e mudei de carreira. Com eles, eu fiz minha primeira viagem internacional. Essa rede foi de fato uma alavanca de transformação na minha vida. O Global Shapers fez por mim o que o networking de uma pessoa rica faz por ela a vida inteira, sabe? Redes como o Global Shapers oferecem perspectivas que normalmente não teríamos acesso. Eu nunca imaginaria estar viajando para a Suíça duas vezes por ano se não fosse o Fórum Econômico Mundial.
Quando você começou a se interessar pela pauta ambiental?
Em 2020, decidi deixar meu trabalho na prefeitura e aceitei a sociedade em uma consultoria de impacto positivo chamada Impact Beyond, fundada pela Flora Bitancourt, que conheci pelo Global Shapers. No meio da pandemia, trabalhando em casa, tive a oportunidade de participar da COP26 na Escócia.
Durante o evento, eu percebi que a agenda ambiental era, de longe, a mais relevante para os próximos 10 anos. Tudo pelo que já militei faz parte dessa agenda. No entanto, entendi que existe uma vontade política de manter as pessoas desinformadas sobre o assunto. É um projeto político manter as pessoas alienadas dos seus direitos de viver de forma saudável e em harmonia com a natureza. Também percebi que a maneira como os veículos entregam a conversa sobre clima não me aproximava do assunto. A mesma coisa em relação aos ativistas e cientistas. Eu voltei e entendi que precisava fazer alguma coisa.
Antes, em 2017, participei de um projeto de tecnologia chamado Barco Hacker, na região da Amazônia, que levava educação e tecnologia para as comunidades ribeirinhas. Nessa experiência, eu vi a diferença entre o pasto e a floresta, senti a contaminação dos rios e entendi a importância de comunicar sobre essas questões.
Conte como surgiu o Creators Academy, seu propósito e os projetos que vocês realizam.
Estudando sobre o poder dos influenciadores, eu entendi que as causas não estavam utilizando a influência de forma assertiva, e aqueles que estavam usando, estavam fazendo de maneira inadequada. Comecei a estudar ciências comportamentais e a desenvolver modelos de intervenção para meus clientes. No entanto, percebi que essas intervenções eram de longo prazo, enquanto a Amazônia, o cerrado e outras questões ambientais exigiam ações imediatas. Foi quando entendi que a comunicação e a propaganda têm o poder de transformar o comportamento das pessoas em curto prazo.
A ideia era convidar um grupo de pessoas para vivenciarem a Amazônia e, por meio dessa experiência, sentirem a importância da causa ambiental. O Instituto Clima e Sociedade, a Open Society Foundation e a Smiles apoiaram o projeto da Creators Academy. No ano passado, tivemos um grupo de microinfluenciadores, e este ano conseguimos expandir. O objetivo é criar pontes entre diferentes pessoas e histórias que normalmente não se cruzariam, mas que são impactadas pela crise climática.
A nova edição da Creators Academy terá influenciadores renomados como Ana Hikari, Maria Xavier, Rincón Sapiência, Chavoso da USP, Natália Arcuri e Angela Mendes. Iremos para o Acre, onde o povo Puyanawa lidera um movimento chamado Aliança Reflorestar. A proposta é promover encontros entre pessoas que, em outras circunstâncias, não se conheceriam, e contar histórias que geralmente não são contadas. Estamos focados em trazer vozes autênticas e diversas para o debate e em abrir espaço para uma discussão justa sobre as questões ambientais.
No Festival Mundial de Publicidade de Gramado, você falou sobre o conceito da mentalidade regenerativa. Poderia explicar do que se trata isso?
Quando penso na regeneração como uma lente para a vida, é porque vejo que estamos saturados como seres humanos. Saturamos o consumo, o capitalismo e as formas prejudiciais de viver tomaram conta de nossa existência. Ao falar de regeneração, estamos falando em melhorar o ecossistema e não apenas voltar ao que era antes, mas ser melhores do que éramos.
A mentalidade regenerativa abrange a espiritualidade, a afetividade e a comunidade. A espiritualidade não se limita a uma conexão com um ser superior, mas pode ser encontrada na natureza e na relação com algo maior do que nós mesmos. A afetividade refere-se à nossa relação com outras pessoas, pois se não regenerarmos os nossos vínculos com outros seres humanos e nos tornarmos centrados apenas em nós mesmos, qual é o propósito da existência? O capitalismo, em sua busca pelo acúmulo individual, perdeu o sentido de prosperidade coletiva necessária para resolver nossos problemas e regenerar o planeta.
A comunidade desempenha um papel fundamental, pois os seres humanos foram feitos para viver em comunidade, compartilhar e criar laços. Infelizmente, perdemos esse senso de comunidade em muitos aspectos da vida. É importante criar movimentos de regeneração e isso exige constância e frequência. É necessário que algumas pessoas sejam constantes e façam as mesmas coisas todos os dias, enquanto outros mantêm a frequência de ações que trazem todos para um nível mais alto.
A mentalidade regenerativa também se baseia na criação de memórias emocionais positivas repetidas vezes para que essas experiências influenciem a mudança de comportamento. Lideranças regenerativas entendem a importância da emoção no processo de gestão. Infelizmente, a maioria dos líderes deixa de lado a paixão. No entanto, uma liderança regenerativa consegue adicionar paixão ao processo, mas não uma paixão cega, e sim uma liderança compassiva, que se importa verdadeiramente com as outras pessoas e consegue compreender suas necessidades. Regeneração é uma lente da vida que nos leva a ser melhores para nós mesmos e para os outros, reconhecendo que às vezes seremos nossa pior versão, mas aprendendo com isso e seguindo em frente.
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