É hora de acelerar
A igualdade de gênero não pode esperar cinco gerações para acontecer. É preciso que as lideranças busquem reduzir ativamente o "gender gap"
A igualdade de gênero não pode esperar cinco gerações para acontecer. É preciso que as lideranças busquem reduzir ativamente o "gender gap"
16 de julho de 2024 - 7h24
O mundo levará 134 anos para atingir a paridade entre homens e mulheres no mercado de trabalho, segundo um estudo realizado pelo World Economic Forum, que levou em consideração a participação da mulher em 146 países nos setores de economia, política, educação e saúde.
Além deste resultado geral, o Global Gender Gap Report apontou algumas diferenças regionais. A Europa continua na liderança absoluta — como tem ocorrido desde que o estudo foi criado em 2006 —, mas América do Sul e Caribe vem evoluindo rapidamente e hoje já ocupa a terceira melhor posição entre as 8 regiões estudadas.
No ranking geral por país, o Brasil ficou em 70º lugar entre os 146 países, o que mostra que ainda temos um longo caminho para percorrer. Mas acredito firmemente que com ação, foco e persistência podemos percorrer essa distância rumo à igualdade em alta velocidade.
Não é à toa que todas nós mulheres de alguma forma já fomos questionadas ou até “menosprezadas” em alguma situação de trabalho por sermos mulheres. Muitas vezes não ouvidas, muitas vezes chamadas de “ansiosas”, sem contar em frases prontas para nos apontar como menores. Situação cotidiana que posso afirmar que 100% das mulheres no mercado de trabalho já sofreram, principalmente aquelas que escalam posições de liderança e senioridade nas empresas.
Por isso é muito importante a nossa própria atuação para ajudar a mudar esse cenário. Para conseguir essa aceleração, é preciso que todas as pessoas em posições de liderança se comprometam em promover ativamente a paridade de gênero.
Isso é tão importante que faço questão de detalhar. Quando digo “todas as pessoas” não deveriam ser apenas as mulheres, e sim todos, homens e mulheres. A gente tende a achar que automaticamente uma mulher em posição de liderança vai dar oportunidades iguais para as outras, mas, infelizmente, não é assim. O machismo estrutural está tão enraizado no subconsciente das pessoas na nossa sociedade que não é raro observar a falta de sororidade entre as mulheres. Ou seja, a líder mulher não se mobiliza para ajudar outra mulher por puro preconceito, mesmo que seja inconsciente.
Quanto aos homens em posição de liderança, só posso dizer que os que buscam ativamente ser um “he for she” tendem a fazer um trabalho maravilhoso no sentido de dar oportunidades para as mulheres. Eu mesma sou uma mulher que tive a oportunidade aberta por um homem, meu ex-sócio e amigo Ricardo Marques, que me incentivou a acreditar em mim e a empreender e, também, meu sócio Carlos Scappini, que me dá toda a cobertura e o suporte no dia a dia para dirigir a Mynd. Sem contar em todos os homens líderes com quem trabalho e me incentivam no meu desenvolvimento profissional.
Quando me refiro a “cargos de liderança” não estou falando só de CEO. Estou me referindo a todo mundo que gere pessoas na cadeia organizacional — do supervisor de área, passando por coordenação, gerência, diretoria e incluindo os conselhos consultivos e administrativos. Em outras palavras: as empresas precisam ter uma cultura transversal de promoção da paridade de gênero e exigir que ela seja cumprida por todos, incentivando a contratação de mulheres.
Não é fazer uma caça aos machistas, e sim travar uma batalha constante contra o machismo estrutural. Se todos estiverem comprometidos com isso, um ajuda o outro a se livrar de vieses inconscientes que sabotam a igualdade de oportunidades. Muitas vezes já ouvi comentários de “não dá pra contratar porque tem dois filhos”. Traduzindo: “não vai poder trabalhar 24×7 como um homem”, sendo que ambos têm o mesmo filho, certo? Porque um filho nasce da mãe, mas também nasce do pai.
A determinação das lideranças realmente pode fazer toda diferença. Acredito nisso porque vivemos isso na Mynd desde a sua concepção. Hoje, na empresa, mais de 70% dos funcionários são mulheres, sendo que boa parte da diretoria também é composta por pessoas do gênero feminino. Acredito que seja por isso que estamos sempre na vanguarda das tendências em comunicação e lideramos o segmento de entretenimento e marketing de influência na América Latina. Até porque eu, como líder da empresa, por exemplo, sei que dá para trabalhar e ter filhos. Eu mesma tenho três filhos e eles não atrapalharam em nada a Mynd chegar onde chegou.
Somos uma empresa do setor de marketing e comunicação, segmento pioneiro em dar oportunidades para mulheres assumirem cargos de liderança. Hoje, basta olhar no cenário de líderes de marketing em grandes marcas que veremos muitas mulheres brilhando em vários escalões, inclusive como CMOs. Na publicidade, ainda são poucas as CEOs mulheres nas grandes agências, mas a evolução em relação a uma década atrás já é sensível. Normalmente, as mulheres estão nas lideranças de marketing ou recursos humanos.
Acredito que as empresas onde a paridade de gênero já é uma realidade têm tudo para servir de inspiração para as outras e, com isso, que a gente consiga, enquanto sociedade, rapidamente abreviar essas previsões terríveis de que teremos que esperar 134 anos pela igualdade de oportunidades. De uma coisa eu sei: minhas filhas não vão aceitar esperar.
Compartilhe
Veja também
Como as marcas podem combater o racismo na publicidade?
Agências, anunciantes e pesquisadores discutem como a indústria pode ser uma aliada na pauta antirracista, sobretudo frente ao recorte de gênero
Cida Bento é homenageada pela Mauricio de Sousa Produções
A psicóloga e ativista vira personagem dos quadrinhos no projeto Donas da Rua, da Turma da Mônica