Encontrando Viola Davis
“Oprah + Viola” foi uma das maneiras mais impactantes pelas quais passei 48 minutos da minha vida ao longo desse ano intenso e distópico
“Oprah + Viola” foi uma das maneiras mais impactantes pelas quais passei 48 minutos da minha vida ao longo desse ano intenso e distópico
29 de abril de 2022 - 9h25
Era para ser um potente encontro entre duas das mulheres negras mais bem-sucedidas do showbiz norte-americano na principal plataforma de streaming do mundo. E foi. No entanto, como tudo em se tratando de Viola Davis, o transbordamento de sua história de vida deixou muitas outras marcas e vários trechos da entrevista concedida a Oprah Winfrey no especial da Netflix compartilhados em grupos de WhatsApp.
Além do reconhecimento no cinema, teatro e televisão, a atriz ganhadora de um Oscar, um Emmy e dois Tonny Awards agora empresta sua marca ao mundo da literatura, revelando outras facetas pouco conhecidas pelo público. Finding Me: A Memoir (HarperOne, 2022), autobiografia de Viola escrita durante a pandemia, é o tema da entrevista concedida pela atriz à Oprah, em uma conversa franca e aberta sobe superação, vulnerabilidade e enfrentamento da violência e do racismo desde muito cedo.
Da infância miserável e de muita privação em Rhode Island, um dos estados norte-americanos mais frios, sem acesso a aquecimento, morando numa casa infestada por ratos que chegavam a pular em sua cama e a roer o rosto de suas bonecas enquanto ela dormia, Viola vem de uma realidade de muitos “nãos”. Como se o peso dessas adversidades não fosse suficiente, ainda enfrentou o racismo dos colegas de classe, que a perseguiam com paus e pedras chamando-a de “crioula feia”. Desde criança precisou criar suas estratégias de defesa para sobreviver, como levar uma agulha de crochê e ameaçar os seus agressores.
Agressões, inclusive, eram presenciadas no próprio ambiente familiar. Davis relata a necessidade de enfrentar seu pai após ele ferir a cabeça de sua mãe com um copo de vidro, em alguns desses embates. Abusos sexuais também compunham as cenas reais de sua infância, numa época em que as pessoas não falavam sobre esse tema. “Eu acredito que sua vida é uma espécie de morte do seu eu. Isso é parte de sua jornada, e se descobrir é passar por essas cavernas de trauma, e crueldade”, revela a atriz para Oprah, afirmando que sua trajetória foi importante para ela tornar-se quem se tornou.
Assim como a humanidade presente em suas atuações, a atriz não se intimida em falar da sua própria vulnerabilidade. Davis relata que urinou na cama até os 14 anos, e que muitas vezes foi pra escola com o forte odor, pois não tinha acesso suficiente à higiene. A situação foi percebida por sua professora, que passou a dar um suporte, inclusive com doações. “Os professores salvaram minha vida”, comenta Oprah em concordância.
Para superar todos os episódios de adversidade que vivenciou, foi na arte que a atriz conseguiu uma válvula de escape. Quando perguntada sobre quando enxergou a atuação como um processo de cura, Viola assume que foi “no momento em que fiz a primeira esquete, aos nove anos, eu percebi que isso tinha a capacidade de me curar”. Mesmo passando por processos de autossabotagem, até pensando em abandonar a própria carreira, essa cura prossegue, e torna-se uma narrativa de inspiração para muita gente. Outros temas pessoais como casamento e adoção também perpassam o especial.
“Oprah + Viola” foi uma das maneiras mais impactantes pelas quais passei 48 minutos da minha vida ao longo desse ano intenso e distópico. Sua emoção crua e as histórias não filtradas fornecem uma rara descrição de realidades silenciadas e, infelizmente, corriqueiras: a de jovens mulheres negras oprimidas e violentadas por apenas serem.
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