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Opinião

Futuro sob medida

Personalizar não é só atender a desejos, mas algo próximo de criar pontes para um projeto maior


12 de fevereiro de 2025 - 13h39

(Crédito: Shutterstock)

 

Imagine que, depois de um longo dia de trabalho, você abre a porta da sua casa e a música de que mais gosta começa a tocar. Logo ao entrar, percebe que o ambiente exala um perfume suave, que te agrada, assim como as luzes, ajustadas ao nível de claridade que você prefere. Tudo ao redor combina com seu momento.  

Não se trata de magia, mas de tecnologia em sua essência mais refinada: a personalização. Um conceito que ultrapassou telas e playlists, alcançando um novo território de experiências que dialogam diretamente com os gostos e sutilezas de cada um de nós. 

Por anos, essa prática de tailor made vem ampliando sua presença no nosso cotidiano, oferecendo sugestões baseadas no “gosto de quem é parecido com você”. De serviços de streaming a redes sociais, começamos como protagonistas de roteiros escritos por algoritmos. 

Atualmente, esse enredo se intensificou: temos a inteligência artificial e outras tecnologias que não apenas sugerem, mas preveem necessidades e desejos que ainda nem articulamos. Oráculo de Delfos? Esquece. Este é um tipo de premonição tecnológica que deixa qualquer vidente no chinelo. E não, isso não acontece por acaso e redefine o que consideramos experiência. 

Imagine perguntar ao seu dispositivo por “aquela foto do pôr do sol na praia”, e ele imediatamente encontrá-la na sua galeria. Ou achar rapidamente o melhor tamanho da fonte no celular na lista dentro das configurações. A interação é natural, fluida e sem barreiras. 

Combinando histórico de uso e padrões de comportamento, recebemos opções que nos oferecem ações e experiências impossíveis de recusar. Pense naquela música que o streaming te sugeriu e você adorou assim que ouviu! Não é exagero dizer que somos vistos de forma mais holística pelos algoritmos (e por seus infinitos cruzamentos) do que por muitas pessoas que convivem ao nosso redor. 

Os serviços de streaming analisam estilo e outros elementos dos filmes que você escolhe e das séries que costuma maratonar. Para se ter ideia da granulagem, o algoritmo capta até a hora do dia em que você tem o hábito de assistir aos programas e assim sugere no momento mais favorável o próximo sucesso irresistível.  

Plataformas de e-commerce utilizam algoritmos para recomendar itens que complementam a última compra que você fez. E, aqui entre nós, frequentemente acertam. Redes sociais filtram o conteúdo para mostrar o que você, provavelmente, vai curtir primeiro. Dispositivos de saúde detectam padrões de sono ou atividade física e oferecem dicas personalizadas para melhorar sua rotina e bem-estar. E quando o assunto é eliminar ruídos de vídeos gravados, a tecnologia agora também ajusta os sons para que você ouça apenas o que importa – um recurso simples que pode melhorar muito aqueles vídeos em locais lotados. 

Seu gosto musical, seu filme favorito, sua mania de escovar os dentes escutando podcasts sobre história medieval – tudo isso forma um mosaico no qual a personalização não é apenas um luxo. É o que você espera que te ofereçam. Nada menos. 

Com mais de 30 anos atuando no marketing, não tenho dúvidas de que é nesse campo que tal tendência encontra sua real potência. Porque, no final, o que move as pessoas – consumidores ou não – é a sensação de ser visto, ouvido e, sobretudo, compreendido. É justamente aqui que reside o poder da personalização. Em um mundo ruidoso, o gesto sutil de criar algo que pareça exclusivamente nosso soa como uma sinfonia silenciosa. 

Se procurarmos as razões mais profundas para essa busca por singularidade, devemos nos deparar com raízes comuns à nossa espécie. Quem nunca quis ser aquele que recebe o presente perfeito, o elogio exato ou a oportunidade que se encaixa como a peça que faltava no quebra-cabeça? Somos criaturas de emoção, e é aí que a personalização revela seu enorme potencial. 

Se, em décadas passadas, o desafio das marcas era atingir a maior quantidade de pessoas possível, hoje o verdadeiro troféu é cativar cada uma em sua plenitude. E esse jogo só é vencido quando nos tornamos capazes de reconhecer desejos complexos que nem sempre são óbvios. Há um traço de beleza e alguma poesia nisso: é como se um reflexo fosse captado com precisão por um espelho em movimento. Um espelho irresistível. 

É uma sensação diferente ter experiências feitas para você, e não para todos. É o tipo de coisa que recebemos bem porque acalma o caos. Num mundo onde tudo compete por atenção, ser “o escolhido” pode ser um gesto poderoso. 

Mas toda essa sofisticação se rompe em uma fração de segundo se a ética não for o limite de qualquer ação. A inteligência artificial é uma força em rápida expansão, mas a ética é a energia que a delimita e direciona. Sem essa bússola, a personalização pode deixar de ser um privilégio e se tornar um risco. O que nos faz humanos é a consciência do outro, e é isso que deve guiar a tecnologia para que ela continue ampliando horizontes – e não criando muros. 

Acabamos de alcançar um patamar em que as tecnologias conseguem entender, sugerir e executar ações personalizadas automaticamente. É como ter um assistente invisível que aprende com você a cada interação, ajustando-se às suas preferências com precisão única. Este é o momento em que a frase “seu verdadeiro aliado AI” faz sentido, porque vai além de funcionalidades tecnológicas – é sobre ter algo que se adapta e melhora sua vida. E que já está acessível dentro de celulares. 

Este é o novo patamar, aquele em que os limites entre o que escolhemos e o que nos escolhe começarão a se dissolver. Estamos diante de um horizonte no qual a tecnologia não apenas responde aos nossos comandos. Ela dialoga com quem somos, oferecendo personalização extrema. Estreitando ainda mais os laços entre dados e desejo, em uma entrega que vai muito além da experiência. 

É um caminho inédito, que construímos coletivamente. Nesta jornada, as perguntas certas – e as respostas inesperadas – não vão parar de surgir. É o começo de um percurso, sinalizado por dados que ecoam quem somos. A tecnologia nos oferece reflexos cada vez mais nítidos, mas também nos desafia a olhar para além do espelho. Personalizar não é só atender a desejos, mas algo próximo de criar pontes para algo maior, que nos conecte ao todo, sem esquecer o que nos faz únicos. 

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