Honrar Ilon Specht e todas que vieram antes
Valorizar as mulheres pioneiras na criação de agências é reconhecer a luta árdua enfrentada em um ambiente historicamente dominado pelo machismo
Valorizar as mulheres pioneiras na criação de agências é reconhecer a luta árdua enfrentada em um ambiente historicamente dominado pelo machismo
30 de julho de 2024 - 7h15
Não lembrava da última vez em que eu tinha chorado ao assistir a um filme num grande auditório do Palais. Muita gente não sabe, mas até uns 10 anos atrás passávamos horas naquelas cadeiras confortáveis assistindo a centenas de comerciais criados para todas as categorias e indústrias, depois vídeo cases, até que essas sessões foram sendo deslocadas para salas cada vez menores e acabaram sumindo da programação. Mas lá estava eu, no dia 19 de junho de 2024, aplaudindo de pé um filme. Não um comercial, mas um curta, protagonizado pela redatora que mudou a forma como as mulheres são vistas fora e dentro das agências.
The Final Copy of Ilon Specht é uma obra que mostra um pouco da vida e da carreira da mente brilhante por trás de “Because I’m Worth It”, de L’Oréal, que já perdura há 50 anos e é o mais longevo slogan de uma marca.
Talvez porque seja muito mais do que um slogan de marca. Imagine só, eram os anos 70, uma publicidade cheia de estereótipos. Nem preciso dizer que a maioria das campanhas direcionadas para o público feminino eram desenvolvidas por homens. Mas dentro da McCann NY havia uma redatora incomodada, de apenas 23 anos, que sentia falta de uma conexão genuína entre as mensagens publicitárias e as mulheres que as recebiam. Essa redatora era Ilon Specht.
Foi nesse contexto que ela criou “Because I’m Worth It”. Frase curta, mas poderosa, que não só transformou a L’Oréal, como também revolucionou o discurso publicitário da época. Pela primeira vez, os comerciais de TV mostravam mulheres confiantes, olhando e falando diretamente para a câmera, afirmando seu valor. O impacto foi imediato, posicionando a L’Oréal como uma das principais marcas de cosméticos do mundo.
Mas “Because I’m Worth It” foi além da publicidade e se tornou um símbolo do movimento feminista dos anos 1970. Em um período em que o feminismo ganhava força, com mulheres ao redor do mundo lutando por igualdade, a frase de Specht ecoava esse sentimento de empoderamento. Ela se alinhava perfeitamente com a narrativa de que as mulheres não precisavam de validação externa para se sentirem valiosas.
Honrar as mulheres pioneiras na criação de agências de publicidade é essencial para reconhecer e valorizar a luta árdua enfrentada em um ambiente historicamente dominado pelo machismo. Mulheres como Ilon e, no Brasil, redatoras como Tetê Pacheco e Camila Franco abriram caminho em uma indústria onde suas habilidades e ideias muitas vezes eram subestimadas ou ignoradas, desafiando normas sociais e preconceitos de gênero para se estabelecerem como forças inovadoras e criativas.
Sempre que celebramos as conquistas dessas profissionais, não apenas prestamos homenagem ao legado delas, mas também inspiramos novas gerações a persistirem, promovendo uma indústria mais inclusiva e criativa.
No final daquela sessão inesquecível em Cannes, um auditório cheio e emocionado ouviu Andie MacDowell dizer que, como embaixadora da marca por 30 anos, repetiu centenas de vezes essa frase, mas que ela nunca tinha feito tanto sentido como agora.
It was worth it, Ilon.
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