Já pensou por que não há mulheres na F1?
A carreira feminina no automobilismo infelizmente segue a mesma máxima de tantos outros esportes, mesmo sendo a mais propensa a ser igualitária
A carreira feminina no automobilismo infelizmente segue a mesma máxima de tantos outros esportes, mesmo sendo a mais propensa a ser igualitária
17 de novembro de 2023 - 8h34
A F1 é um esporte que poderia ser um dos mais democráticos e um real exemplo da equidade de gênero no setor. Dos esportes de alta visibilidade e competitividade no mundo, a F1 é possivelmente um dos únicos onde as diferenças físicas entre homens e mulheres não têm tanto peso e importância, pois, nele, habilidades e conhecimento contam mais do que força física.
Mesmo assim, por que ainda não vemos mulheres competindo na F1? No automobilismo, em geral, a presença de mulheres é historicamente baixa. Apesar de serem estarem presentes em alguns cargos estratégicos, a igualdade de gênero ainda é muito baixa na F1. Historicamente a modalidade é um ambiente predominantemente masculino, mas que vem buscando algumas iniciativas para se tornar mais inclusiva.
Além das pistas e dos pilotos, a F1 conta com um enorme trabalho de engenharia, mecânica e com equipes numerosas para que tudo funcione. Ainda sim, não há uma quantidade relevante de mulheres atuando no automobilismo.
Um dos poucos exemplos representativos de gênero atualmente, e talvez o de maior destaque, é que pela primeira vez a Federação Internacional de Automobilismo (FIA) tem uma mulher em um dos seus cargos de vice-presidência. Trata-se da brasileira Fabiana Ecclestone, que durante 25 anos trabalhou na organização do GP Brasil e agora é responsável por todas as iniciativas da FIA na América do Sul. A executiva tem vasta experiência no automobilismo e foi indicada ao cargo pelo atual presidente da federação. A presença de uma mulher em um cargo de expressão certamente irá agregar muito no ponto de inclusão de mulheres no esporte. Fabiana é casada com Bernie Ecclestone, uma lenda da F1 e responsável pela categoria nos últimos 40 anos.
Em 2012, tivemos também pela primeira vez uma mulher a chefiar uma escuderia: a indiana Monisha Kaltenborn assumiu a Sauber. No ano seguinte, Claire Williams, filha de Frank Williams, assumiu o comando da escuderia da família, mas com futuro pouco promissor, já que a equipe enfrentava problemas financeiros. Em 2020, ela saiu da F1.
Já nas pistas, desde o início da F1, foram 5 pilotas no total a assumirem um cockpit. As aparições femininas marcaram a história, mas contabilizaram poucos resultados expressivos: 1 vitória de Desiré Wilson, em 1980, e Lella Lombardi, que foi a única a pontuar na competição. Não há nenhuma mulher pilota desde 1992.
E não é de hoje que a F1 busca incluir as mulheres no esporte. Em 2019 foi criada a W Series, categoria de corridas exclusivamente feminina, mas que no ano passado se viu obrigada a suspender as três últimas corridas do calendário e encerrar o torneio antes do prazo por problemas financeiros. O motivo? Um patrocinador previsto para viabilizar as etapas desistiu do negócio. A ideia era retomar o circuito em 2023, mas sem patrocínios e com uma dívida milionária junto a F1, foi obrigada a entrar em processo de falência.
Para suprir o buraco deixado pela W Series, a F1 lançou esse ano a F1 Academy, sob sanção da FIA. A categoria, que visa a formação de pilotas, conta com 21 corridas em seu calendário e tem objetivos ambiciosos, como o de fazer parte da de uma rodada da F1, correndo no mesmo final de semana da categoria.
Mesmo com essas iniciativas, em cada 100 pilotos de automobilismo, apenas 7 são mulheres. Uma representatividade baixíssima, revelada pelas dificuldades que elas encontram: falta de programas específicos para iniciantes no esporte, falta de perspectiva na carreira e principalmente a ausência de patrocínios. A falta de visibilidade para essas iniciativas também é um impeditivo para a ascensão de mulheres. Quantos de vocês sabiam da existência dessas categorias femininas? Sem transmissão e sem visibilidade na mídia, as verbas de patrocínio não chegam.
Uma pesquisa recente da More Than Equal, entidade fundada pelo ex-piloto David Coulthard e que busca a igualdade no automobilismo, mostrou que a modalidade vem ganhando um público mais feminino e engajado. Hoje, a F1 calcula que as mulheres representam em torno de 40% dos fãs da categoria. A pesquisa também mostrou que elas começaram a acompanhar o esporte nos últimos 5 anos, são mais jovens (em média, têm 10 anos a menos) que os fãs homens, e são 70% mais propensas a se engajarem nas mídias sociais para discutir sobre o esporte que acompanham. E, mais: 56% delas disseram que estariam mais propensas a consumir produtos de marcas que demonstram apoio à presença feminina no esporte. E, mesmo assim, a representatividade feminina ainda é baixíssima na modalidade.
Em declaração recente, Craig Pollock, ex-chefe da equipe BAR, declarou que há 4 anos idealiza uma equipe de F1 com 50% de funcionárias mulheres. A ideia é que elas possam ser mais presentes na categoria e em altos níveis. Hoje, ele diz ser extremamente difícil chegar a esse patamar em uma equipe já existente, e a saída seria a criação de uma nova. A ideia é que o time seja criado em 2026 e batizado de “Formula Equal”. A questão é: será que a escuderia poderá contar com investimentos e patrocínios para se sustentar? Pois a visibilidade virá, já que estará inserida no maior expoente do automobilismo.
A carreira de mulheres no automobilismo infelizmente segue a mesma máxima de tantos outros esportes, mesmo sendo a mais propensa a ser igualitária. A falta de patrocínios e investimentos consistentes em programas de treinamento e acesso ao esporte tira os incentivos às mulheres que querem seguir nessa carreira. No caso do automobilismo, é ainda mais grave – é um esporte caro, que exige investimento pesado em equipamentos e treinamentos. Uma realidade muito difícil de ser mudada no curto prazo, a menos que a sociedade e patrocinadores se engajem nessa transformação do automobilismo.
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