Jacqueline Conrado: por mais mulheres na cabine de comando
A Country Manager da United Airlines é uma das primeiras e únicas executivas de companhias aéreas que operam no Brasil
Jacqueline Conrado: por mais mulheres na cabine de comando
BuscarA Country Manager da United Airlines é uma das primeiras e únicas executivas de companhias aéreas que operam no Brasil
Michelle Borborema
20 de fevereiro de 2024 - 19h21
Jacqueline Conrado é pioneira por onde passa. Nascida em uma família de trabalhadores, fez parte da primeira geração a fazer universidade. Hoje, é uma das primeiras e únicas executivas entre as companhias aéreas que operam no Brasil. Para a Country Manager da United Airlines no país, o motivo dos feitos é simples: muito incentivo e educação de seu pai, ex-metalúrgico, e sua mãe, dona de casa.
“Meus pais tinham uma visão que fez toda a diferença em nossa vida. Eles diziam que, para ter conquistas, a principal ferramenta é a educação. Minha irmã e eu também fomos muito incentivadas a sermos independentes, e vejo que isso foi essencial.”
Ela lembra, ainda, que persistir nunca foi uma questão: “Vi barreiras depois, ao longo da vida, mas sabia que podia ir atrás do que quisesse”. Talvez por isso a inovação lhe caia tão bem, mesmo em um setor conservador como o da aviação. Hoje, a United Airlines tem o maior plano de crescimento da história da companhia. Recentemente, comprou 800 aeronaves, estabeleceu novas metas de negócio e, com isso, diferentes objetivos de cultura e pessoas.
“A pandemia trouxe muitas dores, mas provocou uma crise existencial importante no setor. Da nossa parte, pensamos na empresa que gostaríamos de ser dali para frente. Com essa compra de aeronaves, por exemplo, precisamos de mais pessoas para pilotá-las. O perfil mais comum de pilotos é o homem com carreira militar ou aporte financeiro, sobretudo nos Estados Unidos. Então enxergamos essa aquisição como uma oportunidade de diversificar o perfil de pilotos”, conta.
A United Airlines foi a primeira companhia a criar a própria escola de pilotos nos Estados Unidos, e tem uma meta especial: 50% dos matriculados devem ser mulheres de diferentes etnias. Jacqueline diz que, se você muda a estrutura de quem pilota o avião, muda todo o setor, que ainda carrega a reputação de empregar mulheres apenas em postos de comissárias.
“Quando falamos de profissões na área de aviação, você pode ser comissário, que é uma oportunidade de trabalho incrível, mas também pode trabalhar na manutenção, no financeiro, na rampa ou na área de tecnologia. Pode, inclusive, ser uma executiva do segmento”, avalia.
O número de mulheres CEOs de empresas de aviação no mundo aumentou nos últimos anos, mas está longe da metade. Apenas 8% dos executivos das 100 maiores companhias aéreas do mundo são mulheres, de acordo com levantamento do instituto Women of Aviation. Segundo a executiva, esta é uma batalha estrutural que ainda precisa ser travada por ela, dentro e fora da United.
“A maioria de nós, mulheres, não fomos ensinadas a correr risco e ousar. Então naturalmente somos mais direcionadas a profissões ou atividades do cuidado. Mas acredito que isso tem a ver com referências, porque não podemos ser aquilo que não vemos. Se vejo uma mulher sendo pilota na rotina dela, por exemplo, consigo enxergar que posso ser também. Precisamos mostrar que é possível. Sou embaixadora disso.”
A executiva paulista gosta de manter suas origens. Criada no bairro do Sacomã, entre o Ipiranga e São Bernardo, na capital paulista, ela cresceu em uma família muito unida. Até hoje, ela mora em um bairro da mesma região. Depois, ainda aos 16 anos, ela ingressou no estágio por necessidade, realidade comum de muitos jovens brasileiros. Era um instituto de treinamento, parte de uma rede global, onde ficou por 6 anos.
“Meus pais acreditavam nisso, então meus irmãos e eu seguimos esse caminho, com o objetivo de ter independência financeira, bancar uma boa educação e aprender a desenvolver responsabilidades. Comecei a trabalhar cedo, porém, é o que acontece para a maioria dos jovens brasileiros. Faço parte dessa estatística. Para mim, foi importante, embora tenha sido desafiador, porque ainda estava no Ensino Médio. Mas não mudaria isso na minha história.”
Segundo ela, o estágio trouxe uma visão global do mercado importante para sua carreira, além de habilidades como inglês e interação com profissionais de outros países.
Depois, foi a vez da universidade. Jacqueline queria trabalhar com rádio e TV, pois adorava a indústria do entretenimento, mas optou por publicidade após uma conversa com a irmã. “Ela disse que era mais abrangente, porque também aprenderia outras coisas. Foi a decisão mais acertada que já tive. Ampliei minhas possibilidades para o futuro e, quando entrei em contato com o marketing, me apaixonei.”
Quando a executiva se formou, logo mirou a construção de sua carreira na área de marketing de grandes empresas. Foi aí que ingressou no mercado de aviação, na Gol Linhas Aéreas, mas não sem atuar em outros segmentos. Em 22 anos de carreira, ela passou pelos setores de varejo, energia, bens de consumo e até pela MRM Brasil, agência de transformação digital do McCann Worldgroup.
Além da necessidade de ampliar a diversidade no setor de aviação, Jacqueline enxerga ainda muitos caminhos a serem desbravados, embora avanços tenham sido feitos.
“Nos últimos 15 anos, o mercado brasileiro de aviação está mudando muito. Quando entrei na Gol, em 2008, a empresa estava se transformando bastante e cresceu rápido. O desafio era expandir a companhia, inclusive nos mercados internacionais, como a América do Sul. Trabalhei muito nessa expansão. Foi muito bacana atuar no amadurecimento da empresa.”
Entre 2008 e 2013, a executiva esteve na Gol em dois momentos diferentes, quando participou de uma grande transformação da indústria de aviação. As companhias internacionais americanas estavam investindo no mercado brasileiro, pois viam a América Latina como grande foco de crescimento do setor. Ao mesmo tempo, as empresas locais tinham um projeto de nova classe média diante do grande crescimento da economia brasileira, e as companhias aéreas buscavam ser as escolhidas por quem voava pela primeira vez. A Gol foi uma delas, e trabalhou em uma estratégia de posicionamento para aquele novo perfil de cliente.
“Foi um dos projetos mais legais em que trabalhei. Foi interessante ver a transição dos brasileiros com o crescimento econômico, de deixar de viajar de ônibus para viajar de avião. São universos muito diferentes, então tínhamos uma missão ali que envolvia todas as áreas da empresa.”
Mais uma vez, o que encantava Jacqueline, lembra, era estar à frente da transformação do setor. “O desafio que ele trazia naquela época era algo que me motivava. É um combustível muito bacana para mim: fazer o mercado de aviação crescer de um lado, e fazer com que mais pessoas tenham a oportunidade de voar, do outro.”
Jacqueline encara os próximos anos do setor de aviação como promissor, apesar das consequências negativas da pandemia. “O segmento foi bastante afetado, mas o principal desafio ainda é inovar e renovar, com foco na experiência do cliente. Acho que esse tem sido meu grande objetivo na United: como inovamos o business e quebramos o status quo de maneira que faça sentido para o negócio e seja relevante para o cliente? É isso que quero fazer. Gosto de desafiar o status quo mesmo.”
A executiva também quer desbravar mais a atuação em sustentabilidade, visto que o setor de aviação comercial é responsável por mais de 2% das emissões globais de gás carbônico. “Nossa visão é nos tornar mais sustentáveis. Estamos estruturando nosso negócio a partir disso, e é um grande investimento. Não temos um pilar separado de sustentabilidade, porque ela é nossa base. Não é só comprar SAF [Sustainable Aviation Fuel, o combustível sustentável de aviação], mas mobilizar toda a companhia a partir disso, em grandes e pequenas ações.”
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