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As marcas estão prontas para falar com as mulheres 50+?

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As marcas estão prontas para falar com as mulheres 50+?

O público feminino maduro não se sente representado pela publicidade e, quando aparece, é retratado de maneira estereotipada


17 de dezembro de 2024 - 12h30

A pirâmide etária no Brasil está passando por uma transformação significativa. Uma mudança que levou aproximadamente 145 anos para acontecer na França está ocorrendo em menos de 20 anos aqui. O país europeu levou mais de uma centena de anos para dobrar sua população de idosos de 10% para 20%. O Brasil fará essa transição em 19 anos, de 2011 para 2030, de acordo com estudo da FDC Longevidade.  

Essa transição traz desafios e oportunidades, obrigando a sociedade a rever comportamentos e mentalidades que perpetuam a ideia de uma juventude idealizada como símbolo de beleza, sucesso e progresso. Hoje, o envelhecimento da população não apenas redefine a dinâmica social, mas também impacta diretamente o consumo e o mercado de trabalho, exigindo novas abordagens para lidar com uma realidade que já está presente e que se intensificará nos próximos anos. 

“Hoje, a população com 50 anos ou mais movimenta cerca de 2 trilhões de reais na economia prateada no Brasil, e esse valor deve dobrar nos próximos anos”, afirma Cléa Klouri, sócia co-fundadora do Data8, empresa de pesquisa com foco na população 50+. Apesar deste potencial de consumo, as pessoas maduras não se sentem representadas pela mídia.  

“Em nossa pesquisa, mais de 70% dos entrevistados disseram que se sentem invisíveis para a publicidade e, quando se veem retratados, é de maneira equivocada”, reforça Rita Almeida, head de estratégia na AlmapBBDO, que também estuda o assunto. Segundo as especialistas, o retrato das pessoas maduras frequentemente cai em estereótipos, ou de situações de fragilidade ou refletindo uma ideia do “maduro jovem”, mostrando alguém de 60 que parece mais jovem. 

Em outra pesquisa, encomendada pela Nestlé em parceria com a Box1824, 9 em cada 10 pessoas com mais de 60 anos relatam viver uma nova maturidade em relação aos seus pais. Segundo o estudo, esse público nasceu em uma época em que a expectativa de vida era de apenas 47 anos e que atingir a maturidade não era algo tangível para sua realidade. 

A mulher madura

Isso é ainda mais frequente no retrato das mulheres dessa faixa etária. “O homem grisalho é mais valorizado. Já a mulher ainda está muito presa aos padrões da juventude e, por isso, é frequentemente retratada de forma diferente”, destaca Cléa. Na opinião das especialistas, falta autenticidade na comunicação das pessoas maduras. 

O Grupo Boticário, por exemplo, realizou recentemente uma campanha chamada “Seu Auge é Hoje”, que começou no TikTok, com influenciadoras 45+ para falar sobre a diversidade etária e a importância de combater o etarismo. A campanha integra o movimento Pacto Prateado, que reúne iniciativas antietaristas da marca. “Nossas campanhas com esse tema têm o objetivo de romper estigmas sobre o envelhecimento e ampliar a visibilidade da população em geral e das que representam essa faixa etária, incentivando uma visão mais inclusiva, especialmente no mercado de beleza”, afirma Renata Gomide, VP de marketing do grupo. 

No lançamento da campanha, a marca fez uma ação especial na novela Mania de Você, da TV Globo. Em uma das cenas, a personagem interpretada por Eliane Giardini trouxe à tona os sintomas do climatério e a invisibilidade que as mulheres 45+ enfrentam. Como parte do Pacto Prateado, o grupo lançou uma série de ações que incluem trilhas de conteúdo sobre etarismo para o público interno, externo e lideranças, capacitação para mulheres 45+, vagas afirmativas, uma linha de produtos voltados para mulheres em climatério e menopausa, entre outras ações. 

Mercado em potencial

Essa falta de representatividade desse público promove impactos importantes, afinal, com a inversão da pirâmide em curso, as marcas perdem a oportunidade de se conectar com essa parcela de pessoas, que têm alto potencial de consumo. São consumidores com uma renda salarial acima da média da população. Muitos são a principal fonte de renda da família.  

Renata Gomide, VP de marketing do Grupo Boticário (Crédito: Divulgação)

“É urgente que as marcas comecem a falar com esse público, que tem o dinheiro e é responsável por uma grande parte do mercado. Eles estão comprando viagens, fazendo reformas, alugando imóveis e têm um estilo de vida muito ativo, que, geralmente, não é refletido na comunicação ou nas ações das marcas”, reflete Rita. 

Uma campanha recente do Bradesco Seguros propõe essa reflexão. Ela mostra um casal maduro em que a esposa conta uma história sobre o marido dedicando um gol a ela numa partida de futebol que aconteceu na semana anterior. 

Outra campanha do Bradesco Empresas e Negócios, com foco em pessoas jurídicas ,retrata uma empreendedora de 50+ na área de perfumaria. “Pensando no público de mulheres 50+, especificamente, buscamos dar visibilidade para essa protagonista por meio de suas decisões financeiras, seja na vida pessoal ou do negócio”, afirma José Mauricio Lilla, head de comunicação do Bradesco.

Diversidade etária

Para se comunicar com essa população, as marcas precisam se aprofundar em seus interesses, cotidiano e valores. Um ponto destacado pelas especialistas é a intergeracionalidade: “Elas querem sentir que fazem parte da vida, que convivem com diferentes gerações e podem se relacionar com elas”, afirma Rita. 

Outro ponto é entender que existe diversidade dentro da população madura. “Há pessoas que gostam de estar mais ativas, viajar, sair. Outras preferem um ritmo mais tranquilo. Precisamos refletir essa diversidade, como ela realmente acontece. E, para isso, é só olhar ao redor”, destaca Cléa. Além disso, com o aumento da expectativa de vida, as marcas também precisam entender que pessoas de 60 anos são diferentes das com 80 anos.  

Cléa Klouri, sócia co-fundadora do Data8 (Crédito: Divulgação)

“Outra coisa muito interessante é ver pessoas com mais de 80 anos com uma verdadeira pulsão de vida. Elas continuam trabalhando, saindo, mantendo amigos e fazendo muitas coisas”, reflete Rita. As mulheres passam por transformações importantes nesse período, já que costumam viver mais do que os homens. “Em todos os países, a diferença é de 5 até 7 anos. Então, está havendo um impulso para que as mulheres se cuidem mais ao longo do tempo”, complementa. 

Pessoas desejantes

O primeiro passo para uma comunicação mais assertiva é evitar os estereótipos relacionados às pessoas maduras, principalmente o da fragilidade, do “analfabeto digital” e do “super idoso”. “Uma questão importante é que as marcas costumam focar muito na vulnerabilidade do público mais velho, destacando suas necessidades, em vez de ressaltar suas forças e desejos”, destaca Rita. 

Segundo a pesquisa de Almeida, as pessoas maduras seguem ativas: “Essa galera está super ativa: indo para a academia, viajando com os amigos, saindo ou até mesmo trabalhando”. Em segundo lugar, é preciso mudar essa perspectiva de pessoas “necessitantes” para pessoas “desejantes”.  

Rita Almeida, head de estratégia na AlmapBBDO (Crédito: Divulgação)

A publicitária ressalta os quatro capitais da longevidade do médico especialista em envelhecimento Alexandre Kalache para começar a entender do tema. O primeiro é o capital físico, que envolve o corpo, a mente e o espírito. O segundo é o capital financeiro. O terceiro é o capital social, que envolve manter relações e se conectar com outras pessoas. E, por fim, o capital do conhecimento. 

Essa visão está relacionada à pesquisa de Rita, que encontrou as 10 forças das pessoas maduras, que incluem a pulsão de vida, a coragem, consciência do tempo, simplicidade, intergeracionalidade, a capacidade de contar histórias, de reinvenção e o desejo de deixar um legado para as pessoas ao seu redor. 

A Nestlé, por exemplo, mantém uma comunicação com foco pró-idade, como afirma Lara Miranda, head de marketing da Nestlé Health Science. “A campanha “O que você quer ser quando envelhecer”, da Nutren Senior, mostra a importância das escolhas diárias para um envelhecimento saudável e ativo, retratando esse público nos momentos que mais valorizam: curtindo a família, praticando esportes, jantando com amigos”, conta a head. 

 

Com esse propósito, a marca realizou uma série de ações que reforçam esse compromisso. Alguns exemplos são o videocast “Conexão Pró-idade”, de Nutren Senior, que discute temas sobre envelhecimento saudável, e o Guia Pró-Idade, um material digital gratuito criado para promover um novo olhar sobre o envelhecimento. 

“Nossa meta é dupla: ser um agente transformador da sociedade ao promover uma identificação positiva do público 50+, mostrando que valorizamos suas experiências e perspectivas, bem como destacar a importância da inclusão geracional”, afirma Lara Miranda.  

Mudança de narrativa e ação

A publicidade entra nesta discussão sendo um dos veículos para modificar as narrativas contadas sobre essas pessoas. “A publicidade tem um papel-chave, pois, ao incluir as pessoas maduras em sua comunicação e retratar o envelhecimento de maneira mais natural, orgânica e autêntica, as marcas podem ajudar a quebrar estigmas do etarismo”, defende Cléa. 

A mudança precisa começar dentro das agências, que sempre foram um ambiente predominantemente jovem. De acordo com o Observatório da Diversidade da Propaganda (ODP), apenas 6% das pessoas que trabalham em agências têm 50 anos ou mais. “Tanto nas agências quanto nas marcas, a maioria das pessoas é jovem. É difícil fazer com que essas pessoas, que têm medo de envelhecer e um olhar preconceituoso sobre o envelhecimento, criem uma comunicação adequada”, provoca Rita Almeida. 

Lara Miranda, head de marketing da Nestlé Health Science (Crédito: Divulgação)

Para Cléa Klouri, as marcas precisam ouvir essa população, entendendo seus comportamentos, necessidades e desafios. “Ouvir, pesquisar, entender e conhecer para que o que eu for desenvolver, tanto em planejamento quanto em comunicação, seja realmente mais assertivo”, afirma. 

É o momento de aprender e colocar essa população como protagonista, inclusive nos bastidores de criação das campanhas. “Sempre que alguém me pergunta como falar com o público mais velho, eu digo: contrate pessoas dessa faixa etária. Só elas conseguem entender a sutileza do que é ter 60, 70 ou 80 anos”, complementa Rita. 

A transformação da pirâmide etária no Brasil evidencia a urgência de repensar estereótipos e ampliar a representatividade das pessoas maduras na sociedade e no mercado. Esse público, especialmente as mulheres 45+, é protagonista de uma nova maturidade, marcada por vitalidade, independência financeira e aspirações que transcendem padrões ultrapassados. Para além da publicidade, é necessário fomentar um diálogo intergeracional, capacitar profissionais mais velhos e criar produtos e serviços que reflitam a diversidade de interesses dessa população.  

O envelhecimento no Brasil não é apenas uma estatística, mas uma realidade que demanda a revisão de nossas percepções sobre a passagem do tempo e o que significa envelhecer nos dias de hoje. 

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