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MrBeast e os programas de TV dos anos 1990

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Opinião

MrBeast e os programas de TV dos anos 1990

No fim das contas, o que engaja o público permanece o mesmo: desafios grandiosos, recompensas milionárias e narrativas emocionantes


8 de abril de 2025 - 9h13

Jimmy Donaldson, a pessoa por trás do fenômeno MrBeast (Crédito: Reprodução/Instagram)

Nos últimos meses, fiquei hiper focada em Jimmy Donaldson, a pessoa por trás do fenômeno MrBeast. Acompanho o canal há anos, mas nunca tinha sido assídua até que, em outubro de 2024, assisti a uma entrevista onde Jimmy falava sobre sua maior paixão: o YouTube. Como estou planejando entrar na plataforma, tive a certeza de que precisava beber dessa fonte. Passei a observar a pessoa, e não apenas o personagem. Notei que, em suas entrevistas, é possível traçar um perfil solitário, de alguém que, quando menino, queria mudar a vida da mãe e que, desde os 12 anos, viu no YouTube uma oportunidade que ele mesmo descreve também como uma obsessão.

Seu comprometimento absoluto com a produção de conteúdo para a plataforma é sem precedentes. Sua visão analítica, orientada por volumes absurdos de dados, e sua evolução como criador são impressionantes. No entanto, ao analisar sua trajetória e formato de vídeos, percebi que Jimmy atualizou uma linguagem que a sociedade já conhecia, mas ainda não era aplicada ao YouTube. Sua estratégia de engajamento não difere essencialmente do que já era feito na televisão brasileira e mundial desde os anos 1990. Considero Jimmy uma versão melhorada: ele entrega experiência e emoção sem a hipersexualização e a exploração apelativa que marcaram a TV daquela época.

Quatro elementos-chave presentes na estratégia:

  1. Criação de desafios grandiosos
  2. Premiações milionárias
  3. Forte apelo emocional
  4. Linguagem extremada e superlativa

Esses elementos estruturam programas de grande audiência há décadas. No Brasil, Silvio Santos comandava o Topa Tudo por Dinheiro, onde participantes realizavam desafios, inclusive físicos, como os que Jimmy promove. Seu bordão, “Quem quer dinheiro?”, resumia a essência do programa: a esperança de um ganho inesperado. Essa lógica é exatamente a mesma que MrBeast aplica ao distribuir prêmios milionários em seus vídeos.

Outros programas também seguem essa fórmula. O Fort Boyard, game show francês de 1990, desafiava participantes com provas físicas e mentais em busca de recompensas. No Brasil, atrações como Olimpíadas do Faustão, No Limite e Big Brother Brasil criaram desafios e prêmios de alto valor para manter o público engajado. Jimmy compreendeu essa necessidade humana e levou isso para o YouTube, mas com uma diferença: menos roteiro e mais vida real. Assim, mesmo postando em média apenas um vídeo por mês, ele alcança entre 150 e 200 milhões de views por vídeo.

Beast Games e os US$ 10 Milhões

MrBeast consolidou sua marca por meio da distribuição massiva de dinheiro e bens, algo que também já era explorado na TV aberta. No Brasil, o Caminhão do Faustão (1989) promovia sorteios de eletrodomésticos e prêmios”. De forma semelhante, o Paraquedas Premiado do Domingo Legal fazia o público passar horas atentos ao céu, esperando que um prêmio caísse diretamente para eles. Em todos esses casos, a ideia de surpresa e distribuição inesperada de riqueza estava presente — exatamente como nos vídeos de MrBeast.

O assistencialismo televisivo também encontra paralelo no trabalho do YouTuber. O Portas da Esperança, de Silvio Santos, realizava desejos de participantes apenas se houvesse patrocinadores interessados. O Hora do Faro segue uma lógica parecida, criando histórias emocionantes para doar prêmios, assim como diversos quadros apresentados por Luciano Huck, como o Familhão, que mensalmente premia uma família com R$ 1 milhão. MrBeast adota a mesma estrutura narrativa, transformando doações milionárias em grandes histórias emocionantes que capturam a audiência.

Em 2024, MrBeast lançou The Beast Games, reunindo mil pessoas para competirem por US$ 5 milhões, o maior prêmio da história do entretenimento. O contrato com a Amazon foi de US$ 100 milhões para a primeira temporada, mas, por ser megalomaníaco, Jimmy ultrapassou o orçamento. Em algumas entrevistas, ele revela que um episódio custou cerca de US$ 40 milhões para produzir.

A infraestrutura por trás é absurda: selecionar 2 mil pessoas, eliminar mil, construir uma cidade para os participantes, providenciar alojamento, alimentação e câmeras individuais. Para se ter ideia, na primeira semana, foram gravadas 24 mil horas de conteúdo diariamente. Para no final, no coin flip, o prêmio dobrar e o valor extra sair do bolso do próprio Jimmy, pois não estava no contrato com a Prime.

Vejo que MrBeast está mais próximo do plimplim do que ele imagina. Ele conseguiu fazer algo que a TV tradicional está pensando em fazer: se adaptar. Desde jovem, ele observa e trabalha com base em dados. Seu sucesso também se deve ao profundo conhecimento do algoritmo do YouTube, otimizando thumbnails chamativas, retenção de público e títulos irresistíveis.

Além disso, ele reinveste massivamente na produção, elevando a qualidade e o impacto de seus vídeos, muitos dos quais custam milhões de dólares. Sua estratégia de expansão global inclui dublagem em vários idiomas, criação de negócios próprios como Feastables e MrBeast Burger, além de canais secundários como Beast Reacts e MrBeast Gaming, ampliando ainda mais seu alcance.

Nada disso é fruto do acaso, mas sim da combinação de estratégia, inovação e um olhar afiado para o que sempre funcionou no entretenimento. Ele não reinventou a roda, mas soube adaptá-la a uma nova era digital, utilizando dados, experimentação e uma entrega autêntica que ressoa com milhões de pessoas.

No fim das contas, o que engaja o público permanece o mesmo: desafios grandiosos, recompensas milionárias e narrativas emocionantes. A diferença é que, enquanto a televisão luta para se reinventar, Jimmy Donaldson já está moldando o futuro do entretenimento global.

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