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Como as mulheres estão moldando o mercado dos games 

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Como as mulheres estão moldando o mercado dos games 

Lideranças femininas de diferentes players falam sobre suas trajetórias profissionais na indústria


13 de dezembro de 2024 - 9h23

A indústria de games cresce a cada ano. De acordo com a Pesquisa Game Brasil de 2024, 73,9% dos brasileiros jogam algum jogo eletrônico, sendo que 50,9% dos jogadores são mulheres. Em dez anos, essa indústria cresceu 594%, saindo de cerca de 150 empresas desenvolvedoras de games para 1042.  

Apesar de ser uma indústria ainda percebida como um espaço masculino, as mulheres tiveram e têm um papel importante para o desenvolvimento do mercado brasileiro. Algumas foram responsáveis por trazer jogos importantes para o Brasil, outras estão mudando a cara das competições de e-Sports. Nos bastidores, elas são personagens importantes dessa história. 

Bruna Soares, por exemplo, hoje é diretora global de parcerias na Ubisoft, publisher francesa dona de franquias como Assassin’s Creed e Just Dance. Sua paixão pelos games começou ainda na infância, como muitos que acabam entrando nessa indústria. Seu primeiro contato foi quando trabalhava como estagiária numa assessoria de imprensa que atendia a PlayStation. Apesar de não ser responsável pelo cliente, Bruna cobriu uma colega que entrou de férias e, justamente neste curto período, houve um ataque hacker às contas do PlayStation. 

Bruna Soares é diretora global de parcerias na Ubisoft (Crédito: Divulgação)

“Depois dessa experiência, comecei a refletir: eu era uma criança jogadora de videogame e, apesar de ter me afastado por causa dos estudos, ainda gostava muito disso. Foi quando me apaixonei novamente pela área e continuei trabalhando com a conta de PlayStation”, lembra. Após a assessoria, Bruna trabalhou na área de trade marketing da NC Games, distribuidora na qual teve seu primeiro contato com a Ubisoft. Um ano depois, ela entrou na Ubisoft, onde segue há 12 anos.  

“Comecei cuidando dos eventos de Just Dance, um dos principais jogos da Ubisoft, e ao longo dos anos fui mudando de posição, sempre abraçando novos desafios. Depois, cuidei de eventos como a Brasil Game Show, não apenas para o Brasil, mas também para a América Latina. Fui responsável por parcerias Latam e, há dois anos e meio, assumi o cargo de diretora global de Brand Partnerships”, conta Bruna Soares. 

Da paixão por games à liderança

Valeria Pantarotto também teve uma trajetória semelhante à Bruna: seu apreço pelos videogames a levou a entrar na indústria logo no início da carreira. Hoje, Valéria é head of business na Level Up Brasil, distribuidora de jogos online e responsável por games como Ragnarok, Perfect World e Grand Chase. Sua trajetória começou ainda na década de 1990, quando entrou para a Tectoy, empresa de equipamentos eletrônicos que era líder de mercado à época. 

Valeria Pantarotto é head of business na Level Up Brasil (Crédito: Divulgação)

“Eu estava na faculdade, cursando administração, e vi um quadro com vagas de estágio. Entre as multinacionais, estava a Tectoy, e eu me empolguei porque sempre gostei de jogar e era fanática por fliperama. Então, me candidatei e passei por várias etapas do processo seletivo. Lembro que, nas dinâmicas de grupo, éramos poucas mulheres – cerca de duas, e o restante a maioria eram homens”, lembra. “Não tinha, à época, a ideia de procurar uma empresa de videogames, mas quando vi aquele anúncio da vaga na Tectoy, pensei: ‘É isso que eu quero fazer!’”. 

Inspiração de lideranças femininas

Na Tectoy, Valeria permaneceu por oito anos, e a presença de lideranças femininas na empresa a inspirou para seguir nesse mercado. “Minha chefe direta e a diretora eram mulheres, o que foi uma grande inspiração. Elas desbravaram esse mundo e mostraram que era possível”, afirma. Depois da Tectoy, Valeria se aventurou num empreendimento próprio: uma confecção de biquínis, onde permaneceu por mais dez anos. 

Eventualmente, ela retornou ao mundo dos games, entrando na Level Up em 2006. De lá para cá, já são 18 anos na empresa. “Comecei como coordenadora de produtos do Ragnarok, que era o maior jogo da Level Up à época. Depois, me deram o cargo de coordenadora de projetos, algo que não existia antes.” 

Valeria foi responsável por grandes iniciativas da Level Up, como o licenciamento da marca Ragnarok, saindo do digital para o físico em camisetas, mochilas e álbum de figurinhas. Outros projetos de mídia que esteve à frente foi a entrada da Coca-Cola com máquinas de venda e de cereais como o Crunch dentro dos jogos Ragnarok e Grand Chase.  

Força B2B

“Em 2016, assumi a liderança da área de distribuição, o braço B2B da empresa, focado em parcerias comerciais. Hoje, sou Head of Business da Level Up, e meu foco é levar os jogos para onde os jogadores estão. Temos mais de 100 parceiros, como Nubank, PicPay, Kabum e Banco do Brasil. O objetivo é que os jogadores possam acessar seus jogos diretamente em suas plataformas, seja no banco, em programas de fidelidade, ou por meio de crédito”, conta Valéria. 

Para outras, o caminho até chegar na indústria dos games não foi tão direto. Roberta Coelho, hoje, é CEO do MIBR, equipe de e-Sports brasileira. Com formação em economia, a profissional começou sua carreira no mercado financeiro. Passou pela indústria de café e metais, empreendeu seu próprio negócio, até que foi convidada a ser CFO do Rock In Rio. “Fiquei no Rock in Rio por 10 anos, onde os primeiros 5 anos foram dedicados à organização da empresa no Brasil, além de expandir para os Estados Unidos, com edições em Las Vegas”, conta Roberta. 

Roberta Coelho é CEO do MIBR (Crédito: Divulgação)

O contato com o mercado de games aconteceu justamente quando estava no Rock In Rio, em 2017, quando assumiu a área de novos negócios do festival e na edição que ocorreu no Parque Olímpico, triplicando o espaço. “Foi nesse período que introduzimos o GameXP, uma área dedicada aos games. O sucesso foi enorme, com filas gigantes para acessar as arenas, e isso nos fez perceber o potencial da indústria. O que começou como um bairro dentro do festival virou um evento próprio no ano seguinte, e, ao longo do tempo, eu acumulei os cargos de CEO da GameXP e diretora de novos negócios do Rock in Rio”, afirma. 

“Foi assim que me apaixonei pelo universo dos games e dos e-Sportes”, reflete. Assim, quando assumiu a chefia da MIBR, Roberta sabia que podia contribuir. “Quando cheguei no MIBR, não tinha tanta familiaridade com o mundo dos jogos, mas percebi que minha experiência em gestão de marcas e experiência do consumidor seria útil para transformar a organização. Fui contratada para trazer essa experiência para o MIBR, que hoje tem 8 times, sendo 3 deles focados em inclusão e gênero feminino, com times femininos e não binários”, celebra. 

Os desafios de ser mulher

Mesmo com experiência para liderar, assumir a posição de uma equipe de e-Sports sendo uma mulher ainda era um movimento um tanto ousado. “Quando anunciamos minha chegada no MIBR, tínhamos duas notas preparadas: uma para explicar por que a organização havia contratado alguém de fora do universo dos games e, outra, mais delicada para os investidores, sobre o fato de o MIBR ter contratado uma mulher. Felizmente, não precisamos usar nenhuma dessas notas”, conta. 

Por ser uma das poucas lideranças femininas de equipes de tier 1, o mais alto nível competitivo, a nível global, Roberta não se sentia muito pertencente àqueles espaços, principalmente em eventos internacionais. Entretanto, com o tempo, trabalho e resultados, a MIBR se tornou uma potência.  

“Após três anos e meio, sinto que minha atuação no MIBR está cada vez mais reconhecida. Quando entrei, muita gente se questionava se eu conseguiria, já que não venho do mundo dos games, mas com o tempo fui mostrando minha capacidade de fazer a organização crescer”, afirma. 

A falta de pertencimento ao universo dos games é um sentimento comum entre as mulheres que entram neste mercado, principalmente por conta do preconceito que sofrem. Uma das maneiras de expressar esse preconceito são os “testes de conhecimento” pelos quais muitas delas acabam passando. “Lembro de algumas reuniões em que o meu interlocutor fazia perguntas sobre o jogo, quase como se fosse um teste para saber se eu realmente jogo videogame”, conta Bruna Soares. 

“Hoje, estou numa posição em que gero negócios, o que significa que não preciso ser uma tester, nem fazer parte do time do estúdio. Sou apaixonada pela indústria e sei o que faço, mas esse tipo de questionamento é desconfortável. Tenho certeza de que um homem não precisaria responder a perguntas como: ‘Você já jogou Assassin’s Creed?’”, pontua. 

Precisa jogar para liderar?

Afinal, nem todo mundo que trabalha nesta indústria se considera um “gamer” ou joga. Mayra Lewi é diretora de vendas digitais para a América Latina de uma grande empresa desenvolvedora de consoles e jogos. Sua carreira na área de vendas digitais começou na Cielo, quando, em 2011, viu um anúncio de uma empresa falando sobre gift cards e a vinda de videogames para o Brasil.  

“Na empresa, só tinha uma pessoa, e como sou muito de fazer tudo, resolvi tentar. Foi assim que entrei na InComm, onde fiquei por 10 anos, aprendendo tudo sobre o mundo dos games, apesar de não ser jogadora”. 

Mayra Lewi é diretora de vendas digitais para a América Latina de uma grande empresa desenvolvedora de consoles e jogos (Crédito: Divulgação)

A InComm é uma empresa de processamento de cartões presente. “Eu era responsável por identificar as melhores empresas de videogame e convencê-las a lançarem seus produtos no Brasil. O foco era oferecer meios de pagamento acessíveis para a população não bancarizada, que, muitas vezes, só podia jogar usando cartões pré-pagos”, conta Mayra. 

Foi nesse período que Mayra teve a oportunidade de conhecer pessoas importantes do mercado de games, como o criador do Minecraft, antes de ter sido comprado pela Microsoft, e o de Roblox. Em 2015, Mayra trouxe o Minecraft para o Brasil, o que a impulsionou a assumir uma vaga na Microsoft em 2020, logo após sua licença-maternidade, e onde permaneceu por dois anos. Mesmo não jogando videogames, Mayra ficou na indústria por seu conhecimento sobre vendas de jogos e gift cards.  

“O fato de eu não jogar é algo que, ao mesmo tempo, me é desconhecido e familiar. Sei vender o produto, então fico feliz comigo mesma por não ter aquele olhar viciado sobre o jogo, mas, ainda assim, conseguir despertar o interesse do consumidor”, reflete Mayra Lewi. “Um dia, estava no Target com meus filhos e mandei uma mensagem para o meu pessoal, dizendo: ‘Pela primeira vez, consegui passar a primeira fase do Mario Wonder’. Isso foi um marco para mim”, conta. 

Coragem e confiança

Para se firmar nesse mercado, essas mulheres dizem que precisam firmar seu posicionamento, defender suas ideias até serem ouvidas e de coragem para enfrentar novos desafios. Esse, segundo Bruna, foi o diferencial que a levou à posição que ocupa hoje.  

“Nunca esperei que alguém viesse até mim e dissesse: ‘Agora você está pronta’. Sempre fui atrás do que queria. Quando vejo algo que acredito que posso desenvolver, vou atrás e sinalizo, sempre com alguém confiando em mim. Esse foi, constantemente, meu foco: ter coragem para cavar novas oportunidades”, afirma Soares. 

Para mulheres que buscam uma oportunidade na área, o conselho de Mayra é se arriscar sem medo. “Precisamos perder o medo de ouvir um ‘não’. Eu já tomei vários ‘nãos’ na vida. O importante é saber como sair da situação e nunca engolir desaforos”, aconselha Lewi. “Acho que, se fosse dar uma dica para mulheres que estão entrando no mercado de games, seria confiar na sua capacidade. Esse mercado ainda tem uma aura masculina, mas, se você é capaz, tem de acreditar nisso”, complementa Roberta Coelho. 

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