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Opinião

Na piscina do prédio

Comecei meu 2023 fazendo homens entenderem que não se toma de graça o espaço de uma mulher. E, de pouco em pouco, a gente muda o mundo


16 de janeiro de 2023 - 0h47

(Crédito:
Thom Milkovic/Unsplash)

2023 nem bem começou e eu já tive meu primeiro enfrentamento de gênero do ano.

E, como diz o título acima, ele não se deu no trabalho. Foi na piscina do prédio, mesmo, que eu fui lembrada que uma mulher sempre precisa, de alguma forma, conquistar (e, às vezes, até delimitar) seu espaço.

E, neste caso, o buraco é mais embaixo: eu estou falando de espaço físico.

Antes de contar “o causo”, um pouco de contexto: fiz de 2021 e 2022 anos de autocuidado – físico e mental. E uma das coisas que eu trouxe de volta para minha vida foi uma rotina de exercícios – o que quem me conhece sabe: é um esforço graaaaaande pra mim.

O único exercício que eu faço feliz – feliz mesmo! – é nadar. A água é um dos meus lugares preferidos (meu signo explica). E eu sou afortunada: moro num prédio que tem piscina.

Usualmente eu nado bem cedinho ou ali pelas 7 da noite. Horários em que a piscina fica vazia, quase toda para mim, e em que eu também não atrapalho a diversão de ninguém.

A exceção são os finais de semana, em que eu quase sempre tenho companhia na água. Nestes, sempre faço a mesma coisa: vou para a margem mais distante das cadeiras da piscina e nado ali, no cantinho – afinal, a piscina é de uso coletivo.

Corta para o primeiro final de semana do ano, eu nadando no meu cantinho. Chegam 3 pais (homens), cada um com um filho (também meninos) e entram na água. O primeiro imediatamente vai para o canto que eu estou ocupando, com o filho junto.

Os outros dois o seguem, e o trio se aboleta ali (deixando uns 80% do espaço da piscina vazio) para conversar. Eu, no meio do caminho, contorno o grupo e chego ao outro lado. “Talvez eles não tenham me visto”, penso.

Mas ,aí, fiz 4 piscinas contornando os ditos cujos. Nada deles se moverem.

Quando um finalmente se mexeu, foi para impedir que eu fizesse o contorno.

E, nesse momento, eu entendi que os adoráveis senhores simplesmente achavam que podiam incomodar a mulher que nadava até ela sair dali (o que, num primeiro momento, eu ia fazer).

Mas não fiz: decidi que neste ano ia ser diferente.

Parei e perguntei para um deles se havia problema em eles irem pra outra margem. Ele, irritado, me respondeu que não, mas seguiu conversando parado. Eu insisti: “será que você pode ir, então? Eu já estava aqui nadando quando vocês chegaram e o outro lado da piscina é irregular, mais difícil pra nadar, mas melhor pra vocês ficarem papeando”.

Eles foram contrariados para a outra margem. Os meninos me olhavam meio incrédulos, como se eu tivesse feito algo que eles nunca tinham visto, e acompanharam os pais. Eu voltei a nadar.

Talvez você ache que este texto é um grande “problema de primeiro mundo”. Talvez ele seja. Mas eu comecei meu 2023 fazendo aqueles três meninos entenderem que não se toma de graça o espaço de uma mulher. E, de pouco em pouco, a gente muda o mundo.

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