Assinar
Publicidade
Opinião

“Não aperte minha mente”

Qual o papel de cada pessoa na promoção da paz neste mundo polarizado e cheio de convicções?


14 de março de 2025 - 6h02

(Crédito: Shutterstock)

Qual o papel de cada pessoa na promoção da paz neste mundo polarizado e cheio de convicções? Promover um diálogo verdadeiro pode ser um caminho promissor, mas antes é preciso desconstruir ou, ao menos, compreender os obstáculos ao diálogo na vida pessoal e nas empresas.  

É verdade que somos seres humanos atravessados pela condição socioeconômica, de gênero, de raça, de hierarquia, entre outras. E que estas condições nos colocam em posição desigual na construção das relações, inclusive de poder. Mas somente no campo das relações interpessoais há a possibilidade da construção do diálogo. Este artigo é um convite à reflexão pessoal sobre nosso comportamento, que é o ponto central para promoção do diálogo. 

Há de se compreender que fatores externos nos tiram muitas vezes do prumo emocional e do domínio de si nas relações, portanto interferem na construção do diálogo. Primeiro, porque vivemos uma agenda global e nacional aflita: a instabilidade econômica, com alta da inflação e flutuação incerta do dólar; o fortalecimento da polarização política aliada a diversos tipos de intolerância, como religiosa, a homofobia e a transfobia; insegurança pública, que nos deixa em estado de alerta o tempo todo; e a crise climática manifestada com eventos extremos mais frequentes. Tudo isto compõe um lado da moeda que precisamos notar e perceber o impacto no nosso comportamento, nas nossas reações e relações que refletem diretamente no nosso modo de vida. 

Outro fator que impacta na ausência do diálogo é o grau de ansiedade que as pessoas vivem. Segundo dados da OMS de 2023, 26,8% da população brasileira sofre de transtorno de ansiedade. Estamos preocupados com o que aconteceu e com o futuro, temos pressa e não conseguimos estar no presente para ouvir (nem a si próprio muitas vezes) nem viver a concentração necessária para a escuta, ainda que por cinco minutos. 

Fazemos reunião presencial olhando pro celular e reunião online com várias telas abertas. Difícil promover o diálogo, construir relações saudáveis e encontrar soluções harmoniosas no modo da atenção dissipada. 

Em Salvador, minha cidade natal, com muito orgulho, tem uma frase popular que se diz ao outro quando a cabeça está “quente”: “Não aperte minha mente!”. Eu adoro. É preciso saber perceber quando estamos no limite do razoável e do estresse. Dar uma pausa possibilita construir relações e diálogos que promovam a paz, a harmonia, o consenso e as melhores decisões, seja nas relações pessoais ou nas empresas. 

Há dois anos, participei de um Summit Global, em Oslo, com executivos do Brasil e de vários outros países para debater três temas: sistemas alimentares, transição energética e promoção da paz. Foi um momento de aprendizado e ampliação da forma de pensar.  

Júlio Campos, amigo e executivo do varejo que também participou, teve acesso e compartilhou comigo o livro sobre diálogo, publicado pelo Nobel Peace Center, chamado “Those Who Listen, Change the World”, em português “Aqueles que Escutam Mudam o Mundo”. 

O livro apresenta oito princípios para o diálogo, cada um escrito por uma personalidade laureada com o prêmio Nobel da Paz. Compartilho com vocês, de forma resumida, mas necessária para nossa reflexão, uma vez que são aplicáveis e compatíveis com agestão mais humana, moderna e eficaz. 

1. “O diálogo deve ser uma atitude básica”

Demonstre respeito e empatia. O diálogo deve ser incorporado à forma como tocamos nossa vida;

2. “Crie espaços seguros”

Garanta que todos serão ouvidos, se sintam confortáveis para fazer perguntas e deixe claro sobre o grau de confidencialidade da conversa;

3. “Inclua todas as partes relevantes”

Reflita antes de marcar a conversa se todos que precisam ser ouvidos estarão presentes;

4. “No diálogo, você deve escutar”

Não presuma que já sabe o que o outro dirá. Não interrompa enquanto o outro estiver falando, é desrespeitoso;

5. “Deixe todos compartilharem suas experiências”

Cada um sente e vive de acordo com a sua perspectiva;

6. “Faça perguntas”

As perguntas devem estimular reflexão e curiosidade. Uma boa tática são perguntas abertas. Evitar perguntas que tenham sim ou não como respostas;

7. “Fale sobre os pontos de dificuldades de cada um”

Respeitar o ponto de vista do outro é diferente de concordar, e respeito é um ingrediente mágico de toda relação;

8. “Contribua para compreensão e reconciliação”

Falar a verdade, expressar opinião ou sentimentos e, por fim, sentir-se capaz de renovar ou não uma relação, chegar a um senso comum, acordar os próximos passos de um projeto.  

Não é fácil, mas também não é impossível. O papel de cada um na promoção da paz é primeiramente impactado pelo modo de vida que levamos e como as incertezas e externalidades nos impactam. Notar este impacto, perceber-se e não deixar que “apertem sua mente” é um primeiro passo.  

Uma dose boa de autocuidado ajuda a nos colocarmos no caminho de volta ao equilíbrio emocional.

Por fim, os oito princípios para construção do diálogo são um lembrete de ferramentas eficazes para encontros e conversas que temos cotidianamente serem mais leves, eficientes, conciliatórias e, por que não, curadoras de aflições internas. Vamos juntas construir este diálogo? 

Publicidade

Compartilhe

Veja também

  • As mulheres por trás das agências de marketing de influência

    As mulheres por trás das agências de marketing de influência

    As lideranças femininas das maiores agências de influenciadores do Brasil falam sobre o crescimento do mercado e seus desafios

  • 75% das lideranças femininas já viram ideias de mulheres serem descartadas no Brasil

    75% das lideranças femininas já viram ideias de mulheres serem descartadas no Brasil

    Nova pesquisa da Fesa Group no Brasil indica principais razões para os projetos liderados por mulheres não irem para frente