Onde a gente se encontra?
O diálogo não existe só para corrigir os grandes e pequenos conflitos, mas para que possamos construir conhecimento e entendimento
O diálogo não existe só para corrigir os grandes e pequenos conflitos, mas para que possamos construir conhecimento e entendimento
26 de fevereiro de 2025 - 11h57
(Crédito: Shutterstock)
Estudos de fontes confiáveis, em diferentes países do mundo, trazem a informação de que na geração Z (jovens de 15 a 30 anos) há um movimento em que as mulheres tendem a ter uma ideologia mais progressista, enquanto os jovens da mesma geração são mais conservadores.
Esse é um fenômeno global: o Financial Times (Reino Unido) mostrou que mulheres entre 18 e 30 anos são 25% mais progressistas do que os homens. Na Alemanha e USA, chega a 30%. Outra pesquisa americana, feita pela Change Research, apontou que 58% das mulheres entre 18 e 30 anos se declararam progressistas em comparação aos 37% dos homens.
No Brasil, um estudo da Genial/Quaest, divulgado em março de 2024 pela revista Carta Capital, revelou que, de maneira geral, as mulheres brasileiras até 60 anos são menos conservadoras do que os homens. Especificamente entre as mulheres da geração Z, o progressismo supera o conservadorismo, especialmente em pautas como feminismo, desigualdade de gênero, legalização do aborto, cotas raciais e questões climáticas.
Existe todo um contexto cultural que reforça esse desencontro ideológico, mas o que está no centro é o fortalecimento da quarta onda do feminismo, a partir do início do século 21. Em 2006, o movimento americano “Me Too”, de combate ao assédio e abuso sexual e moral contra as mulheres, teve impacto mundial. No Brasil, seguiram-se os movimentos #meuprimeiroassédio e #chegadefiufiu, por volta de 2015.
Os meninos, por sua vez, reconhecem que uma grande transformação está acontecendo, mas sentem falta de modelos: não podem reproduzir o comportamento dos pais e dos tios ao mesmo tempo em que não conseguem se relacionar com o movimento feminista de forma saudável. O resultado, segundo Nina Lemos, jornalista e escritora, é que muito cedo (já na adolescência), os meninos sentem um forte desconforto em relação ao seu papel no mundo. É comum terem as meninas apontando o dedo para eles e mencionando expressões como “macho tóxico”, o que os estimulam a se posicionarem na contramão do feminismo.
Para Jessica Nakamura, jornalista da DW.Brasil, esse desencontro ideológico foi amplamente potencializado pelas redes sociais. As diferenças de gênero e o feminismo ganharam popularidade especialmente através do TikTok, uma plataforma que facilita a criação de conteúdo e a personalização máxima de seus algoritmos. Isso possibilita que cada um fique dentro da sua bolha e fortaleça suas crenças, sem ouvir outros lados ou dialogar sobre suas posições.
Pensando um pouco à frente, eu me pergunto: Como e onde os jovens da geração Z vão se encontrar?
O diálogo é apontado como a melhor forma de reduzir a polarização ideológica. Qualquer polarização grita por uma conversa porque permite que diferentes perspectivas sejam ouvidas, compreendidas e respeitadas, sem cair em dogmatismos ou hostilidades.
A esse respeito, podemos lembrar Sócrates e o seu “diálogo socrático”, que partia do princípio de que a construção do conhecimento é muito mais efetiva do que a mera transmissão de ideias. Por isso, o aprendizado a partir do diálogo.
Somente sabendo perguntar e escutar, caminhamos para uma compreensão clara e fundamental do assunto discutido. Por isso, para Sócrates, o diálogo era o método mais eficiente de ensino e aprendizado, e tem o poder de transformar o ser humano, de melhorá-lo. Sócrates deixa o legado de que somos responsáveis pelo nosso conhecimento, que é sempre implementado pelo diálogo.
O grande educador brasileiro Paulo Freire, como Sócrates, acredita que o diálogo tem o poder transformador da realidade, por isso entende que existem duas dimensões intimamente relacionadas a ele: reflexão e ação. Para ele, o diálogo só pode ser estabelecido quando ação e reflexão se colocam juntas e articuladas, uma reflexão capaz de gerar mudança. O diálogo também tem o potencial de trazer significado para nossas vidas e, assim, se torna um elemento humanizador.
No caso da geração Z, refletir e dialogar seria também o melhor caminho para explorar e diminuir a distância ideológica entre os gêneros. O diálogo seria o caminho para aproximar diferentes realidades e crenças, e promover o reconhecimento de cada “gen Z” em seu semelhante: os jovens da geração Z não são inimigos, apenas pensam diferente. Algo que poderia até ser estimulante para uma geração disposta a falar, escutar, refletir e, quem sabe, mudar, desde que a relação de cooperação e escuta seja priorizada como condutora do diálogo.
Pensando bem, o diálogo seria também uma saída para a guerra de Israel e da Faixa de Gaza. Ou a da Rússia e da Ucrânia. O diálogo ainda seria precioso para neutralizar toda a polarização que vemos hoje no ambiente político, social, familiar e profissional.
Mas o diálogo não existe só para corrigir os grandes e pequenos conflitos. Mais do que tudo, ele existe para que possamos construir conhecimento e entendimento. Vou chegando à conclusão de que o diálogo é algo muito grande e potente. Um iluminador de pensamentos e caminhos. E já que transformar o mundo sempre foi uma capacidade atribuída autenticamente aos jovens da geração Z, eles bem que poderiam começar a revolucionar o mundo, a partir do diálogo.
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