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Blog da Regina

Precisamos falar de menopausa

Invisibilidade de temas ligados ao processo de amadurecimento das mulheres pelas marcas e pela publicidade contribui para a representação estereotipada e preconceituosa


27 de maio de 2022 - 15h07

Na última quarta, a apresentadora Sandra Annenberg, prestes a completar 54 anos, revelou no programa Saia Justa (GNT) que tem sofrido com os incômodos clássicos da menopausa, como fogacho, pele seca e irritação (Crédito: Reprodução/GNT)

Nos últimos dois dias, fui impactada por três conteúdos vindos de lugares diferentes e que falam praticamente sobre o mesmo universo temático: os desafios da menopausa. Como este período da vida da mulher é ignorado pela sociedade, pela economia e, por consequência, pela publicidade (sim, mulheres maduras em geral têm maior poder de consumo), há uma invisibilidade sobre essa fase natural da vida numa cultura jovem-cêntrica e machista. Na última quarta, a apresentadora Sandra Annenberg, prestes a completar 54 anos (no dia 5 de junho), convidada a participar do programa Saia Justa (GNT), revelou que tem sofrido com os incômodos clássicos dessa fase da vida, como fogacho, pele seca e irritação.

“Estou no pico do climatério. São 25 sintomas e você ainda vai ter o seu… Achava que ia passar batida, que isso não ia me pegar, mas está pegando brabo”, admitiu. No bate-papo, Sandra diz ter reparado também que falar sobre a menopausa continua sendo um tabu entre as mulheres. “Não é maravilhoso, não. A mãe fala para a gente da primeira menstruação, da [primeira] transa, quando fala, mas ninguém fala sobre a menopausa. Não é fácil envelhecer, não é gostoso, é sofrido”, contou a apresentadora do programa Globo Repórter.

No dia seguinte, a plataforma SHEt, que traz conteúdos para mulheres que entraram na faixa dos “enta”, fez um post no Instagram no qual reproduziu trecho de uma matéria publicada no Jornal O Globo que trazia a informação de que pesquisadores do Cedar-Sinai Medical Center, nos Estados Unidos, apontam que médicos deveriam prescrever o uso regular de vibradores para suas pacientes mulheres. A equipe médica concluiu que a prática comprovadamente traz benefícios médicos, como melhora na saúde do assoalho pélvico, redução da dor vulvar e melhorias.

Nesta sexta-feira, na página de Opinião da Folha de S. Paulo, coluna da escritora Giovana Madalosso intitulada “Revolução em três velocidades” bradava o que ela chama de Uma Vibratória Revolução, relatando a reação de uma tia sua que foi presenteada por ela com um vibrador: “Ele não ajudava a limpar a casa, a cuidar dos cachorros e, agora percebi, nunca me ajudou a encontrar o prazer. Acabo de descobrir sozinha que o tal ponto fica logo ali, virando a esquina”.

A associação entre menopausa e uso de vibradores já foi confirmada por diversos estudos como o encabeçado pela professora clínica de Ginecologia e Obstetrícia da Universidade de Medicina de Yale nos EUA, Mary Jane Minkin, que comprovou a eficácia do uso desses equipamentos para diminuir sintomas comuns ao climatério. Esse nicho de mercado, no entanto, ainda está restrito às chamadas femtechs. O termo designa as startups voltadas para o desenvolvimento de soluções tecnológicas para a saúde feminina, desde aplicativos de controle de fertilidade, a serviços de monitoramento remoto de gestação e fisioterapias, além de serviços, produtos e equipamentos para o pós-menopausa. Segundo um levantamento da consultoria Emergent Research, o segmento movimentou US$ 18,75 bilhões em 2019 e deve atingir US$ 60 bilhões até 2027 no mundo, crescendo a uma taxa de 15,6% ao ano.

O mercado publicitário, que começa a se abrir para temas como a diversidade, deve urgentemente agregar a essa preocupação imposta pela sociedade a dimensão geracional que impacta diretamente a forma pela qual as mulheres são representadas nas suas campanhas e produtos. No segmento de beleza e cuidados para pele, o prefixo “anti”, nas suas mais variadas versões, está presente em boa parte dos produtos de beleza, o que tem provocado uma série de reflexões sobre o tema. Etimologicamente, “anti” vem do grego αντί e significa “do lado contrário”. Indica oposição a; contra. Algo que não faz muito sentido já que uma das poucas certezas que temos nessa vida é a de que vamos todas envelhecer. Reforçar o preconceito contra a idade, contra o envelhecimento, é um desserviço, especialmente, para as mulheres já tão cobradas e cheias de pressão.

Os números falam por si: de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a quantidade de idosos (faixa considerada acima de 60 anos) chegará a dois bilhões até 2050, o que representará um quinto da população global. No Brasil, esse crescimento é bem significativo. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em uma década, o número de brasileiros com mais de 60 anos aumentou 50%: em 2007, eram 17,4 milhões e, em 2017, pulou para 26 milhões. E dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) apontou que, em 2019, o país já tinha 34 milhões de idosos – ou 16,2% da população. Até 2050, estima-se que a terceira idade represente 30% dos brasileiros e que, em 2060, esse público seja maior do que o de jovens. O mundo está, sim, caminhando a passos largos rumo a um mar prateado.

A última edição do estudo Todxs, que mapeia desde 2015 a forma como gênero e raça são representados na publicidade brasileira, mostra que a participação do público 60+ nas campanhas não evoluiu. Realizada pela ONU Mulheres com o apoio da Heads Propaganda, a pesquisa mostrou que a mulher madura é apresentada, na grande maioria dos comerciais, com o seguinte perfil: 96% brancas, 43% com cabelo branco e 95% de cabelos lisos.

O relatório mostrou ainda que dos 425 anunciantes observados no estudo, o público maduro estava representado apenas em 7%. Além de aumentar a representatividade desse grupo nas campanhas publicitárias, é preciso que ele seja apresentado da forma certa, e não por estereótipos. O que causa estranheza é que as mudanças no perfil dessa faixa etária não aconteceram ontem – o que poderia explicar esse retrato caricato que grande parte do mercado insiste em apresentar.

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