Quais as propostas do W20 para enfrentar a violência de gênero?

Buscar
Publicidade

Women to Watch

Quais as propostas do W20 para enfrentar a violência de gênero?

A líder do tema, Janaína Gama, destaca os assuntos e recomendações que serão levados ao G20 para o combate da violência contra as mulheres 


19 de julho de 2024 - 15h17

O G20, grupo formado pelas 20 maiores economias do mundo, tem entre seus objetivos a promoção da cooperação econômica internacional. Dentro dessa estrutura, o W20 (Women 20) se destaca como um grupo de engajamento dedicado à promoção da igualdade de gênero e ao empoderamento econômico das mulheres. O W20 aborda diversos temas cruciais por meio de grupos de trabalho focados em áreas como mulheres em STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática), justiça climática, empreendedorismo feminino, economia do cuidado e enfrentamento da violência de gênero. 

No grupo de trabalho dedicado à violência de gênero, Janaína Gama, consultora de diversidade e inclusão, atua como líder do tema e é co-líder da delegação do W20 no Brasil. A violência de gênero não é um assunto novo para o G20, pois já esteve em pauta em outros encontros, e reaparece como prioridade nas discussões deste ano. Afinal, é uma questão que permeia a sociedade como um todo, influenciando diretamente a inclusão econômica e financeira das mulheres, objetivo central do W20. 

“Percebemos que o tema da violência de gênero ainda é invisibilizado, mesmo em 2024. As mulheres continuam sendo violentadas, e esse assunto é tratado como algo pessoal, e não como uma questão social, política e governamental. Isso tem tudo a ver com economia e finanças, impactando diretamente os novos modelos econômicos e, consequentemente, o G20”, afirma Janaína. 

Janaína Gama, consultora de diversidade e inclusão e líder do grupo de trabalho de violência de gênero no W20 no Brasil (Crédito: Divulgação)

É um tema que impacta as mulheres de maneira geral, mas também tem suas particularidades a nível interseccional. “Essa violência opera de formas sutis e está presente em todos os espaços, afetando mulheres independentemente de sua classe ou condição financeira. É uma questão universal, mas as mulheres são impactadas de maneiras diferentes. Por isso, a lente interseccional é importante. Precisamos considerar mulheres negras, indígenas, quilombolas, ribeirinhas, trans, cis, com ou sem deficiência”, diz a líder. 

Pautas em debate 

Entre os temas discutidos pelo grupo de trabalho sobre violência de gênero, destacam-se a necessidade de implementar programas e medir indicadores específicos para monitorar a violência. “Cada país trabalha de um jeito e muitos nem produzem indicadores, então, se não medimos, não vemos. Implementar esse processo é crucial”, avalia. 

Outro ponto destacado pela delegada é a importância da educação para desconstruir estereótipos de gênero, tanto nas escolas quanto na mídia. “É fundamental falar sobre papeis de gênero desde a primeira infância, pois sabemos que os estereótipos de gênero afetam as expectativas e comportamentos futuros.” 

Para tratar sobre violência de gênero, também é essencial reconhecer as diferentes formas de violência e como ela se manifesta em ambientes distintos. O que inclui a violência doméstica, no ambiente de trabalho — em especial, o assédio –, e em áreas de conflito, como países em guerra e conflitos urbanos. 

A interseccionalidade é outro aspecto crucial. “No Brasil, enfatizamos a inclusão de mulheres negras e indígenas no texto pela primeira vez, o que é fundamental, especialmente considerando que a África do Sul e os Estados Unidos, onde a questão racial é relevante, sediarão as próximas edições”, destaca Janaína. 

Por fim, o custo da violência para a sociedade também foi apontado pela delegada como um dos tópicos de discussão do grupo. “Nós, mulheres, pagamos impostos, mas quanto disso retorna em políticas públicas que nos protejam? É essencial que os governos invistam em políticas efetivas contra todos os tipos de violência”, responde. 

Propostas 

O grupo de trabalho elaborou planos de ação para serem apresentadas às trilhas dos Sherpas, emissários dos líderes do G20 que supervisionam as negociações e discutem os pontos que formam a agenda da cúpula. Entre as propostas está a eliminação de todas as formas de violência de gênero. “Especialmente o feminicídio, devido à sua gravidade, abarcando também a violência em casa, no trabalho, nos conflitos, na economia e nos meios tecnológicos”, destaca a líder do tema. 

A segunda recomendação enfatiza a necessidade de leis eficazes para combater a violência e acabar com a impunidade, incluindo políticas, programas e indicadores. “Mesmo com leis, ainda há impunidade. Sem elas, a situação é ainda pior. Reforçamos a importância de sistematizar e implementar as leis, e acompanhar sua efetividade.” 

Por fim, o GT também pontua a necessidade de investimentos concretos em programas de combate à violência. “Muitas vezes, não há políticas públicas ou leis devido à falta de investimento. Sugerimos um compromisso global do G20 para investir e estimular que os países façam o mesmo em relação ao tema”, reforça Janaína. 

Violência de gênero e outras pautas do W20 

A violência de gênero está intrinsecamente conectada com outros temas abordados pelo W20. No empreendedorismo feminino, por exemplo, mulheres que enfrentam violência podem ter dificuldades em acessar capital e desenvolver seus negócios. “Esse ciclo de violência afeta a perspectiva de vida e autoestima das mulheres, impedindo-as de se verem como capazes ou empreendedoras. Se já são empreendedoras, podem enfrentar violência patrimonial, onde o dinheiro e os materiais de trabalho não estão sob seu controle”, reflete a consultora. 

Na economia do cuidado, a dupla ou tripla jornada de trabalho impacta a saúde mental e física das mulheres, principalmente quando não há serviços de apoio a elas. Esse acúmulo de responsabilidades também pode afetar o processo empreendedor, trazendo dificuldades, até mesmo financeiras, de investir em seus próprios negócios.  

No campo de STEM, mulheres enfrentam violências sutis e discriminação que desestimulam seu progresso. Janaína relata quando estudantes das áreas de exatas desabafaram sobre as pressões que sofrem: “Recentemente, em uma palestra para estudantes de ciências tecnológicas, ouvi relatos de professores que desmotivam meninas, afirmando que elas não precisam aprender certos conteúdos. Esse tipo de violência sutil está também presente nos espaços de estudo e trabalho tecnológicos”. 

Quando o assunto é justiça climática, mulheres são mais vulneráveis a desastres climáticos e podem sofrer violência adicional em situações de emergência. A delegada cita o exemplo das mulheres no Rio Grande do Sul que sofreram violência sexual em abrigos.  

Próximos passos do W20 

As recomendações do grupo de trabalho sobre violência de gênero foram entregues para as trilhas dos Sherpas e de Finanças do G20 e serão discutidas na próxima segunda-feira, 22 de julho. “Esperamos que algumas de nossas propostas sejam incluídas no documento final do G20, o que seria uma grande vitória”, afirma Janaína. 

A próxima etapa é a apresentação dessas recomendações no Summit W20, que ocorrerá no Rio de Janeiro de 30 de setembro a 2 de outubro. Esse evento reunirá delegadas de diversos países para debater o comunicado final e os próximos passos, além de promover diálogos com ONGs e a sociedade civil. 

O trabalho de advocacy do W20 continuará mesmo após seu término no Brasil e a passada de bastão para a África do Sul, sede do próximo encontro do G20. O grupo de engajamento seguirá com uma agenda de encontros para fortalecer a rede e levar suas pautas para discussão na sociedade civil. O próximo diálogo aberto ao público ocorrerá em São Paulo, no dia 22 de agosto.

“Estamos focados no nosso Summit, nos diálogos e em continuar essas discussões, trazendo-as para nossas redes. Quanto mais falamos e divulgamos, mais conscientizamos as pessoas sobre temas que afetam mais da metade da população brasileira, que são as mulheres”, destaca Janaína Gama. 

Publicidade

Compartilhe

Veja também

  • 64% das brasileiras 50+ têm dificuldade para serem contratadas

    64% das brasileiras 50+ têm dificuldade para serem contratadas

    Pesquisa da Amarelo, apresentada em parceria com o Coletivo 45+, traz dados sobre autoestima, trabalho e preconceitos contra mulheres maduras

  • Tatiana Monteiro de Barros: a arte de conectar o setor privado com a ação social

    Tatiana Monteiro de Barros: a arte de conectar o setor privado com a ação social

    Fundadora do movimento União BR acredita na articulação entre o terceiro setor e as empresas para agir em emergências e catástrofes