Qual o seu caminho para as possibilidades?
Estar curioso e alerta às possibilidades é um caminho que fica escondido atrás de nossas convicções e do nosso ego, da necessidade de estar certo e ser o vencedor do conflito
Estar curioso e alerta às possibilidades é um caminho que fica escondido atrás de nossas convicções e do nosso ego, da necessidade de estar certo e ser o vencedor do conflito
26 de abril de 2024 - 6h21
Em tempos de SXSW, venho falar sobre uma das atrações pouco comentadas, mas de enorme relevância para nosso momento sociocultural: o antropólogo Willian Ury, que passou os últimos 40 anos envolvido nas mais complexas negociações de conflitos globais como guerras, confrontos políticos e diplomáticos. É antropólogo, autor de alguns livros, expert em negociação e cofundou o Harvard Program on Negotiation.
Willian esteve presente no emblemático conflito entre o presidente americano Donald Trump e o ditador norte coreano Kim Jong-un nos anos de 2017 e 2018. Ury também participou da negociação entre Abílio Diniz e Jean Charles Naouri, do Casino. Em ambos os casos, as duas partes transformaram seus relacionamentos e passaram a conviver amigavelmente. Nem sempre isso acontece e nem sempre o conflito é resolvido também.
Em vários exemplos, como a Guerra civil da Colômbia entre as forças conservadoras e socialistas, que se arrastou por anos e anos, o conflito continuou, mas a guerra e a violência acabaram e isso já significa muito. Outro ensinamento de Wiliam é que a maioria dos conflitos não se resolvem em uma reunião ou em uma semana. Uma negociação geralmente precisa de tempo e de muita escuta.
O que acho mais incrível é a simpatia e doçura do Ury, sendo um profissional constantemente envolvido em disputas, raivas e muros altos. Ele está sempre sorrindo, é casado com uma brasileira, diz ter uma afinidade com o Brasil, e arrasta um português otimamente. Estou lendo o seu último livro, “Possible”, ainda sem tradução. Nessa obra, ele traz muitas das suas descobertas na solução de conflitos e também uma metodologia para resolvê-los. E tudo isso é amarrado em uma teoria linda, que William fala ter aprendido com seu avô, um homem que, “onde todos viam obstáculos, ele via possibilidades”. E disso vem a frase repetida por William Ury, quase um mantra: Nem pessimista, nem otimista, eu sou possibilista.
Peguei esse mantra para mim. Eu acho isso uma esperança, uma direção a seguir, uma enorme inspiração. Estar curioso e alerta às possibilidades é um caminho que fica escondido atrás de nossas convicções e do nosso ego, da necessidade de estar certo e ser o vencedor do conflito. Ah! Sobre isso, Ury esclarece: um conflito bem negociado não tem um vencedor, tem vencedores, onde todos se sentem ouvidos e, de alguma forma, contemplados.
Mas ser possível não significa ser fácil. O quanto pode ser difícil lidarmos com nossas certezas, desejos e crenças para chegar em um lugar que nem tínhamos imaginado? Um caminho do meio? Ou um caminho à frente? E que, além disso, ainda precisa de paciência, persistência e coragem? Sim, coragem, porque “ser possibilista é olhar as possibilidades negativas no olho e usá-las como motivação para buscar as possibilidades positivas”.
Para transformar conflitos em possibilidades, o autor William Ury nos mostra um caminho, um jeito de pensar, uma metodologia. Mas é cada um de nós que vai fazer suas análises e buscar suas possibilidades. O caminho que ele propõe é muito interessante: ele sugere que o ponto de partida não seja o problema, mas, antes, deve-se começar pelo possível: construir um contexto de possibilidades, que ele chama de “ciclo de possibilidades” e, no centro, o problema. “Não ignore os obstáculos, mas comece pelas aberturas. O caminho para o possível começa com as possibilidades.”
Uma vez tendo mudado o ponto de partida, o caminho das possibilidades para solução de conflitos exige que a gente tenha um olhar para 3 dimensões do problema que, se resolvidas juntas, nos levará muito mais longe.
A primeira está relacionada ao “EU”, a minha visão do problema. A gente costuma reagir com medo e raiva, como se estivéssemos no lugar de ataque. Aqui William sugere que a gente se coloque na posição de estar em uma sacada, onde a calma é mais possível e a perspectiva muito mais ampla. Essa é a vitória consigo mesmo.
A segunda perspectiva é a do “VOCÊ”. Em conflitos difíceis a gente costuma construir muros e defender nossa posição. Precisamos fazer o contrário: aprender a ouvir para poder construir pontes. Eu já falei aqui em outro artigo sobre a importância da escuta, mas acredito que falarei em praticamente todos eles, porque essa é uma urgente necessidade contemporânea.
A terceira camada é o “TODO”. Em conflitos destrutivos costumamos ver dois lados imaginando uma vitória unilateral: nós versus eles. Porém, o que o antropólogo Ury nos lembra é que existe uma terceira via, a do TODO, ou a comunidade que está a nossa volta, que se importa e está preocupada com o conflito. Quando pensamos no TODO, temos a possibilidade de encontrar ajuda para interromper brigas, acalmar, ir para a sacada e ter uma visão maior do problema. Eles podem nos ajudar a construir as pontes que irão beneficiar tudo em volta.
Com essas 3 perspectivas, William acredita que podemos desbloquear um potencial pleno para solução dos problemas considerando o “EU”, o “VOCÊ” e o “NÓS”.
Para olharmos para as 3 dimensões do conflito, nossas maiores ferramentas serão a curiosidade, a criatividade e a capacidade de colaboração. Ninguém vence sozinho. Com essas capacidades e esse olhar, não vamos mudar o fato do mundo ser cheio de conflitos, mas sim rever a forma de se posicionar e resolvê-los. E, para o autor, conseguir transformar conflitos é uma bela maneira de transformar o mundo, aumentar nosso potencial humano e criar abundância.
William Ury acredita que o possível é o novo SIM. Ele me inspirou muito com a sua crença de que o impossível pode se tornar possível e que os confrontos destrutivos podem se tornar negociações produtivas. E eu te pergunto: a perspectiva do autor ampliou a sua visão sobre conflitos? Te levou para a sacada? Te estimulou a ouvir mais e melhor? A se imaginar construindo pontes? Afinal, qual é o seu caminho para o possível? Eu vou adorar saber, e provavelmente o William Ury também.
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